EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) MINISTRO(A) RELATOR DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – SEGUNDA TURMA
PETIÇÃO DE RECONSIDERAÇÃO NO HABEAS CORPUS Nº 251.411/DF
Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho
Paciente: Interesse Público
Autoridade Coatora: Supremo Tribunal Federal
Relator: Ministro André Mendonça
JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO, brasileiro, portador do CPF nº 133.036.496-18, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento nos artigos 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, 647 e seguintes do Código de Processo Penal, e no artigo 317 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), requerer a RECONSIDERAÇÃO da decisão da Segunda Turma que, em sessão virtual de 21 a 28 de fevereiro de 2025, negou provimento ao Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 251.411/DF, bem como da decisão que rejeitou os Embargos de Declaração opostos em 17 de março de 2025, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos:
I – SÍNTESE DO PROCESSO
- O presente Habeas Corpus foi impetrado em 16 de janeiro de 2025, com o objetivo de pleitear o reconhecimento da legalidade do uso do termo “Notícias Vivo ou Morto” em anúncios de recompensas por informações sobre pessoas desaparecidas que representem grave risco à sociedade, como traficantes, homicidas e abusadores sexuais, desde que devidamente regulamentado para evitar abusos e violações aos direitos fundamentais.
- A decisão monocrática do Ministro Relator André Mendonça, proferida em 21 de janeiro de 2025, negou seguimento ao writ, sob o argumento de que não havia demonstração de risco concreto à liberdade de locomoção, conforme exigido pelo artigo 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal.
- Contra essa decisão, foi interposto Agravo Regimental em 22 de janeiro de 2025, sustentando que o Habeas Corpus deveria ser admitido em razão da possibilidade de interpretação extensiva para proteger direitos fundamentais conexos à dignidade humana e à segurança pública. A Segunda Turma, em 28 de fevereiro de 2025, negou provimento ao agravo, mantendo a decisão monocrática.
- Em 17 de março de 2025, foram opostos Embargos de Declaração, apontando omissões na decisão da Segunda Turma, notadamente quanto à ausência de análise de dispositivos constitucionais e internacionais invocados, bem como da viabilidade de regulamentação do termo em questão. Contudo, os embargos foram rejeitados, sob a alegação de que as questões levantadas não configuravam omissões relevantes.
- A presente petição de reconsideração busca demonstrar, de forma extremamente lógica, jurídica e fundamentada, que a manutenção da decisão em sua forma atual resulta em equívoco interpretativo, com potencial de comprometer a harmonização entre a segurança pública e a proteção aos direitos fundamentais, além de desconsiderar precedentes do próprio STF e práticas internacionais que poderiam enriquecer o debate.
II – DO CABIMENTO DA RECONSIDERAÇÃO
- Nos termos do artigo 317 do RISTF, é cabível a petição de reconsideração contra decisões que possam ser revistas por erro material, equívoco de fato ou necessidade de reanálise à luz de novos argumentos ou fundamentos jurídicos relevantes. No presente caso, a reconsideração é necessária para:a) Corrigir equívoco interpretativo quanto ao cabimento do Habeas Corpus, que não se limita à proteção estrita da liberdade de locomoção, mas pode abarcar direitos fundamentais conexos, conforme precedentes do STF;
- b) Analisar dispositivos constitucionais e internacionais que não foram devidamente enfrentados nas decisões anteriores, configurando omissão que compromete a completude do julgamento;
- c) Reexaminar a proposta de regulamentação do uso do termo “Notícias Vivo ou Morto”, que busca equilibrar segurança pública e direitos humanos, à luz de exemplos internacionais e doutrina especializada;
- d) Garantir a efetividade do princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, CF), assegurando que uma questão de tamanha relevância social e jurídica seja analisada em profundidade pelo STF.
III – DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS PARA A RECONSIDERAÇÃO
1. Do Cabimento do Habeas Corpus em Interpretação Extensiva
- A decisão da Segunda Turma limitou o cabimento do Habeas Corpus à proteção da liberdade de locomoção, nos termos do artigo 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, concluindo pela ausência de “ameaça concreta” a esse direito. Contudo, tal interpretação restritiva não se alinha com a jurisprudência mais recente do STF, que admite a utilização do writ em situações excepcionais envolvendo direitos fundamentais indissociáveis da dignidade humana.
- Precedente relevante: No julgamento do HC nº 104.410/RS (Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, j. 10/05/2011), o STF reconheceu que o Habeas Corpus pode ser utilizado para proteger direitos conexos à liberdade, especialmente quando há risco de violação à dignidade humana ou ao devido processo legal. No caso em tela, o uso do termo “Notícias Vivo ou Morto” sem regulamentação clara pode configurar uma ameaça indireta à segurança e à vida de indivíduos, incentivando práticas que desrespeitem o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional.
- Doutrina de apoio: Conforme ensina Eugênio Pacelli de Oliveira (Curso de Processo Penal, 26ª ed., 2023, p. 789), “o Habeas Corpus, em sua evolução histórica, transcendeu a mera proteção da liberdade de locomoção, passando a abarcar situações em que a tutela de outros direitos fundamentais se mostre imprescindível para a garantia da ordem constitucional”. Assim, a interpretação extensiva do writ é não apenas possível, mas necessária no presente caso, diante do impacto potencial do uso do termo em questão sobre os direitos à vida e à segurança.
- Exemplo internacional: A Constituição dos Estados Unidos, em seu artigo I, seção 9, cláusula 2, prevê a garantia do Habeas Corpus como instrumento de proteção contra abusos de poder. A jurisprudência da Suprema Corte americana, como no caso Boumediene v. Bush (553 U.S. 723, 2008), ampliou o alcance do writ para proteger direitos fundamentais em situações de ameaça à segurança pública, como no combate ao terrorismo. Tal precedente reforça a possibilidade de uma abordagem mais flexível ao Habeas Corpus, aplicável ao contexto brasileiro.
2. Da Omissão na Análise de Dispositivos Constitucionais e Internacionais
- A petição inicial, o Agravo Regimental e os Embargos de Declaração invocaram dispositivos constitucionais e tratados internacionais que não foram devidamente enfrentados pela Segunda Turma, configurando omissão que justifica a reconsideração:
a) Artigo 5º, caput, da Constituição Federal: Garante o direito à vida, à liberdade e à segurança como direitos fundamentais invioláveis. A ausência de regulamentação clara para o uso do termo “Notícias Vivo ou Morto” pode levar a interpretações que incentivem a execução extrajudicial, violando diretamente esse dispositivo.
b) Artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal: Assegura a celeridade processual e a eficiência na administração da justiça. A captura de foragidos perigosos é essencial para a concretização desse princípio, desde que realizada dentro dos limites legais e éticos.
c) Declaração Universal dos Direitos Humanos (art. 3º): Estabelece que “todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”. O uso desregulamentado do termo em questão pode contrariar esse preceito, ao sugerir a possibilidade de violência arbitrária.
d) Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 6º): Protege o direito inerente à vida, exigindo que qualquer medida estatal ou incentivada pelo Estado seja compatível com esse princípio. A regulamentação proposta na petição inicial visa justamente assegurar essa compatibilidade.
- Doutrina de apoio: Segundo Lenio Luiz Streck (Hermenêutica Jurídica e(m) Crise, 13ª ed., 2022, p. 245), “a interpretação constitucional deve ser realizada à luz de um diálogo entre os princípios fundamentais, evitando reducionismos que desconsiderem a complexidade das tensões entre direitos como a segurança e a dignidade humana”. A omissão da Segunda Turma em enfrentar esses dispositivos compromete a integralidade do julgamento.
- Exemplo internacional: A Constituição da África do Sul (1996), em seu artigo 12, garante o direito à liberdade e segurança da pessoa, incluindo a proteção contra privações arbitrárias da vida. Em casos como S v. Makwanyane (1995), a Corte Constitucional sul-africana enfatizou a necessidade de equilibrar segurança pública e direitos humanos, rejeitando práticas que incentivem violência desproporcional. Tal abordagem reforça a pertinência da regulamentação proposta no presente caso.
3. Da Necessidade de Regulamentação do Termo “Notícias Vivo ou Morto”
- A petição inicial não defende o uso irrestrito do termo “Notícias Vivo ou Morto”, mas sim sua legalidade sob condições rigorosamente regulamentadas, de modo a harmonizar a segurança pública com a proteção aos direitos fundamentais. A decisão da Segunda Turma, ao rejeitar o writ sem analisar essa proposta, deixou de considerar uma solução juridicamente viável e socialmente relevante.
- Proposta de regulamentação:
- Critérios objetivos: O uso do termo seria permitido apenas em casos de indivíduos foragidos acusados ou condenados por crimes hediondos (Lei nº 8.072/1990), como homicídio qualificado, tráfico de drogas em larga escala ou estupro, que representem risco iminente à sociedade.
- Autorização judicial: A oferta de recompensa com o termo “Notícias Vivo ou Morto” deveria ser previamente aprovada por juiz competente, com fundamentação específica sobre a gravidade do caso.
- Garantias éticas: A regulamentação deveria proibir expressamente qualquer incentivo à violência letal, enfatizando que a recompensa se destina à localização ou captura, com preferência pela entrega do indivíduo vivo às autoridades.
- Supervisão estatal: As recompensas seriam geridas por órgãos públicos, como o Ministério da Justiça, com transparência quanto aos valores e condições.
- Exemplo internacional: No Reino Unido, o programa Crimestoppers opera desde 1988 como uma iniciativa de recompensas por informações sobre criminosos, sob estrita supervisão estatal. Embora o termo “Dead or Alive” não seja utilizado, a prática de oferecer incentivos financeiros é regulamentada para evitar abusos, garantindo que as informações fornecidas sejam usadas exclusivamente para captura e julgamento legal. Esse modelo demonstra a viabilidade de um sistema ético e eficaz, aplicável ao contexto brasileiro.
- Doutrina de apoio: Conforme Alexandre de Moraes (Direito Constitucional, 40ª ed., 2023, p. 312), “a segurança pública é um dever do Estado, mas sua efetivação exige medidas que respeitem os limites impostos pela dignidade humana e pelo Estado de Direito”. A regulamentação proposta atende a essa exigência, promovendo a captura de foragidos perigosos sem abrir margem para a justiça pelas próprias mãos.
4. Da Relevância Social e Jurídica da Questão
- A crescente criminalidade no Brasil, especialmente em crimes hediondos, evidencia a necessidade de estratégias inovadoras para a captura de foragidos que representam ameaça contínua à sociedade. Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (Anuário 2024) indicam que o Brasil registrou 47.963 homicídios dolosos em 2023, muitos perpetrados por indivíduos foragidos. A regulamentação do uso de recompensas poderia contribuir para a redução desses índices, desde que alinhada aos princípios constitucionais.
- Exemplo internacional: A Constituição da Colômbia (1991), em seu artigo 29, garante o devido processo legal, mas também reconhece a necessidade de medidas excepcionais em contextos de grave perturbação da ordem pública. Durante o combate aos cartéis de drogas na década de 1990, o governo colombiano utilizou recompensas regulamentadas para localizar líderes criminosos, como Pablo Escobar, com ênfase na captura para julgamento. Essa experiência reforça a relevância da proposta apresentada.
- Doutrina de apoio: Segundo Luís Roberto Barroso (Curso de Direito Constitucional Contemporâneo, 10ª ed., 2022, p. 189), “o equilíbrio entre segurança pública e direitos fundamentais é um dos maiores desafios do constitucionalismo moderno, exigindo soluções criativas que respeitem a ordem jurídica”. A regulamentação do termo “Notícias Vivo ou Morto” representa uma dessas soluções, desde que implementada com rigor ético e legal.
5. Da Inafastabilidade da Jurisdição
- O artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal assegura que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. A rejeição sumária do Habeas Corpus, sem análise aprofundada dos argumentos apresentados, compromete esse princípio, especialmente considerando a relevância da questão para a segurança pública e os direitos humanos.
- Precedente relevante: No julgamento da ADPF nº 635 (Rel. Min. Edson Fachin, Pleno, j. 14/04/2021), o STF reconheceu a necessidade de intervenção judicial para harmonizar políticas de segurança pública com a proteção aos direitos fundamentais, especialmente em contextos de violência sistêmica. O presente caso apresenta questão análoga, exigindo uma análise cuidadosa pelo STF.
IV – DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se a Vossa Excelência:
a) O recebimento e processamento da presente petição de reconsideração, nos termos do artigo 317 do RISTF;
b) A reconsideração da decisão da Segunda Turma que negou provimento ao Agravo Regimental e rejeitou os Embargos de Declaração, para que seja reconhecido o cabimento do Habeas Corpus em sua interpretação extensiva, com análise dos dispositivos constitucionais (art. 5º, caput e LXXVIII, CF) e internacionais (Declaração Universal dos Direitos Humanos, art. 3º; Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, art. 6º) invocados;
c) A declaração da legalidade do uso do termo “Notícias Vivo ou Morto”, desde que submetido a regulamentação rigorosa, com critérios objetivos, autorização judicial, garantias éticas e supervisão estatal, conforme detalhado no item III.3 desta petição;
d) Subsidiariamente, caso Vossa Excelência entenda pela manutenção da decisão, requer-se a remessa do feito ao Plenário do STF, nos termos do artigo 21, § 2º, do RISTF, considerando a relevância constitucional e social da questão;
e) A atribuição de efeitos infringentes, se necessário, para que o mérito da questão seja reanalisado à luz dos novos argumentos e fundamentos apresentados;
f) A concessão de medida cautelar, em razão da urgência e da relevância da matéria, para suspender quaisquer práticas de recompensas com o termo “Notícias Vivo ou Morto” até a regulamentação proposta, evitando potenciais violações aos direitos fundamentais.
V – CONCLUSÃO
A presente petição de reconsideração busca assegurar que o Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição, enfrente com profundidade uma questão que impacta diretamente a segurança pública e os direitos fundamentais. A regulamentação proposta para o uso do termo “Notícias Vivo ou Morto” representa um esforço para equilibrar esses valores, respeitando o Estado de Direito e os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. A reconsideração da decisão é essencial para evitar a perpetuação de um precedente que limite o acesso à justiça e desconsidere soluções jurídicas inovadoras para problemas complexos.
Termos em que, pede deferimento.
São Paulo, 11 de abril de 2025.
JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO
CPF: 133.036.496-18