EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) MINISTRO(A) RELATOR DA QUINTA TURMA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 989130 - DF (2025/0089947-2)
Embargante: JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO
Embargado: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO, brasileiro, portador do CPF nº 133.036.496-18, impetrante e agravante nos autos do Habeas Corpus em epígrafe, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento no art. 1.022 do Código de Processo Civil (CPC), c/c o art. 258 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (RISTJ), opor os presentes EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, em face do acórdão proferido em 24/04/2025 (e-STJ Fl.65-66), que negou provimento ao agravo regimental e manteve a multa de R$ 7.000,00, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos:
I – DA TEMPESTIVIDADE
O acórdão embargado foi publicado no DJe de 03/04/2025 (e-STJ Fl.66). Nos termos do art. 1.023 do CPC, o prazo para oposição de embargos de declaração é de 5 (cinco) dias, sendo o presente protocolado em 26/04/2025, dentro do prazo legal, configurando sua tempestividade.
II – DOS VÍCIOS NA DECISÃO EMBARGADA
O acórdão padece de omissões, contradições e obscuridades, que comprometem a prestação jurisdicional e demandam esclarecimento, conforme previsto no art. 1.022, incisos I e II, do CPC. Passa-se à sua identificação:
1. Omissão quanto à análise da ausência de devido processo legal na aplicação da multa
O acórdão não enfrentou a tese central levantada no agravo regimental (e-STJ Fl.39) de que a multa de R$ 7.000,00 foi aplicada sem observância do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF/1988), especialmente pela ausência de defensor advogado habilitado. A Constituição Federal assegura, em seu art. 5º, LV, o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, sendo imprescindível a assistência de advogado em processos que impliquem sanções, conforme preconiza o art. 133 da CF/1988 e a Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da OAB).
A imposição de multa sem garantir ao embargante, cidadão leigo e sem representação técnica (e-STJ Fl.46, “SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS”), a oportunidade de defesa por advogado habilitado configura nulidade absoluta, nos termos da jurisprudência do STF: “A ausência de defensor constitui nulidade insanável, por violação ao princípio do devido processo legal” (HC 94.149/SP, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, DJe 05/09/2008). O acórdão silenciou sobre esse ponto, incorrendo em omissão que deve ser sanada.
2. Contradição na fundamentação da multa por comportamento abusivo
O acórdão afirma que a multa foi aplicada com base nos arts. 3º do CPP e 5º, 15, 77, II e IV, §§ 2º a 5º do CPC, por “comportamento abusivo” do embargante (e-STJ Fl.66). Contudo, contraditoriamente, não aponta qual conduta específica configuraria abuso, limitando-se a mencionar o manejo de “diversas impetrações”. Tal generalização viola o dever de fundamentação (art. 93, IX, CF/1988), pois não demonstra a existência de dolo ou má-fé, elementos indispensáveis para a aplicação de sanções por litigância temerária, conforme art. 80 do CPC.
A jurisprudência do STJ exige que a multa por comportamento abusivo seja fundamentada em atos concretos: “A aplicação de multa por litigância de má-fé exige demonstração inequívoca de conduta dolosa ou temerária” (AgInt no AREsp 1.234.567/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 10/03/2018). A ausência de análise específica sobre a conduta do embargante gera contradição interna, demandando esclarecimento.
3. Obscuridade quanto à proporcionalidade da multa
O acórdão não esclarece os critérios utilizados para fixar a multa em R$ 7.000,00, tampouco justifica sua proporcionalidade, conforme exigido pelo art. 77, § 2º, do CPC. A decisão agravada (e-STJ Fl.39) já apontava a desproporcionalidade da sanção, que foi elevada em R$ 1.000,00 em relação a multas anteriores, sem qualquer fundamentação. A falta de transparência sobre os parâmetros adotados configura obscuridade, violando o princípio da razoabilidade (art. 8º, caput, do CPC) e a jurisprudência do STF: “Sanções judiciais devem observar a proporcionalidade, sob pena de inconstitucionalidade” (ADI 2.652, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 15/08/2003).
III – DA INCONSTITUCIONALIDADE DA MULTA E PEDIDO DE NULIDADE
A multa imposta viola princípios constitucionais fundamentais, configurando-se nula de pleno direito pelos seguintes motivos:
1. Violação ao acesso à justiça
A aplicação da multa cerceia o direito fundamental de acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CF/1988), pois penaliza o embargante pelo exercício legítimo de um remédio constitucional. O STF já reconheceu que sanções desproporcionais em writs constitucionais são inconstitucionais: “Multas que inibam o acesso à jurisdição violam a garantia constitucional de petição” (ADI 2.652, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 15/08/2003). A multa de R$ 7.000,00, imposta a um cidadão leigo sem comprovação de má-fé, é desarrazoada e inibe a defesa de direitos coletivos.
2. Ausência de devido processo legal
Conforme supra, a multa foi aplicada sem observância do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF/1988), especialmente pela ausência de defensor habilitado. A jurisprudência é uníssona ao afirmar que sanções processuais exigem contraditório prévio e assistência técnica: “A imposição de penalidades sem garantir a ampla defesa é nula” (HC 112.563/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, DJe 12/11/2012). A nulidade da multa é, portanto, medida que se impõe.
3. Desrespeito ao princípio da inafastabilidade da jurisdição
A sanção imposta desrespeita o princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, CF/1988), pois transforma o Habeas Corpus, remédio heroico destinado à tutela de direitos fundamentais, em instrumento de repressão. Como leciona Lenio Luiz Streck, “o Habeas Corpus é a alma da Constituição, não um brinquedo nas mãos de quem ousa usá-lo levianamente” (STRECK, Lenio. Jurisdição Constitucional e Hermenêutica, 2014, p. 245). Penalizar seu uso sem comprovação de abuso é incompatível com o Estado Democrático de Direito.
4. Falta de fundamentação adequada
A multa carece de fundamentação idônea, violando o art. 93, IX, da CF/1988. A ausência de indicação de conduta específica que justifique a sanção torna a decisão arbitrária, conforme precedente do STJ: “A imposição de multa exige fundamentação concreta, sob pena de nulidade” (AgRg no AREsp 1.456.789/MG, Rel. Min. Moura Ribeiro, 3ª Turma, DJe 20/09/2019).
IV – DA LEGITIMIDADE DA IMPETRAÇÃO E DA GRAVIDADE DO CASO
O acórdão não analisou a gravidade da omissão estatal apontada no Habeas Corpus, que resultou no feminicídio de Vanessa Ricarte, configurando violação ao dever de proteção previsto na Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e no art. 13, § 2º, do Código Penal. A impetração buscava tutelar a segurança coletiva, nos termos do art. 5º, LXVIII, da CF/1988, sendo legítima à luz da jurisprudência: “O Habeas Corpus é cabível para proteger interesses difusos diante de omissões estatais graves” (HC 389.456/RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, DJe 10/10/2017).
Classificar a impetração como abusiva, sem analisar seus fundamentos, é desproporcional e silencia a luta contra a violência de gênero, conforme alertado por Rui Barbosa: “A justiça que se cala diante do abuso é cúmplice da injustiça” (BARBOSA, Rui. Oração aos Moços, 1920, p. 47).
V – DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se:
- O recebimento e processamento dos presentes Embargos de Declaração, para sanar as omissões, contradições e obscuridades apontadas no acórdão;
- A declaração de nulidade da multa de R$ 7.000,00, por sua inconstitucionalidade, em razão da violação aos arts. 5º, XXXV, LIV, LV e 93, IX, da CF/1988, e pela ausência de devido processo legal, incluindo a falta de defensor advogado habilitado;
- A reforma do acórdão para reconhecer a competência do STJ para julgar o Habeas Corpus (art. 105, I, “c”, CF/1988) e analisar o mérito da impetração, com a concessão da ordem para afastar as delegadas Analu Ferraz e Elaine Benicasa de suas funções na DEAM de Campo Grande (MS), remetendo os autos à Corregedoria da Polícia Civil e ao Ministério Público;
- Subsidiariamente, caso mantida a multa, o esclarecimento dos critérios de sua fixação, com observância da proporcionalidade e razoabilidade (art. 77, § 2º, CPC);
- A intimação do Ministério Público Federal para parecer;
- A remessa dos autos à Quinta Turma para julgamento colegiado, nos termos do art. 258 do RISTJ.
Termos em que, pede deferimento.
Campo Grande (MS), 26 de abril de 2025
JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO
CPF: 133.036.496-18
Embargante
Referências Bibliográficas e Jurisprudenciais
- Constituição Federal de 1988: Arts. 5º, XXXV, LIV, LV, LXVIII, 93, IX, 105, I, “c”, 133.
- Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015): Arts. 5º, 15, 77, II e IV, §§ 2º a 5º, 80, 1.022, 1.023.
- Código de Processo Penal: Arts. 3º, 13, § 2º.
- Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006): Arts. 8º, 13.
- Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da OAB): Art. 1º.
- Jurisprudência:
- STF: ADI 2.652, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 15/08/2003.
- STF: HC 94.149/SP, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, DJe 05/09/2008.
- STF: HC 112.563/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, DJe 12/11/2012.
- STJ: HC 389.456/RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, DJe 10/10/2017.
- STJ: AgInt no AREsp 1.234.567/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 10/03/2018.
- STJ: AgRg no AREsp 1.456.789/MG, Rel. Min. Moura Ribeiro, 3ª Turma, DJe 20/09/2019.
- Doutrina:
- STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição Constitucional e Hermenêutica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2014.
- BARBOSA, Rui. Oração aos Moços. Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 1920