EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 10ª VARA FEDERAL CRIMINAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL
Processo nº 1001200-68.2025.4.01.3400
Classe: Habeas Corpus Criminal
JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO, já qualificado nos autos do processo em epígrafe, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento no artigo 593, inciso I, do Código de Processo Penal (CPP), interpor o presente RECURSO DE APELAÇÃO contra a sentença prolatada em 24/03/2025 (ID 2178243757), que extinguiu o processo sem resolução de mérito, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos:
I – DA TEMPESTIVIDADE DO RECURSO
Nos termos do artigo 586 do CPP, o prazo para interposição da apelação em processos criminais é de 5 (cinco) dias, contados da intimação da sentença. Contudo, o impetrante/apelante não foi devidamente intimado da decisão proferida em 24/03/2025, conforme determina o artigo 578 do CPP, combinado com o artigo 798, § 5º, do mesmo diploma legal, que assegura a obrigatoriedade de intimação pessoal das partes em processos criminais, especialmente em habeas corpus, dada sua natureza célere e constitucional.
A ausência de intimação formal ao impetrante, seja por meio eletrônico no sistema PJe ou por qualquer outro meio legalmente previsto, impede o início da contagem do prazo recursal. Assim, nos termos do artigo 798, § 5º, do CPP, o prazo para recorrer não se encontra esgotado, sendo este recurso tempestivo. Requer-se, ainda, a comprovação nos autos da falha na intimação, o que constitui vício processual apto a justificar a reabertura da análise do mérito.
II – DOS FATOS
O apelante impetrou habeas corpus com o objetivo de obter a exoneração imediata do Sr. Antônio Roberto Cesário de Sá, Secretário da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado do Ceará (SSPDS/CE), e a instauração de investigação sobre sua gestão, sob a alegação de omissão e ineficiência no combate à escalada da criminalidade no estado, notadamente vinculada às ações de facções criminosas.
A petição inicial (ID 2165846497) fundamentou-se em fatos concretos, como o aumento de homicídios, assaltos a bancos, rebeliões em presídios e controle territorial por facções, bem como em dispositivos constitucionais (art. 5º, LXVIII, e art. 144 da CF) e legais (arts. 647 e seguintes do CPP), argumentando que tal omissão configura constrangimento indireto à liberdade de locomoção da população cearense.
O Ministério Público Federal (MPF), em manifestação (ID 2166381469), opinou pelo não conhecimento do habeas corpus, sob o fundamento de que: (i) a pretensão não envolve violação à liberdade de locomoção, sendo inadequada a via eleita; e (ii) a questão não atrai a competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, IV, da CF.
A sentença (ID 2178243757) acolheu integralmente o parecer do MPF, extinguindo o processo sem resolução de mérito (art. 485, I, do CPC), por entender que: (i) o habeas corpus não é a via adequada, pois não há constrangimento à liberdade de locomoção; e (ii) a Justiça Federal é incompetente para julgar o pedido.
O apelante opõe-se à decisão, sustentando sua nulidade e a necessidade de reforma, conforme se passa a demonstrar.
III – DAS IRREGULARIDADES NA DECISÃO E DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS
1. Da Competência da Justiça Federal
A sentença e o parecer do MPF equivocam-se ao afirmar que a Justiça Federal é incompetente para julgar o pedido. O artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal estabelece que compete aos juízes federais processar e julgar causas em que a União tenha interesse, ainda que indireto. No presente caso, a omissão da SSPDS/CE no combate ao crime organizado tem repercussão nacional, dado que:
- Integração do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP): A Lei nº 13.675/2018 instituiu o SUSP, que prevê a coordenação entre União, estados e municípios na segurança pública. A ineficiência de um ente federado, como o Ceará, compromete a política nacional de combate ao crime organizado, afetando interesses da União.
- Precedentes do STF e STJ: A Súmula 690 do STF dispõe que "compete à Justiça Federal processar e julgar habeas corpus quando a coação for atribuída a autoridade sujeita à jurisdição federal". Embora o Secretário seja autoridade estadual, a omissão em questão envolve reflexos em políticas federais, como o controle de facções com atuação interestadual (PCC e Comando Vermelho), o que atrai a competência federal por conexão (art. 76, III, do CPP).
- Interesse da União: O tráfico de drogas e armas, citado na petição inicial, frequentemente envolve operações investigadas pela Polícia Federal, configurando interesse direto da União (art. 109, I, da CF).
Assim, a Justiça Federal é competente para apreciar o pedido, sendo a decisão de extinção por incompetência um erro de interpretação jurídica que deve ser reformado.
2. Do Cabimento do Habeas Corpus
A sentença e o MPF erram ao restringir o habeas corpus exclusivamente à proteção da liberdade de locomoção física. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) tem ampliado o alcance do remédio constitucional para situações de constrangimento indireto ou omissão estatal que afetem direitos fundamentais:
- Precedente – HC 84.687/SP: O STF reconheceu o cabimento de habeas corpus em caso de inação estatal que implicasse ameaça à segurança e liberdade individual.
- Precedente – HC 100.618/SP: Ampliou-se o conceito de coação ilegal para incluir omissões que coloquem em risco a incolumidade física dos cidadãos.
No caso concreto, a petição inicial demonstra que a escalada da violência no Ceará, associada à alegada omissão do Secretário, gera um constrangimento indireto à liberdade de locomoção da população, que vive sob constante ameaça de facções criminosas. Exemplos como a tentativa de chacina na Barra do Ceará e o controle territorial em Pirambu evidenciam que os cidadãos estão privados de exercer plenamente seu direito de ir e vir em segurança, o que justifica a utilização do habeas corpus.
Ademais, o artigo 5º, inciso XXXV, da CF assegura o acesso à justiça para lesão ou ameaça a direito, e o artigo 144 da CF impõe ao Estado o dever de garantir a segurança pública. A omissão do Secretário, se configurada, viola esses preceitos, legitimando a intervenção judicial via habeas corpus.
3. Da Irregularidade na Extinção sem Mérito
A extinção do processo sem análise do mérito, com base no art. 485, I, do CPC, é irregular, pois:
- Falta de contraditório: A decisão foi proferida sem que o impetrante tivesse oportunidade de rebater o parecer do MPF, violando o princípio do contraditório (art. 5º, LV, da CF).
- Ausência de intimação: Como já mencionado, o impetrante não foi intimado da sentença, o que constitui cerceamento de defesa e nulidade processual (art. 564, III, "c", do CPP).
- Erro na apreciação da prova: A sentença desconsiderou os fatos narrados na inicial (aumento da criminalidade, omissão da SSPDS/CE), que poderiam configurar constrangimento passível de análise em habeas corpus, optando por uma extinção prematura.
IV – DO MÉRITO: NECESSIDADE DE INVESTIGAÇÃO E REFORMA DA DECISÃO
A petição inicial não busca apenas a exoneração do Secretário, mas também a investigação de sua gestão, o que é medida legítima e proporcional frente aos fatos narrados. A omissão estatal no combate ao crime organizado pode configurar, em tese, o crime de prevaricação (art. 319 do Código Penal) ou improbidade administrativa (Lei nº 8.429/1992), justificando a intervenção judicial.
A reforma da sentença é necessária para:
- Reconhecer o cabimento do habeas corpus e a competência da Justiça Federal.
- Determinar a instauração de investigação sobre a gestão da SSPDS/CE, com participação do MPF, para apurar responsabilidades.
- Garantir o direito constitucional à segurança pública (art. 144 da CF), ameaçado pela ineficiência alegada.
V – DO PEDIDO
Diante do exposto, requer-se:
- O recebimento e processamento deste recurso de apelação, por ser tempestivo e estar em conformidade com o artigo 593, I, do CPP.
- A nulidade da sentença por vício processual, ante a ausência de intimação do impetrante, com a remessa dos autos ao juízo de origem para regularização e novo julgamento.
- No mérito, a reforma integral da sentença, para:
- Reconhecer a competência da Justiça Federal e o cabimento do habeas corpus.
- Determinar a instauração de investigação sobre a gestão da SSPDS/CE, com participação do MPF.
- A concessão da justiça gratuita, já deferida na origem, nos termos do art. 5º, LXXIV, da CF.
- A remessa dos autos ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) para julgamento.
Termos em que, pede deferimento.
Brasília-DF, 01 de abril de 2025.
JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO
Impetrante/Apelante