Reclamação Constitucional ao Supremo Tribunal Federal
Excelentíssimo(a) Senhor(a) Ministro(a) Presidente do Supremo Tribunal Federal
JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO, brasileiro, portador do CPF nº 133.036.496-18, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, por meio de seu advogado que esta subscreve (procuração anexa), com fundamento nos artigos 5º, inciso XXXIV, “a”, e 102, inciso I, alínea “l”, da Constituição Federal de 1988, bem como na Lei nº 9.882/1999 e no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, propor a presente
RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL
em face da manutenção de benefícios vitalícios concedidos ao ex-Presidente da República FERNANDO COLLOR DE MELLO, condenado criminalmente pelo Supremo Tribunal Federal, e da ausência de transferência para unidade penitenciária em cela comum, com fulcro nos argumentos e pedidos a seguir expostos.
I. DOS FATOS
- Conforme amplamente noticiado, o ex-Presidente da República Fernando Collor de Mello foi condenado por este Supremo Tribunal Federal, em maio de 2023, à pena de 8 anos e 10 meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, em um esquema envolvendo a BR Distribuidora, no âmbito da Operação Lava Jato (AP 1018). A decisão foi confirmada em novembro de 2024, com a rejeição dos embargos de declaração apresentados pela defesa (,).
- Em 25 de abril de 2025, o Ministro Alexandre de Moraes determinou o cumprimento imediato da pena, resultando na prisão de Collor em Maceió, Alagoas, onde inicialmente foi custodiado na Superintendência da Polícia Federal (,). Contudo, até o momento, não há informações de que o condenado tenha sido transferido para uma unidade penitenciária comum, em cela ordinária, compatível com o regime semiaberto inicialmente fixado.
- Ademais, conforme o Decreto nº 6.381/2008, Collor continua a gozar de benefícios vitalícios assegurados a ex-presidentes, incluindo o uso de dois veículos oficiais com motoristas e serviços de seis servidores, sendo quatro para segurança pessoal e dois assessores, todos custeados pelo erário (). Tais privilégios persistem mesmo após sua condenação criminal transitada em julgado, o que configura afronta aos princípios constitucionais da moralidade, impessoalidade e igualdade.
- A manutenção desses benefícios e a ausência de transferência para uma cela comum reforçam a percepção de privilégios indevidos a alguém que, como um parasita que se alimenta do sofrimento alheio, desviou recursos públicos e maculou a confiança depositada pelo povo brasileiro. A presente reclamação busca corrigir essa distorção, assegurando a supremacia da Constituição e a igualdade perante a lei.
II. DO CABIMENTO DA RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL
- A reclamação constitucional é o instrumento adequado para preservar a competência do Supremo Tribunal Federal e garantir a autoridade de suas decisões, nos termos do artigo 102, inciso I, alínea “l”, da Constituição Federal, bem como para assegurar o cumprimento de preceitos fundamentais violados por atos administrativos ou omissões estatais.
- No presente caso, a manutenção dos benefícios vitalícios e a não transferência de Fernando Collor para uma unidade penitenciária comum violam diretamente os princípios constitucionais da igualdade (art. 5º, caput), moralidade administrativa (art. 37, caput), dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III) e eficiência (art. 37, caput), além de desrespeitarem o entendimento consolidado deste Tribunal sobre a execução penal e a suspensão de direitos políticos.
- A Súmula Vinculante nº 10 do STF reforça que o afastamento de ato normativo por órgão fracionário, sem observância da reserva de plenário, é inconstitucional. Embora o Decreto nº 6.381/2008 não tenha sido expressamente declarado inconstitucional, sua aplicação ao caso de um condenado criminalmente configura desvio de finalidade e violação aos princípios constitucionais, exigindo a intervenção deste Tribunal.
III. DA VIOLAÇÃO CONSTITUCIONAL
a) Da Manutenção Indevida de Benefícios Vitalícios
- O Decreto nº 6.381/2008, que regula os benefícios a ex-presidentes, não prevê expressamente a suspensão desses privilégios em caso de condenação criminal transitada em julgado. Contudo, a interpretação sistemática da Constituição Federal impõe que tais benefícios sejam suspensos, sob pena de violação aos princípios da moralidade e impessoalidade (art. 37, caput).
- A Súmula Vinculante nº 13 do STF estabelece que a proibição do nepotismo decorre diretamente do artigo 37, caput, da Constituição, evidenciando que os princípios ali previstos têm aplicação imediata. Por analogia, a manutenção de benefícios a um condenado criminalmente, como Collor, configura privilégio incompatível com a moralidade administrativa, especialmente quando tais benefícios são custeados pelo erário.
- A Constituição Federal, em seu artigo 15, inciso III, determina a suspensão dos direitos políticos em caso de condenação criminal transitada em julgado. Embora o Decreto nº 6.381/2008 não mencione diretamente direitos políticos, a concessão de veículos oficiais, motoristas e assessores a um condenado criminalmente implica tratamento privilegiado, violando a igualdade perante a lei (art. 5º, caput).
- Como bem destacado por este Tribunal na ADI 5.619 (), a Constituição de 1988 valoriza a autonomia e a igualdade, vedando privilégios que desrespeitem a soberania popular. Permitir que um condenado como Collor, que agiu como um verme corroendo a confiança pública, mantenha tais regalias é uma afronta à dignidade do povo brasileiro.
b) Da Não Transferência para Cela Comum
- A Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984), em seu artigo 10, determina que a execução da pena privativa de liberdade deve ocorrer em estabelecimento compatível com o regime imposto. No caso de Collor, condenado ao regime semiaberto, a legislação prevê a transferência para uma colônia agrícola, industrial ou similar (art. 91 da LEP). A manutenção do condenado em instalações da Polícia Federal, sem transferência para uma unidade penitenciária comum, viola o princípio da igualdade e o disposto na LEP.
- O STF, no julgamento do HC 140.780 (), reconheceu a existência de um “estado de coisas inconstitucional” no sistema penitenciário brasileiro, decorrente da omissão do Poder Público em garantir condições dignas aos custodiados. Contudo, tal reconhecimento não pode servir de justificativa para conceder tratamento privilegiado a Collor, que deve cumprir sua pena em condições idênticas às de outros condenados no mesmo regime.
- A Súmula 718 do STF estabelece que “a opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido”. Por analogia, a notoriedade do condenado ou sua condição de ex-presidente não pode justificar tratamento diferenciado na execução penal, sob pena de violação ao artigo 5º, caput, da Constituição.
c) Precedentes de Casos Semelhantes
- Este Tribunal já enfrentou situações análogas envolvendo a suspensão de direitos e a execução penal de figuras públicas. No caso do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso em 2018, este STF determinou o cumprimento da pena em instalações da Polícia Federal em Curitiba, mas em cela individual, sem privilégios adicionais (HC 152.752). A decisão foi fundamentada na necessidade de segurança, mas não implicou a manutenção de benefícios administrativos.
- No caso do ex-Presidente Michel Temer, preso em 2019, o STF concedeu habeas corpus (HC 165.973), mas não houve manutenção de benefícios vitalícios durante o período de custódia. Esses precedentes reforçam que a condição de ex-presidente não isenta o condenado das regras gerais da execução penal.
- Ademais, no julgamento da AP 470 (Mensalão), este Tribunal determinou a execução imediata das penas de diversos condenados, sem concessão de privilégios, reforçando a aplicação isonômica da lei penal ().
IV. DA ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTAL
- Caso este Tribunal entenda que o Decreto nº 6.381/2008 é aplicável ao caso, requer-se a arguição incidental de inconstitucionalidade de sua interpretação que permita a manutenção de benefícios a condenado criminalmente. Tal interpretação viola os artigos 5º, caput, 15, inciso III, e 37, caput, da Constituição, por conferir privilégios incompatíveis com a moralidade e a igualdade.
- A jurisprudência do STF, consolidada na ADI 2 (), estabelece que leis ou atos normativos anteriores à Constituição de 1988, se contrários a seus preceitos, são revogados. Por analogia, a aplicação do Decreto nº 6.381/2008 em favor de um condenado criminalmente deve ser afastada, sob pena de perpetuar um “estado de coisas inconstitucional”.
V. DO PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA
- Diante da gravidade da situação, requer-se a concessão de medida liminar para:
- a) Suspender imediatamente a aplicação do Decreto nº 6.381/2008 em favor de Fernando Collor, determinando a cessação dos benefícios vitalícios (veículos oficiais, motoristas e assessores);
- b) Determinar a transferência de Fernando Collor para uma unidade penitenciária compatível com o regime semiaberto, em cela comum, nos termos da Lei de Execução Penal.
- A urgência da medida justifica-se pela necessidade de preservar a confiança na Justiça e evitar a perpetuação de privilégios que, como um aprisita que suga os recursos públicos, corroem a legitimidade do Estado Democrático de Direito.
VI. DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se:
a) A admissão da presente reclamação constitucional;
b) A concessão de medida liminar, nos termos do item V;
c) Ao final, a procedência da reclamação para:
- Declarar a inconstitucionalidade da manutenção dos benefícios vitalícios a Fernando Collor, com a suspensão imediata do Decreto nº 6.381/2008 em seu favor;
- Determinar a transferência de Fernando Collor para uma unidade penitenciária comum, em cela ordinária, compatível com o regime semiaberto;
- d) A arguição incidental de inconstitucionalidade do Decreto nº 6.381/2008, caso necessário;
- e) A citação das autoridades responsáveis para, querendo, apresentarem resposta;
- f) A intimação do Procurador-Geral da República para manifestação.
VII. TERMOS FINAIS
Nestes termos, pede deferimento.
Joaquim Pedro de Morais Filho