EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Processo de Referência: Habeas Corpus nº 259.256/SC
Agravante: Joaquim Pedro de Morais Filho
Agravada: Decisão Monocrática de fls. 15-16
Data e Hora do Protocolo: 22 de julho de 2025, às 13:33
RAZÕES DE AGRAVO REGIMENTAL
Egrégio Plenário, Colenda Turma, Ínclito Ministro Relator,
JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO, brasileiro, advogado, portador do CPF nº 133.036.496-18, já qualificado nos autos do processo em epígrafe, vem, com o devido respeito e acatamento, perante Vossa Excelência, inconformado com a decisão monocrática proferida pelo eminente Ministro Presidente, que negou seguimento ao Habeas Corpus nº 259.256/SC, interpor o presente AGRAVO REGIMENTAL, com fundamento no artigo 317 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF) e demais disposições aplicáveis, pelos fatos e razões de direito a seguir expostos.
I - DA TEMPESTIVIDADE E DO CABIMENTO
- A decisão monocrática agravada foi publicada em 21 de julho de 2025, conforme certidão de fls. 17, sendo o presente recurso interposto dentro do prazo regimental de 5 (cinco) dias, nos termos do artigo 317, caput, do RISTF, configurando sua tempestividade.
- O Agravo Regimental é cabível para submeter ao Colegiado competente a reapreciação de decisão monocrática que cause gravame à parte, especialmente quando a decisão padece de omissões ou erros que comprometem a prestação jurisdicional e a análise de questão constitucional de alta relevância, como no presente caso (STF, HC 143.641/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, j. 20/02/2018, DJe 27/04/2018).
II - SÍNTESE DA DECISÃO AGRAVADA
- A decisão monocrática proferida pelo eminente Ministro Presidente, constante de fls. 15-16, negou seguimento ao Habeas Corpus preventivo e coletivo nº 259.256/SC, sob o fundamento de que o pedido seria "manifestamente inviável" e "não se amolda a qualquer hipótese prevista no art. 102 da Constituição".
- Em síntese, a decisão limitou-se a uma análise formalista da competência do Supremo Tribunal Federal (STF), sem adentrar o mérito da grave denúncia apresentada: a criação, pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC), de uma "Vara Estadual de Organizações Criminosas" que opera em desconformidade com os princípios constitucionais do juiz natural, devido processo legal, publicidade dos atos processuais e vedação a tribunais de exceção, previstos nos artigos 5º, incisos XXXVII, LIII, LIV, LV e LX, da Constituição Federal de 1988 (CF/88).
- Com o devido respeito, a decisão agravada incorre em error in judicando e omissão teratológica, configurando negativa de prestação jurisdicional, ao não enfrentar as alegações de fundo que apontam para a existência de um tribunal de exceção em território nacional, com julgadores anônimos e práticas incompatíveis com o Estado Democrático de Direito.
III - DO MÉRITO RECURSAL: O ERROR IN JUDICANDO E A FLAGRANTE OMISSÃO
A) Da Omissão Grosseira e da Nulidade da Decisão por Negativa de Prestação Jurisdicional
- O Habeas Corpus impetrado trouxe à apreciação desta Corte uma questão de gravidade ímpar: a instituição, pelo TJSC, de uma "Vara Estadual de Organizações Criminosas" que opera sob um manto de sigilo e anonimato, violando frontalmente os pilares do Estado Democrático de Direito. Os fatos narrados no writ incluem:
- Ausência de Identificação do Julgador: As decisões judiciais são assinadas apenas com a designação genérica "Vara Estadual de Organizações Criminosas", sem identificação do magistrado ou colegiado responsável, em afronta ao princípio do juiz natural (art. 5º, LIII, CF/88).
- Ocultamento Físico do Julgador: Audiências realizadas por meios telemáticos utilizam recursos que distorcem a voz ou suprimem a imagem do juiz, tornando impossível ao acusado e à defesa identificar quem preside o ato processual, violando o princípio da publicidade (art. 5º, LX, CF/88).
- Concentração de Funções Investigativas e Jurisdicionais: A vara acumula funções de investigação e julgamento, em colaboração direta com o Ministério Público e a Polícia Judiciária, comprometendo a imparcialidade do julgador e o sistema acusatório (art. 5º, LIV, CF/88).
- Tais práticas configuram a materialização de um tribunal de exceção, expressamente vedado pelo artigo 5º, inciso XXXVII, da CF/88, e representam uma ruptura estrutural com os fundamentos do Estado Democrático de Direito. A jurisprudência do STF é uníssona ao rechaçar práticas que comprometam a transparência e a imparcialidade judicial, como no julgamento do HC 87.585/SP (Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, j. 27/11/2008, DJe 12/12/2008), que reforçou a obrigatoriedade de identificação do julgador como corolário do princípio do juiz natural.
- A decisão agravada, contudo, absteve-se de analisar tais alegações, limitando-se a declarar a inadequação da via eleita. Trata-se de decisão citra petita, que não enfrentou a causa de pedir, configurando negativa de prestação jurisdicional, em violação ao artigo 93, inciso IX, da CF/88, que exige a fundamentação das decisões judiciais. Nesse sentido, a doutrina de Luiz Guilherme Marinoni destaca que "a ausência de enfrentamento das teses jurídicas relevantes apresentadas pela parte constitui vício que compromete a validade da decisão judicial" (MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018, p. 245).
- A omissão da decisão agravada é especialmente grave diante do risco sistêmico de constrangimento ilegal à liberdade de locomoção de uma coletividade indeterminada de jurisdicionados, submetidos a medidas restritivas, como prisões preventivas, temporárias e interceptações telefônicas, proferidas por um juízo inconstitucional.
B) Do Pleno Cabimento do Habeas Corpus e da Competência Originária do STF
- A decisão agravada erra ao afirmar que o pedido não se amolda às hipóteses do artigo 102 da CF/88. A competência originária do STF é inequívoca, por duas razões cumulativas:
- Ato Coator Emanado de Tribunal e Omissão de Órgão Nacional (art. 102, I, 'i', CF/88): O Habeas Corpus foi impetrado contra (i) ato normativo do TJSC que instituiu a "Vara Estadual de Organizações Criminosas" e (ii) omissão do Presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que, nos termos do artigo 103-B, § 4º, da CF/88, tem o dever de fiscalizar a legalidade dos atos administrativos dos tribunais. A competência do STF para julgar Habeas Corpus contra atos de tribunais superiores ou autoridades diretamente sujeitas à sua jurisdição é pacífica (STF, HC 94.583/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, Pleno, j. 19/12/1997, DJe 20/03/1998).
- Violação Direta e Sistêmica à Constituição: A criação de um tribunal de exceção, com julgadores anônimos e concentração de funções inquisitoriais, atenta contra os fundamentos da República (art. 1º, CF/88) e os direitos fundamentais (art. 5º, CF/88). Em casos de violações estruturais que comprometem a arquitetura do Poder Judiciário, a competência do STF é inafastável, como demonstrado no HC 143.641/SP (Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, j. 20/02/2018, DJe 27/04/2018), que reconheceu a legitimidade do Habeas Corpus coletivo para coibir violações massivas de direitos.
- A negativa de competência neste caso equivale a permitir que práticas inconstitucionais prosperem sob o véu de formalismos processuais, frustrando a missão do STF como guardião da Constituição. Como ensina José Afonso da Silva, "o Supremo Tribunal Federal é o defensor último da ordem constitucional, especialmente em situações que envolvem ameaças aos direitos fundamentais" (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 40ª ed. São Paulo: Malheiros, 2017, p. 456).
C) Da Caracterização de Crime e da Gravidade Extrema dos Fatos Ignorados
- A decisão agravada falha em reconhecer a dimensão potencialmente criminal das práticas narradas. A criação de um tribunal de exceção, com julgadores anônimos, não é apenas uma irregularidade administrativa; configura, em tese, ilícitos penais graves:
- Crime de Abuso de Autoridade (Lei nº 13.869/2019): A ocultação da identidade do julgador e a condução de atos processuais sem transparência podem configurar crimes como a obtenção de prova por meios ilícitos (art. 25) ou a decretação de medidas restritivas manifestamente descabidas (art. 10). Tais condutas, quando praticadas por um juízo inconstitucional, agravam-se pela ausência de legitimidade.
- Crime Contra o Estado Democrático de Direito (Lei nº 14.197/2021): A criação de um tribunal secreto, que opera à margem da Constituição, pode ser enquadrada como tentativa de restringir o exercício do Poder Judiciário legítimo (art. 359-L), comprometendo a ordem democrática.
- A omissão da decisão agravada em enfrentar tais questões é alarmante. A jurisprudência do STF já reconheceu a gravidade de práticas que subvertem a ordem constitucional, como no julgamento do MS 33.063/DF (Rel. Min. Luiz Fux, Pleno, j. 02/06/2016, DJe 10/08/2016), que destacou o dever do CNJ de coibir atos administrativos inconstitucionais.
- Ignorar a denúncia de um "tribunal secreto" é, em última análise, compactuar com a erosão do Estado de Direito. A função do STF, como ensina Alexandre de Moraes, é "atuar como guardião proativo da Constituição, especialmente em face de ameaças sistêmicas aos direitos fundamentais" (MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 38ª ed. São Paulo: Atlas, 2022, p. 632).
IV - DOS PEDIDOS
Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, o Agravante requer a Vossas Excelências:
a) O conhecimento e o provimento integral do presente Agravo Regimental, nos termos do artigo 317 do RISTF;
b) A reforma da decisão monocrática agravada, para afastar o óbice de inadmissibilidade e determinar o processamento do Habeas Corpus nº 259.256/SC;
c) A análise imediata do pedido de medida liminar constante do Habeas Corpus originário, com a suspensão dos efeitos da resolução do TJSC que instituiu a "Vara Estadual de Organizações Criminosas" e de todos os atos judiciais dela emanados, até o julgamento de mérito;
d) O julgamento de mérito do Habeas Corpus pelo Colegiado competente, para declarar a inconstitucionalidade da resolução do TJSC, anular os atos judiciais restritivos de liberdade, determinar a identificação dos magistrados, instaurar procedimento administrativo pelo CNJ e garantir a remessa dos processos a varas competentes, conforme pedidos de fls. 9-10;
e) A tramitação prioritária do presente recurso e do Habeas Corpus, nos termos do artigo 657 do Código de Processo Penal e da Resolução nº 672/2020 do STF, dada a gravidade das violações constitucionais;
f) A intimação do Ministério Público Federal, nos termos do artigo 654, § 1º, do CPP, para manifestação sobre o Habeas Corpus;
g) A notificação das autoridades coatoras (Presidente do TJSC e Presidente do CNJ) para prestarem informações no prazo legal (art. 660, § 2º, CPP);
h) A publicação da decisão no Diário da Justiça Eletrônico e no sítio oficial do STF, assegurando a publicidade dos atos judiciais (art. 5º, LX, CF/88);
i) A comunicação do julgamento ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para adoção das providências cabíveis em suas esferas de competência.
Requer, por fim, que esta peça seja levada em mesa para julgamento pelo Plenário ou pela Turma competente, em razão da relevância constitucional da matéria.
Nestes termos, pede deferimento.
Brasília, 22 de julho de 2025, às 13:33.
Joaquim Pedro de Morais Filho
Advogado/Impetrante
CPF: 133.036.496-18
Bibliographic References
- MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
- SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 40ª ed. São Paulo: Malheiros, 2017.
- MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 38ª ed. São Paulo: Atlas, 2022.
- STF, HC 87.585/SP, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, j. 27/11/2008, DJe 12/12/2008.
- STF, HC 94.583/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, Pleno, j. 19/12/1997, DJe 20/03/1998.
- STF, HC 143.641/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, j. 20/02/2018, DJe 27/04/2018.
- STF, MS 33.063/DF, Rel. Min. Luiz Fux, Pleno, j. 02/06/2016, DJe 10/08/2016.
- Lei nº 13.869/2019 (Lei de Abuso de Autoridade).
- Lei nº 14.197/2021 (Crimes contra o Estado Democrático de Direito).