Recurso Extraordinário ao STJ oposto à decisão do Habeas Corpus Nº 960175 - DF (2024/0428671-2) | DATA: 22/12/2024 HORA: 04:31:50 SEQUENCIAL: 9681158

sábado, 21 de dezembro de 2024

 DATA: 22/12/2024    HORA: 04:31:50    SEQUENCIAL: 9681158

Recurso Extraordinário ao STJ oposto à decisão do Habeas Corpus Nº 960175 - DF (2024/0428671-2)


Exmo. Sr. Dr. Ministro Presidente do Superior Tribunal de Justiça,


JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO, por seu advogado infra-assinado, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento no artigo 102, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, interpor o presente Recurso Extraordinário contra a decisão proferida pelo Egrégio STJ no Habeas Corpus nº 960175 - DF (2024/0428671-2), pelos motivos de fato e de direito que passa a expor:


I - DOS FATOS

O impetrante, JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO, promoveu a impetração de um habeas corpus coletivo em favor de todos os réus que tiveram suas condenações transitadas em julgado no território nacional por posse de até 40 gramas de maconha. Este pleito baseia-se diretamente na decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário nº 635.659 (RE 635.659), que delineou um critério quantitativo para distinguir o uso pessoal do tráfico de entorpecentes, fixando o limite de 40 gramas de maconha como presumidamente destinado ao consumo próprio. 


1. Contextualização Jurídica da Decisão do STF:

No julgamento do RE 635.659, o STF estabeleceu, com efeito vinculante, que a posse de até 40 gramas de maconha ou seis plantas-fêmeas seria presumida como para consumo pessoal, conforme o artigo 28 da Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas). Esta decisão visa harmonizar a aplicação da lei penal com o princípio da proporcionalidade, evitando a criminalização desproporcional do usuário de drogas, conforme a interpretação constitucional do direito à saúde e da dignidade humana (artigo 5º, caput, da Constituição Federal).


2. Pedido de Habeas Corpus Coletivo:

O pedido de habeas corpus coletivo fundamentou-se na necessidade de revisão de condenações que, à luz do precedente do STF, poderiam ser consideradas injustas ou desproporcionais. A própria natureza do habeas corpus, prevista no artigo 5º, LXVIII, da Constituição Federal, é a de garantir a imediata proteção contra ilegalidades ou abusos que comprometam a liberdade individual, especialmente quando uma decisão judicial contraria ou não segue um entendimento consolidado pelo STF.


3. Desenvolvimento Procedural:

Inicialmente, foi requerida uma liminar para suspender os efeitos das condenações até o julgamento do mérito do habeas corpus. No entanto, esta liminar foi indeferida pelo relator, Ministro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob a alegação de necessidade de análise casuística das provas e circunstâncias de cada caso, o que, segundo a decisão, não poderia ser feito via habeas corpus devido ao seu rito célere e limitado no exame de provas.


4. Manifestações das Partes:

A Defensoria Pública da União, ao se incluir no polo ativo da ação, reforçou a necessidade de revisão das condenações sob a égide do precedente do STF, argumentando a presunção legal de uso pessoal e a consequente nulidade das sentenças que desconsideraram tal enunciado. O Ministério Público Federal, por outro lado, opinou pela denegação da ordem, sustentando que a presunção estabelecida pelo STF é relativa e que há casos em que a análise detalhada das circunstâncias pode justificar a condenação por tráfico mesmo com quantidades inferiores ao limite fixado.


5. Decisão do STJ:

Em decisão proferida pelo Ministro Ribeiro Dantas, o STJ denegou a ordem de habeas corpus, reiterando a necessidade de análise individualizada dos casos para determinar se a posse de maconha se destinava ao tráfico ou ao uso pessoal, o que, segundo o STJ, não se compatibiliza com a via estreita do habeas corpus.


Este contexto revela uma dicotomia entre a aplicação direta de uma diretriz constitucional e legal estabelecida pelo STF e a interpretação prática dada pelo STJ, que pode resultar na manutenção de condenações potencialmente injustas, considerando a intenção legislativa e judicial de distinguir claramente entre usuário e traficante.


II - DO FUNDAMENTO JURÍDICO

1. Da Violação ao Princípio da Isonomia

A decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Habeas Corpus nº 960175 - DF (2024/0428671-2) se contrapõe frontalmente ao princípio constitucional da isonomia, consagrado no artigo 5º, caput, da Constituição Federal Brasileira, que estipula: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade". Este princípio exige que a lei seja aplicada de forma uniforme a todos os indivíduos em situações equivalentes, assegurando um tratamento igualitário.


1.1. Interpretação do Precedente do STF:

No Recurso Extraordinário 635.659/SP, o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu, através do Tema de Repercussão Geral n. 506, uma interpretação que diferencia o usuário do traficante de drogas com base na quantidade de substância apreendida. Especificamente, foi fixada a presunção de uso pessoal para quem for flagrado com até 40 gramas de maconha ou com até 6 plantas-fêmeas, salvo se houver outros elementos indicativos de intenção de comercialização. Esta decisão do STF vincula todos os órgãos do Judiciário, incluindo o STJ, pela força da autoridade vinculante decorrente da repercussão geral (art. 102, § 3º da CF).


1.2. Aplicação Inconsistente da Presunção Legal:

A decisão do STJ, ao negar-se a conceder habeas corpus coletivo baseado na presunção de uso pessoal para quantidades até 40 gramas de maconha, sem considerar a ausência de provas robustas de tráfico, viola a isonomia. Isso porque tal decisão implica em tratamento desigual para réus que se encontram em situação jurídica idêntica, em desacordo com o entendimento do STF. A isonomia exige que, onde a lei estabelece uma presunção, esta deve ser aplicada de maneira consistente, garantindo a igualdade de tratamento a todos aqueles que se encaixam na hipótese legal.


1.3. Impacto sobre a Igualdade Jurídica:

A recusa em aplicar a presunção estabelecida pelo STF resulta em uma desigualdade jurídica prática. Réus condenados por posse de quantidades inferiores a 40 gramas de maconha, sem provas adicionais de tráfico, não têm assegurado o tratamento diferenciado que a interpretação do STF visava proporcionar. Tal prática colide com o artigo 5º, inciso I, da CF, que assegura a igualdade de todos perante a lei, e com o artigo 28 da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas), que prevê sanções administrativas para o uso pessoal de drogas, distinguindo-o do tráfico.


1.4. Consequências Processuais e Penais:

A não aplicação uniforme da presunção de uso pessoal leva a condenações injustas e a uma judicialização excessiva de casos que, pela nova interpretação constitucional, deveriam ser tratados como de natureza administrativa ou, no mínimo, mereceriam uma revisão à luz desta presunção. Isto contraria não só o princípio da isonomia, mas também os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, que devem guiar a aplicação da lei penal (art. 5º, XLVI, CF).


1.5. Necessidade de Reavaliação:

A revisão da decisão do STJ é imperativa para assegurar que a presunção legal não seja usada de maneira seletiva ou arbitrária, garantindo assim que todos os réus em situação similar recebam tratamento idêntico conforme o precedente do STF. A não observância desta presunção implica em uma violação à igualdade processual e material, ferindo direitos fundamentais e o próprio Estado Democrático de Direito.


Portanto, a decisão em questão deve ser reformada para que se restabeleça a aplicação uniforme da lei e a isonomia entre todos os cidadãos sujeitos ao mesmo quadro fático e legal.


2. Da Interpretação do Precedente do STF:

A Decisão do STF no RE 635.659:


No Recurso Extraordinário nº 635.659, o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu uma tese de repercussão geral que delineou a distinção entre uso pessoal e tráfico de drogas, especificamente para a substância cannabis sativa (maconha). A decisão culminou com a fixação de uma presunção relativa de uso pessoal para quem for flagrado com até 40 gramas de maconha ou 6 plantas-fêmeas, sem outros elementos que indiquem intenção de comércio espúrio. A tese do STF, publicada no Diário da Justiça Eletrônico (DJe) em 1º de agosto de 2024, foi clara ao estipular:


Presunção Relativa: A presunção de uso pessoal é relativa, o que significa que pode ser afastada mediante a apresentação de provas contundentes que demonstrem tráfico. Contudo, essa relatividade não deve ser interpretada como uma proibição à aplicação de habeas corpus coletivo quando a presunção não é derrogada por elementos probatórios convincentes.


Implicações para o Habeas Corpus Coletivo:


Não Impedimento de HC Coletivo: A decisão do STF não exclui a possibilidade de concessão de habeas corpus coletivo. Pelo contrário, a interpretação sistemática do artigo 5º, LXVIII, da Constituição Federal, que garante a liberdade por meio do habeas corpus, aliado à tese do RE 635.659, sugere que o STF visou promover a eficiência e a celeridade da justiça ao evitar julgamentos desnecessários para casos presumivelmente de uso pessoal.

Celeridade Processual e Eficiência Judicial: A exigência de análise individualizada de cada caso, conforme proposto pela decisão do STJ, contraria os princípios de celeridade e eficiência do processo judicial, previstos no artigo 5º, LXXVIII, da Constituição Federal, que estabelece o direito à razoável duração do processo. A judicialização extensiva de casos que poderiam ser resolvidos com base na presunção legal estabelecida pelo STF desnecessariamente onera o sistema judiciário e atrasa a prestação jurisdicional.


Respeito à Tese de Repercussão Geral:


Interpretação Conforme a Constituição: A tese estabelecida pelo STF no RE 635.659 não apenas cria uma presunção legal mas também reflete uma interpretação conforme os princípios constitucionais de dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, CF), liberdade (artigo 5º, caput, CF), e o direito à saúde pública, que pode ser impactado negativamente por políticas repressivas de drogas desproporcionais.

Desrespeito à Tese Fixada: A decisão do STJ que nega a concessão de habeas corpus coletivo em face da presunção legal estabelecida pelo STF pode ser vista como uma desconsideração à autoridade do precedente vinculante do Supremo Tribunal Federal, contrariando o sistema de precedentes instituído pela Reforma do Judiciário (EC nº 45/2004) e a Lei nº 13.105/2015, que reforçou a força obrigatória das decisões de repercussão geral.


Conclusão:


Portanto, a interpretação do precedente do STF no RE 635.659 deve ser observada de maneira a permitir a concessão de habeas corpus coletivo quando não há elementos suficientes para derrogar a presunção de uso pessoal. A análise casuística exigida pela decisão recorrida não apenas contraria a eficiência e a celeridade do processo judicial mas também desrespeita a tese de repercussão geral fixada pelo STF, que visa minimizar a judicialização desnecessária de casos de uso pessoal de drogas. Assim, a decisão do STJ deve ser revista à luz da interpretação constitucional e legal propugnada pelo STF, garantindo-se a aplicação uniforme e eficiente da lei.


3. Do Direito à Liberdade Provisória e à Anulação de Acórdãos

A. Análise da Lei 11.343/2006:


A Lei 11.343/2006, conhecida como a Lei de Drogas, foi instituída com o objetivo de regular as condutas relacionadas ao tráfico e ao uso de substâncias entorpecentes, trazendo uma nova perspectiva ao tratamento penal destas práticas. Dois artigos são particularmente relevantes para a discussão aqui apresentada:


Artigo 28 da Lei 11.343/2006: Este dispositivo legal dispõe sobre a conduta do usuário de drogas, definindo que quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, substâncias ou produtos capazes de causar dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, estará sujeito a sanções administrativas e não penais. A interpretação da quantidade de droga como indicativa de uso pessoal ou tráfico é, portanto, crucial e deve ser feita à luz do entendimento constitucional de proporcionalidade e razoabilidade.

Artigo 33, §4º da Lei 11.343/2006: Este parágrafo introduz uma diferenciação na pena para aqueles considerados traficantes, mas que demonstrem primariedade e baixa potencialidade ofensiva. Estabelece que, nas hipóteses de condenação por tráfico de drogas, se o agente for primário e de bons antecedentes, a pena poderá ser substituída por restritiva de direitos, evidenciando uma política criminal mais abrandada para casos de menor gravidade ou onde a intenção comercial não seja evidente.


B. Violação do Direito à Liberdade Provisória:


Princípio da Presunção de Inocência (Art. 5º, LVII, CF/88): A Constituição Federal garante que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. A interpretação restritiva do STJ, ao negar o habeas corpus coletivo, pode resultar em uma privação de liberdade que não respeita este princípio, especialmente quando a quantidade de droga apreendida sugere uso pessoal e não há outros elementos claros de mercancia.

Direito à Revisão de Condenações: A decisão do STF no RE 635.659 estabeleceu um marco na diferenciação entre uso e tráfico, criando uma presunção relativa de uso pessoal para quantidades até 40 gramas de maconha. Este entendimento deve ser aplicado de forma a permitir a revisão de condenações anteriores, sob pena de perpetuar injustiças e violar o princípio da segurança jurídica, que exige que as leis sejam aplicadas de maneira uniforme e previsível.


C. Argumento pela Anulação de Acórdãos:


Artigo 621, inciso I, do Código de Processo Penal: Prevê a possibilidade de anulação de sentenças que contrariem o texto expresso da lei. A interpretação do STJ que nega a aplicação do entendimento do STF poderia ser vista como uma contrariedade à lei, uma vez que não considera o novo parâmetro legal de diferenciação entre usuário e traficante.

Necessidade de Revisão Conforme Precedentes do STF: O não reconhecimento da presunção de uso pessoal conforme a tese fixada pelo STF em repercussão geral implica em uma interpretação que não se coaduna com a evolução jurisprudencial nem com a política criminal mais contemporânea, que busca a descriminalização de condutas de menor potencial ofensivo. 

Prejuízo à Ampla Defesa e ao Devido Processo Legal: A negativa de concessão de habeas corpus coletivo baseado em um entendimento mais restritivo que o do STF pode ser vista como um cerceamento ao direito de defesa, pois impede a revisão de condenações em conformidade com a nova interpretação legal, potencialmente mantendo indivíduos presos sem justa causa.


Em suma, a revisão da interpretação aplicada pelo STJ é imperativa para garantir a correta aplicação da Lei de Drogas, respeitando os princípios constitucionais e os precedentes estabelecidos pelo STF, assegurando assim a liberdade provisória e a anulação de acórdãos que não se alinhem com a nova jurisprudência.


4. Da Necessidade de Reavaliação da Prova

A decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Habeas Corpus nº 960175 - DF (2024/0428671-2) baseou-se na premissa de que cada caso deve ser analisado individualmente para determinar se há elementos probatórios suficientes que justifiquem a condenação por tráfico de drogas, mesmo quando as quantidades de substância apreendida estão abaixo do limite presumido para uso pessoal. No entanto, tal postura, ao exigir uma análise casuística detalhada, apresenta uma série de problemas jurídicos e práticos que precisam ser discutidos:


a. Da Presunção de Uso Pessoal:


A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário nº 635.659/SP estabeleceu uma presunção legal de que a posse de até 40 gramas de maconha caracteriza o uso pessoal, conforme o artigo 28 da Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas). Esta presunção, embora relativa, possui um caráter de proteção ao direito fundamental à liberdade, minimizando a criminalização excessiva de condutas que não demonstram, a priori, intenção de tráfico.

A presunção de inocência, garantida pelo artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, deve ser interpretada de maneira a favorecer o indivíduo quando não há provas contundentes de que a posse da substância exceda o uso pessoal. Portanto, a decisão do STJ deve considerar esta presunção e não reverter a carga probatória de forma desproporcional para o réu.


b. Do Caráter Sumário do Habeas Corpus:


O habeas corpus, previsto no artigo 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, é um instrumento de proteção imediata contra ilegalidade ou abuso de poder, caracterizado por um rito célere e sumário. A exigência de uma análise probatória detalhada e individualizada, como sugerido na decisão atacada, desvirtua a natureza do writ, tornando-o ineficaz para a proteção dos direitos fundamentais.

Segundo a jurisprudência do próprio STF (HC 145.141, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 01/08/2024), o habeas corpus pode ser concedido para corrigir flagrantes injustiças, mesmo sem a necessidade de um exame probatório minucioso, especialmente quando há uma presunção legal a favor do paciente.


c. Da Necessidade de Uniformização da Jurisprudência:


A uniformidade da interpretação jurisprudencial é essencial para a segurança jurídica e a isonomia, conforme os princípios constitucionais. A decisão do STJ que diverge da tese firmada pelo STF no RE 635.659/SP cria uma insegurança jurídica e uma disparidade de tratamento entre réus em situações similares, violando o princípio da igualdade (art. 5º, caput, da CF).

A aplicação da presunção de uso pessoal deve ser revisada para assegurar que todas as instâncias judiciais sigam a orientação do STF, evitando assim que casos análogos resultem em decisões divergentes.


d. Da Proteção contra a Criminalização Excessiva:


A interpretação restritiva adotada pode levar à criminalização excessiva de usuários, contrariando a própria finalidade da Lei de Drogas, que é a de diferenciar claramente entre usuário e traficante. A desconsideração da quantidade como fator determinante, sem robustas evidências de tráfico, pode resultar em condenações injustas, violando o princípio da proporcionalidade e da intervenção mínima do Estado na vida privada dos cidadãos.


e. Da Revisão Probatória:


A revisão probatória não deve ser entendida como um impedimento ao habeas corpus, mas como uma oportunidade para que o Judiciário corrija erros judiciais manifestos, especialmente quando a decisão se baseia em uma presunção legal já estabelecida por corte superior. A análise deveria ser orientada para verificar se existem elementos concretos que desconstituam a presunção de uso pessoal, como apontam as teses do STF no RE 635.659/SP.


Diante do exposto, é imperativo que o STJ reavalie sua decisão para alinhá-la com a interpretação constitucional e legal fornecida pelo STF, garantindo que a presunção de uso pessoal não seja facilmente desconsiderada sem provas sólidas de tráfico, assegurando assim a efetividade do habeas corpus como instrumento de proteção dos direitos fundamentais.


5. Da Precedência da Interpretação do STF

A necessidade de revisão da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no contexto do Habeas Corpus nº 960175 - DF (2024/0428671-2) surge da imperativa conformidade com a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário n. 635.659/SP. Este precedente estabeleceu uma tese de repercussão geral que redefine a interpretação legal e constitucional sobre a posse de pequenas quantidades de maconha, e sua aplicação é fundamental para assegurar a coerência e a uniformidade na aplicação do direito em todo o território nacional.


A. Princípio da Uniformidade da Jurisprudência:


Artigo 102, §3º, da Constituição Federal: Este dispositivo constitucional estabelece a competência do STF para julgar recursos extraordinários e a necessidade de demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso. A decisão do STF no RE 635.659, ao fixar uma tese sobre a quantidade de droga para distinguir o usuário do traficante, cria um precedente vinculante que deve ser observado por todos os órgãos do Poder Judiciário, incluindo o STJ, em virtude do princípio da uniformidade da jurisprudência.

Artigo 927 do Código de Processo Civil: Este artigo reforça o caráter vinculante das decisões do STF em matéria constitucional, determinando que "os juízes e os tribunais observarão" as súmulas vinculantes e os precedentes obrigatórios, o que inclui as teses de repercussão geral. A não observância desta disposição pode resultar em desrespeito à hierarquia jurisprudencial e à segurança jurídica.


B. Análise da Tese de Repercussão Geral:


A tese fixada no RE 635.659/SP pelo STF estabelece que a posse de até 40 gramas de maconha ou 6 plantas-fêmeas deve ser presumida como para consumo pessoal, salvo prova em contrário que indique intenção de tráfico. Esta presunção, embora relativa, é uma diretriz clara para a interpretação dos artigos 28 e 33 da Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006). 

Artigo 28 da Lei 11.343/2006: Trata do usuário e das sanções não penais, destacando a conduta de posse para consumo pessoal sem repercussão penal.

Artigo 33, §4º da Lei 11.343/2006: Prevê a possibilidade de redução de pena para traficantes primários ou de menor potencial ofensivo, o que deve ser interpretado à luz da nova tese do STF para evitar condenações desproporcionais ou inconstitucionais.


C. Consequências da Não Conformidade:


A persistência na decisão do STJ, que exige uma análise casuística detalhada em cada caso para a aplicação da tese do STF, pode levar a uma perpetuação de condenações que, sob o prisma do novo entendimento constitucional, não se sustentam. Tal prática viola:

Princípio da Razoabilidade e Proporcionalidade: Previstos implicitamente na Constituição, exigem que as decisões judiciais sejam equilibradas e justas, considerando a interpretação constitucional mais recente.

Direito à Liberdade Provisória (Art. 5º, LXI, CF): A presunção de inocência e o direito a uma avaliação justa das circunstâncias da conduta em questão são diretamente afetados quando a interpretação legal não se alinha com a jurisprudência constitucional.


D. Pedido de Revisão:


Requer-se, portanto, que a decisão do STJ seja revisitada para se adequar à interpretação do STF, garantindo que as condenações sejam reanalisadas sob a luz da nova tese de repercussão geral. Isso não apenas respeita o princípio da segurança jurídica e da isonomia, mas também assegura a correta aplicação da lei, evitando injustiças e desigualdades no tratamento legal dos casos similares.


Em conclusão, a revisão da decisão do STJ é imperativa para a correta aplicação da legislação penal sobre drogas conforme a interpretação constitucional mais atualizada, assegurando que a justiça seja administrada de forma uniforme e justa em todo o país.


III - DO PEDIDO

Diante do exposto, requer a Vossa Excelência:


a) Provimento do Recurso Extraordinário:


Anulação do Acórdão do Habeas Corpus nº 960175 - DF: Requer-se a concessão do presente Recurso Extraordinário para que seja anulado o acórdão proferido no Habeas Corpus nº 960175 - DF, com base nos seguintes fundamentos legais:

Violação ao Princípio da Isonomia (Art. 5º, caput, da CF/88): A aplicação indiscriminada de penas sem considerar a tese firmada pelo STF no RE 635.659 implica em tratamento desigual para situações idênticas, desrespeitando o direito fundamental à igualdade.

Interpretação do Art. 28 da Lei nº 11.343/2006: A referida legislação, que trata do porte de drogas para consumo pessoal, deve ser interpretada de acordo com o entendimento recente do STF, que presumiu o uso pessoal para quantidades até 40 gramas de maconha, salvo prova em contrário de intenção de tráfico.

Aplicação do Art. 5º, LXV, da CF/88 (Habeas Corpus): A Constituição Federal assegura a concessão de habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. No caso em tela, há evidente ilegalidade na manutenção de condenações que não se coadunam com a jurisprudência atual do STF.

Concessão da Ordem de Habeas Corpus: Solicita-se a liberação de todos os réus condenados por posse de até 40 gramas de maconha, salvo se por outro motivo estejam presos, em conformidade com o entendimento consolidado no RE 635.659, que estabelece a presunção de uso pessoal e não de tráfico para tais quantidades.

Anulação de Processos Criminais: Requer-se também a anulação dos processos criminais em curso pelos mesmos fatos, aplicando-se as medidas administrativas previstas na Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006), como advertência e medidas educativas (Art. 28, I e III), uma vez que tais processos não respeitam a interpretação constitucional e legal atual.


b) Remessa dos Autos ao STF:


Necessidade de Uniformização da Jurisprudência: Considerando que o STF já tem precedente estabelecido sobre a matéria (RE 635.659), requer-se a remessa dos autos ao STF para que se possa garantir a correta aplicação da tese de repercussão geral, evitando-se decisões conflitantes em instâncias inferiores.

Art. 102, III, "a", da CF/88: Este dispositivo constitucional permite ao STF conhecer do recurso extraordinário quando a decisão recorrida contrariar dispositivo da Constituição Federal, o que se verifica no caso presente pela violação ao princípio da isonomia e ao direito à liberdade.


c) Concessão de Efeito Suspensivo:


Art. 558 do Código de Processo Civil: Este artigo permite a atribuição de efeito suspensivo ao recurso, quando demonstrado risco de dano irreparável ou de difícil reparação. 

Risco de Dano Irreparável: A manutenção de prisões ou processos baseados em interpretações não alinhadas com o entendimento do STF pode resultar em prejuízo irreparável aos réus, que continuariam privados de liberdade indevidamente.

Pedido de Suspensão dos Efeitos da Decisão Recorrida: Solicita-se a concessão de efeito suspensivo ao presente recurso para que os efeitos da decisão do acórdão impugnado sejam imediatamente suspensos, garantindo-se assim a proteção aos direitos fundamentais dos réus enquanto a questão é devidamente reavaliada.


Termos em que, Pede Deferimento.


São Paulo, 22 de dezembro de 2024.

JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO