PETIÇÃO DE HABEAS CORPUS PREVENTIVO
(COM PEDIDO DE ORDEM LIMINAR) - ART. 5º, LXVIII, CF/88
EM DEFESA DO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,
IMPETRANTE: JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO
PACIENTE: O PRÓPRIO IMPETRANTE
ASSUNTO: HABEAS CORPUS PREVENTIVO. Ameaça ao direito de locomoção (indireta) e à liberdade civil, decorrente da aplicação de cláusula editalícia em concurso público que viola o Princípio da Presunção de Inocência (Art. 5º, LVII, CF) e a tese fixada no Tema 22 de Repercussão Geral (RE 560.900/DF).
AUTORIDADE COATORA: DIRETOR DE PESSOAL DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO (PMSP) - (Responsável pelo Edital de Concurso Público Nº DP-2/321/25).
em face de ato manifestamente ilegal e eivado de teratologia, praticado pela AUTORIDADE COATORA (DIRETOR DE PESSOAL DA PMSP), consubstanciado na ameaça de exclusão do Paciente de certame público (Edital DP-2/321/25) com base em investigações e processos criminais em curso, sem o trânsito em julgado, em frontal, direta e inaceitável violação ao Princípio Constitucional da Presunção de Inocência (Art. 5º, LVII, CF) e em direta desobediência à autoridade de decisão vinculante deste Colendo Pretório Excelso (Tema 22 de Repercussão Geral).
I. DA LEGITIMIDADE E DO CABIMENTO DESTE WRIT
A Constituição Cidadã de 1988, em seu art. 5º, LXVIII, sacramenta que "conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder".
A legitimidade do Impetrante é universal (actio popularis), dispensando capacidade postulatória. A ameaça, por sua vez, não se restringe ao cárcere. A moderna hermenêutica constitucional entende o writ como a salvaguarda de toda a liberdade física e moral do indivíduo. Ser sumariamente rotulado como "inidôneo" e "inapto" à vida pública, com base em meras suposições não provadas, é uma forma de coação que, embora não prenda, restringe, estigmatiza e limita a plena liberdade civil do cidadão.
A competência desta Suprema Corte para processar e julgar originariamente este writ firma-se de modo excepcional. O ato coator – um edital administrativo – ao ignorar deliberadamente um precedente de Repercussão Geral (RE 560.900, Tema 22), ataca frontalmente a autoridade decisória desta Corte. Trata-se, portanto, de garantir a eficácia de um julgado vinculante (Art. 927, III, CPC, c/c Art. 102, I, 'i', CF) contra ato de flagrante inconstitucionalidade que ameaça a liberdade do Paciente.
II. DOS FATOS E DO ATO COATOR
O Paciente, ao analisar o Edital de Concurso Público Nº DP-2/321/25 (doc. anexo), observou um erro jurídico flagrante. O referido edital, em seu Capítulo XII (fl. 35 do Edital), intitulado "Avaliação da Conduta Social, da Reputação e da Idoneidade", prevê expressamente a eliminação de candidatos com base em critérios que ferem de morte a garantia constitucional, notadamente:
"6. A avaliação será realizada no intuito de identificar condutas inadequadas e reprováveis do candidato... impedindo a aprovação, dentre outras hipóteses possíveis, de candidato:
[...]
6.4. possuidor de registro policial nas condições de averiguado, autor ou indiciado, desabonador à conduta ilibada, à reputação e à idoneidade moral;
[...]
6.12. autor de infração penal de menor potencial ofensivo, nos termos do artigo 61 da Lei nº 9.099/95, desabonador à conduta ilibada, à reputação e à idoneidade moral;"
O Paciente, na qualidade de cidadão e fiscal dos atos públicos, insurge-se contra as referidas cláusulas editalícias por constatar que elas ameaçam não apenas a si, mas a qualquer cidadão que, exercendo seus direitos, possa figurar em investigações ou processos judiciais que, repita-se à exaustão, encontram-se EM CURSO. A cláusula atinge a todos que, sem NENHUMA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA TRANSITADA EM JULGADO, são submetidos à pena antecipada de eliminação.
O ato coator, portanto, é a própria existência da norma editalícia. Não se trata de uma ameaça futura ou abstrata, mas de um constrangimento ilegal concreto e autoexecutável, que pende sobre o Paciente e todos os cidadãos na mesma situação. O "justo receio" é manifesto, pois a qualquer momento da fase de Investigação Social (Capítulo XII), o Paciente pode ser sumariamente alijado do certame por uma pecha de "inidôneo", aplicada por uma autoridade administrativa que usurpa a função jurisdicional.
III. DO DIREITO E DA FLAGRANTE ILEGALIDADE
A. A Tese Nuclear: Presunção de Inocência (Art. 5º, LVII, CF) e o Tema 22 (RE 560.900)
A ilegalidade perpetrada pela Autoridade Coatora é solar e dispensa maiores digressões, pois atenta contra o núcleo duro das garantias fundamentais. A Constituição Federal é categórica:
"Art. 5º, LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;"
Este princípio não é uma mera retórica; é uma garantia processual e, mais que isso, um "tratamento" que o Estado deve dispensar ao cidadão. O Estado não pode tratar como "inidôneo" ou "culpado" aquele que a própria Justiça ainda não declarou como tal.
Este Pretório Excelso, em sua função precípua de guardião da Carta Magna, já pacificou a matéria em sede de Repercussão Geral, tornando sua decisão vinculante para toda a Administração Pública. No julgamento do RE 560.900 (Tema 22 de Repercussão Geral), esta Corte fixou a tese inequívoca:
"Viola o princípio da presunção de inocência a exclusão de candidato de concurso público que responde a inquérito policial ou ação penal sem trânsito em julgado."
O edital da PMSP (Capítulo XII) é a materialização exata do que o Tema 22 veda. Ao prever a eliminação por ser "averiguado" ou "indiciado", a Administração Pública impõe uma sanção administrativa de caráter perpétuo – a exclusão da vida pública – como se condenação houvesse. Trata-se de uma antecipação de culpa inaceitável, que converte o inquérito policial, peça meramente informativa, em instrumento de punição sumária.
B. O Princípio da Não Culpabilidade como Pilar do Estado de Direito
A presunção de inocência é o que separa o Estado de Direito do Estado Policial. Como lecionava Montesquieu em "O Espírito das Leis", "A liberdade política do cidadão é esta tranquilidade de espírito que provém da opinião que cada um tem da sua segurança".
Como pode um cidadão ter "tranquilidade de espírito" se o Estado pode puni-lo (eliminando-o da vida pública) com base em meras "alegações infundadas" ou "investigações" das quais será, ao final, absolvido? A norma editalícia cria um estigma indelével, um verdadeiro "atestado de inidoneidade" precoce. Já bradava o mestre Rui Barbosa que a justiça não se faz apenas pela lei, mas pelo tratamento equânime. Permitir que a Administração trate um "indiciado" como "culpado" é aniquilar a própria substância da Justiça.
A história recente demonstra o perigo de se relativizar esta garantia. A perseguição política (lawfare) muitas vezes se inicia com a estigmatização pública baseada em acusações, não em condenações. Permitir que o Estado brasileiro, através de seus editais, crie uma classe de "cidadãos suspeitos" é regredir ao autoritarismo.
IV. DA MEDIDA LIMINAR (O PERIGO IMINENTE)
A concessão da medida liminar é imperativa, sob pena de esvaziamento total do writ. Estão presentes os dois requisitos:
- Fumus Boni Iuris (A Fumaça do Bom Direito): É cristalino, denso e inegável. A ilegalidade não é mera suposição, mas sim uma afronta direta ao Art. 5º, LVII, da CF e, sobretudo, um ato de explícita desobediência ao precedente vinculante (erga omnes) desta Suprema Corte (Tema 22, RE 560.900).
- Periculum in Mora (O Perigo da Demora): É absoluto e iminente. Conforme o próprio Edital (doc. anexo), o concurso público está em pleno andamento, e a etapa de Avaliação da Conduta Social (Capítulo XII) pode ser iniciada a qualquer momento. Se o Paciente for eliminado ilegalmente antes da análise do mérito deste writ, o dano será irreparável (periculum in mora), pois terá seu direito de concorrer à vaga pública ceifado por um ato administrativo nulo de pleno direito. A demora, aqui, é a própria negação da Justiça.
Diante do exposto, requer-se, LIMINARMENTE E INAUDITA ALTERA PARS, que esta Suprema Corte digne-se a:
SUSPENDER, imediata e preventivamente, a eficácia de quaisquer cláusulas do Edital DP-2/321/25 (Capítulo XII, itens 6.3, 6.4, 6.12 e correlatos) – e de qualquer outro certame em situação análoga – que autorizem a exclusão do Paciente ou de qualquer outro candidato na fase de Investigação Social com base, unicamente, na existência de inquéritos policiais, ações penais em curso ou registros policiais sem trânsito em julgado, assegurando-lhe o direito de prosseguir nas demais etapas do concurso, até o julgamento final deste writ.
V. DOS PEDIDOS FINAIS (O MÉRITO)
Ante o exposto, e confiando no notório saber jurídico e no papel de guardiã da Constituição desta Suprema Corte, requer-se:
- O recebimento da presente ordem e a concessão da MEDIDA LIMINAR nos termos acima pleiteados, para afastar o justo receio de eliminação ilegal;
- A notificação da Autoridade Coatora (Exmo. Sr. Diretor de Pessoal da PMSP) para que preste as informações que julgar necessárias;
- A intimação da Douta Procuradoria-Geral da República para que exare seu parecer;
- Ao final, no mérito, seja a ordem CONCEDIDA EM DEFINITIVO, para:
- Declarar, incidenter tantum, a flagrante inconstitucionalidade e não recepção das cláusulas do Edital DP-2/321/25 (Capítulo XII, itens 6.3, 6.4, 6.12 e correlatos) que violam o Princípio da Presunção de Inocência, por desobediência direta ao Tema 22 desta Corte;
- Expedir o SALVO-CONDUTO preventivo em favor do Paciente, determinando que a Autoridade Coatora (PMSP) se abstenha terminantemente de eliminá-lo do certame ou de qualquer outra fase com base exclusiva na existência de inquéritos policiais, ações penais em curso ou registros policiais sem trânsito em julgado, assegurando seu direito de prosseguir e, caso aprovado nas demais etapas, tomar posse no cargo.
Termos em que,
Pede Deferimento.
São Paulo, 15 de novembro de 2025.
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JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO
CPF: 133.036.496-18
Impetrante e Paciente
Requer-se a tramitação em
Segredo de Justiça