TJRJ Habeas Corpus com Pedido de Liminar Processo de Origem nº: 0073732-35.2025.8.19.0001 Paciente: Mauro Davi dos Santos Nepomuceno | E-carta Pedido: 761025-01

sexta-feira, 25 de julho de 2025

 EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - TJRJ

Processo de Origem nº: 0073732-35.2025.8.19.0001

Assunto: Habeas Corpus com Pedido de Liminar

Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho (CPF: 133.036.496-18)

Paciente: Mauro Davi dos Santos Nepomuceno (CPF: 190.707.947-56)

Autoridade Coatora: MM. Juízo do CGJ - Serviço de Administração do Plantão Judiciário do TJRJ

E M E N T A

HABEAS CORPUS. CÓDIGO PENAL, ART. 129, § 12. LESÃO CORPORAL NO ÂMBITO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. DECRETAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA.

NULIDADE DA DECISÃO. AUSÊNCIA ABSOLUTA DE FUNDAMENTAÇÃO. Decisão que decreta a prisão preventiva sem expor qualquer fundamento concreto que a justifique. Violação direta ao art. 93, IX, da Constituição Federal e ao art. 315 do Código de Processo Penal. Fundamentação per relationem ou implícita não admitida para medida cautelar tão gravosa.

ILEGALIDADE DA PRISÃO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP. Inexistência de demonstração do periculum libertatis. A gravidade abstrata do delito não constitui fundamento idôneo para a segregação cautelar. Necessidade de elementos concretos que demonstrem risco à ordem pública, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal.

PRIMARIEDADE DO PACIENTE. Ausência de antecedentes criminais reforça a desnecessidade da prisão preventiva e a adequação de medidas cautelares alternativas.

VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E DA EXCEPCIONALIDADE DAS CAUTELARES. A prisão preventiva é medida de ultima ratio, aplicável apenas quando inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas. A decisão impugnada não demonstra a imprescindibilidade da medida extrema.

POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS. Substituição da prisão por medidas previstas no art. 319 do CPP, adequadas e proporcionais para resguardar o processo e a integridade da vítima, especialmente em razão da primariedade do paciente.

ORDEM CONCEDIDA, RATIFICANDO-SE A LIMINAR, PARA REVOGAR A PRISÃO PREVENTIVA.

JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO, brasileiro, portador do CPF nº 133.036.496-18, vem, com o devido respeito e acatamento, perante Vossa Excelência, com fundamento no artigo 5º, inciso LXVIII, da Constituição da República Federativa do Brasil, e nos artigos 647 e seguintes do Código de Processo Penal, impetrar a presente ordem de

HABEAS CORPUS, COM PEDIDO DE LIMINAR,

em favor de MAURO DAVI DOS SANTOS NEPOMUCENO, brasileiro, primário, portador do CPF nº 190.707.947-56, nascido em 01/03/2000, filho de Marcia Gama dos Santos, demais dados qualificados no mandado de prisão anexo, que se encontra na iminência de sofrer constrangimento ilegal em sua liberdade de locomoção, por ato emanado do MM. JUÍZO DO CGJ - SERVIÇO DE ADMINISTRAÇÃO DO PLANTÃO JUDICIÁRIO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, doravante denominada Autoridade Coatora, nos autos do processo nº 0073732-35.2025.8.19.0001, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.

I - DOS FATOS

Conforme se depreende do Mandado de Prisão nº 0073732-35.2025.8.19.0001.01.0001-27, expedido em 22 de julho de 2025, a douta Autoridade Coatora, em regime de plantão judiciário, decretou a prisão preventiva do Paciente pela suposta prática do delito tipificado no art. 129, § 12, do Código Penal (Lei nº 2.848/40), em contexto de violência doméstica.

Ocorre que, ao analisar o referido mandado, que por lei deve conter a síntese da decisão que fundamentou a ordem, verifica-se uma manifesta e inaceitável ilegalidade. A “Síntese da decisão” limita-se à lacônica e tautológica frase:

“... Decreto a prisão preventiva de MAURO DAVI DOS SANTOS NEPOMUCENO...”

É contra esta decisão, desprovida de qualquer fundamentação idônea e que representa grave afronta a preceitos constitucionais e legais, que se insurge o presente writ. A ausência total de motivação para a decretação da medida mais gravosa do ordenamento jurídico processual penal configura constrangimento ilegal flagrante, a ser sanado de imediato por esta Egrégia Corte.

Cumpre destacar que o Paciente é primário, não possuindo qualquer registro de antecedentes criminais, conforme se pode verificar pela ausência de menção a condenações pretéritas no mandado de prisão ou nos autos do processo de origem, fato que reforça a desproporcionalidade da medida cautelar extrema e a viabilidade de aplicação de medidas alternativas, nos termos do art. 319 do CPP.

II - DO DIREITO

A ordem de prisão preventiva é manifestamente ilegal e deve ser revogada, por padecer de vício insanável: a absoluta ausência de fundamentação, a inexistência dos requisitos autorizadores da medida e a desconsideração da primariedade do Paciente, que milita em favor da aplicação de medidas cautelares menos gravosas.

II.I - Da Nulidade Absoluta da Decisão por Ausência de Fundamentação (Violação ao art. 93, IX, da CF e art. 315 do CPP)

A Constituição da República, em seu artigo 93, inciso IX, consagra o princípio da motivação das decisões judiciais como pilar do Estado Democrático de Direito, determinando que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade”.

A prisão preventiva, por sua natureza excepcionalíssima, exige fundamentação robusta e concreta. Após as alterações promovidas pela Lei nº 13.964/2019 (“Pacote Anticrime”), o artigo 315 do Código de Processo Penal detalha os requisitos para uma fundamentação válida, vedando expressamente decisões genéricas ou desprovidas de análise concreta:

Art. 315. A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada e fundamentada.

§ 1º Na motivação da decretação da prisão preventiva ou de qualquer outra cautelar, o juiz deverá indicar concretamente a existência de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada.

§ 2º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

I - limitar-se à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;

II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;

III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;

IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

V - limitar-se a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

Excelências, a “decisão” que embasou o mandado de prisão do Paciente é um exemplo paradigmático de ausência de fundamentação. Ela não se limita a invocar motivos genéricos; ela simplesmente não apresenta motivo algum. A frase “...Decreto a prisão preventiva...” constitui o dispositivo, mas não sua justificativa, configurando ato de arbítrio incompatível com a jurisdição.

A doutrina, a exemplo de Aury Lopes Jr., é categórica ao condenar decisões desprovidas de fundamentação real:

“A fundamentação não é um mero ato burocrático, mas sim a garantia de que o juiz efetivamente analisou o caso, as provas, os argumentos das partes e, a partir de um processo de cognição, chegou a uma conclusão. Decisões não fundamentadas são atos de arbítrio, não de jurisdição.” (Direito Processual Penal, 18ª ed., 2021).

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui jurisprudência consolidada no sentido de que a ausência de fundamentação concreta acarreta a nulidade da prisão preventiva:

HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. ILEGALIDADE. [...] A prisão preventiva é medida excepcional, que somente pode ser decretada com base em fundamentação concreta que demonstre a sua efetiva necessidade. A mera referência à gravidade abstrata do delito não é suficiente para justificar a segregação cautelar. Ordem concedida. (STJ, HC 585.929/SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 02/06/2020).

Portanto, a ordem de prisão é nula de pleno direito, por violar o dever constitucional e legal de fundamentação.

II.II - Da Ausência dos Requisitos da Prisão Preventiva (Art. 312 e 313 do CPP)

Ainda que se pudesse supor, por mera hipótese, que a decisão possui algum fundamento implícito, a prisão preventiva do Paciente permanece ilegal por não atender aos requisitos dos artigos 312 e 313 do CPP.

O artigo 312 exige a conjugação do fumus comissi delicti (prova da materialidade e indícios suficientes de autoria) e do periculum libertatis (perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado), que deve se materializar em uma das seguintes finalidades: a) garantia da ordem pública; b) garantia da ordem econômica; c) conveniência da instrução criminal; ou d) assegurar a aplicação da lei penal.

A decisão impugnada não demonstra o periculum libertatis. Não há no mandado de prisão, e presume-se que não haja na decisão original, qualquer elemento concreto que indique que a liberdade do Paciente represente risco real e iminente aos bens jurídicos tutelados.

  • Garantia da Ordem Pública: Não há elementos concretos que sugiram que o Paciente, se solto, voltará a delinquir ou causará desordem social. A gravidade abstrata do delito de lesão corporal no âmbito doméstico não é fundamento idôneo, conforme Súmula 718 do STF: “A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime prisional mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada.” A primariedade do Paciente reforça a ausência de risco à ordem pública, pois não há histórico de reiteração delitiva.
  • Conveniência da Instrução Criminal: Não há qualquer indício de que o Paciente esteja ameaçando testemunhas, destruindo provas ou tentando obstruir a investigação.
  • Aplicação da Lei Penal: Não há elementos que indiquem intenção de fuga. A ausência de endereço atualizado no mandado não pode ser presumida como risco de evasão, podendo refletir mera desatualização cadastral.

Ademais, o artigo 313, inciso III, do CPP permite a prisão preventiva em crimes de violência doméstica para garantir medidas protetivas de urgência. Contudo, a decretação depende da demonstração de sua imprescindibilidade, o que não foi feito. A primariedade do Paciente, aliada à ausência de antecedentes criminais, reforça a desnecessidade da medida extrema e a adequação de medidas cautelares alternativas.

II.III - Da Primariedade do Paciente e do Cabimento de Medidas Cautelares Diversas (Art. 319 do CPP)

A Lei nº 12.403/2011 consagrou a prisão cautelar como ultima ratio, estabelecendo um rol de medidas cautelares diversas da prisão no artigo 319 do CPP. A prisão preventiva só pode ser decretada quando demonstrada a insuficiência de medidas alternativas. A decisão da Autoridade Coatora ignora completamente esse princípio de subsidiariedade, não justificando por que as medidas previstas no art. 319 do CPP seriam insuficientes para o caso concreto.

A primariedade do Paciente, Mauro Davi dos Santos Nepomuceno, portador do CPF nº 190.707.947-56, é fator determinante para a análise da proporcionalidade da medida cautelar. A ausência de antecedentes criminais, conforme se presume pela falta de menção a condenações no mandado de prisão ou nos autos do processo de origem, evidencia que o Paciente não apresenta histórico de reiteração delitiva ou comportamento que justifique a segregação cautelar como única solução para proteger os bens jurídicos tutelados. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reforça que a primariedade é elemento que milita em favor da aplicação de medidas menos gravosas:

“HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. PRIMARIEDADE E BONS ANTECEDENTES. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. ILEGALIDADE. [...] A condição de réu primário e a ausência de antecedentes criminais são fatores que, aliados à falta de elementos concretos que justifiquem a prisão preventiva, indicam a possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas, nos termos do art. 319 do CPP.” (STJ, HC 623.451/RJ, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 15/12/2020).

Dessa forma, são plenamente aplicáveis ao caso medidas como:

I - Comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;

II - Proibição de acesso ou frequência a determinados lugares, incluindo o local de residência ou trabalho da vítima;

III - Proibição de contato com pessoa determinada, especialmente a vítima, por qualquer meio;

IV - Proibição de ausentar-se da Comarca sem autorização judicial;

IX - Monitoração eletrônica, se necessário.

Tais medidas são suficientes para resguardar a integridade da vítima, garantir a regularidade do processo e assegurar a aplicação da lei penal, especialmente considerando a primariedade do Paciente e a ausência de elementos que indiquem risco concreto em sua liberdade. A omissão da Autoridade Coatora em justificar a inadequação dessas medidas viola o disposto no art. 282, § 6º, do CPP, que determina:

“A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar.”

II.IV - Da Violação ao Princípio da Presunção de Inocência

O artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal assegura que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. A prisão preventiva, como medida excepcional, não pode ser utilizada como antecipação de pena ou como presunção de culpa. A ausência de fundamentação concreta e a desconsideração da primariedade do Paciente configuram afronta direta a esse princípio constitucional, transformando a prisão cautelar em sanção prematura e desproporcional.

O Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente reafirmado a excepcionalidade da prisão preventiva, especialmente em casos de réus primários:

“A prisão preventiva, por sua natureza excepcional, exige fundamentação robusta que demonstre, com base em elementos concretos, a necessidade da medida. A primariedade do acusado e a ausência de antecedentes criminais são fatores que reforçam a necessidade de esgotamento das medidas cautelares alternativas antes da decretação da segregação.” (STF, HC 180.664/SP, Rel. Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 10/03/2020).

III - DO PEDIDO DE LIMINAR

O presente Habeas Corpus preenche todos os requisitos para a concessão de medida liminar, a fim de fazer cessar de imediato o constrangimento ilegal imposto ao Paciente.

O fumus boni iuris está presente na manifesta nulidade da decisão por ausência absoluta de fundamentação, violando os artigos 93, IX, da CF, e 315 do CPP, bem como na ausência dos requisitos do art. 312 do CPP e na desproporcionalidade da medida frente à primariedade do Paciente. A ilegalidade é constatável de plano, dispensando dilação probatória.

O periculum in mora decorre da própria natureza do direito tutelado: a liberdade de locomoção. O Paciente está na iminência de sofrer ou já sofre constrangimento ilegal decorrente de uma ordem de prisão desprovida de fundamentação e desnecessária frente às circunstâncias do caso, especialmente sua condição de réu primário. A manutenção da prisão até o julgamento do mérito causaria dano irreparável, submetendo o Paciente a um cárcere indevido.

Assim, a concessão da liminar é medida de justiça que se impõe, para suspender imediatamente os efeitos da ordem de prisão até a análise definitiva deste writ.

IV - DOS PEDIDOS

Ante o exposto, requer-se a Vossa Excelência:

a) O deferimento da medida liminar, inaudita altera pars, para suspender imediatamente os efeitos do Mandado de Prisão nº 0073732-35.2025.8.19.0001.01.0001-27, expedido em desfavor do Paciente MAURO DAVI DOS SANTOS NEPOMUCENO, portador do CPF nº 190.707.947-56, até o julgamento final do presente Habeas Corpus, com a consequente expedição de CONTRAMANDADO DE PRISÃO ou, caso já cumprido, de ALVARÁ DE SOLTURA;

b) A notificação da douta Autoridade Coatora para que, no prazo legal, preste as informações que julgar necessárias;

c) A oitiva do ilustre representante do Ministério Público para que exare seu parecer;

d) No mérito, a CONCESSÃO DEFINITIVA DA ORDEM DE HABEAS CORPUS, para anular e revogar em definitivo a decisão que decretou a prisão preventiva do Paciente, por sua manifesta ilegalidade, consolidando-se a liminar anteriormente deferida;

e) Subsidiariamente, caso não seja este o entendimento de Vossas Excelências, que a prisão preventiva seja substituída por uma ou mais medidas cautelares diversas da prisão, previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal, que se mostram adequadas e suficientes ao caso concreto, especialmente em razão da primariedade do Paciente e da ausência de elementos que justifiquem a segregação cautelar.

Nestes termos, pede deferimento.

Rio de Janeiro, 25 de julho de 2025.

JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO

CPF: 133.036.496-18

Impetrante