AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS Nº 256.553/DF
EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
AGRAVO REGIMENTAL
Agravante: Joaquim Pedro de Moraes Filho
CPF: 133.036.496-18
Paciente: Contribuintes em Geral (Interesse Público)
Autoridade Coatora: Interpretação Jurídica Geral Aplicada por Juízos Criminais e Órgãos Administrativos da Receita Federal do Brasil
Relator: Ministro Luís Roberto Barroso
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL TRIBUTÁRIO. CRIMES FISCAIS NÃO TIPIFICADOS. IGNORÂNCIA DA LEI COMO EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA LEGALIDADE ESTRITA (ART. 5º, XXXIX, CF/88), AMPLA DEFESA (ART. 5º, LV, CF/88) E DEVIDO PROCESSO LEGAL (ART. 5º, LIV, CF/88). COMPLEXIDADE DAS NORMAS TRIBUTÁRIAS INTERNACIONAIS (FATCA, DECRETO Nº 8.506/2015). ERROS NA DECISÃO MONOCRÁTICA. LEGITIMIDADE DO AGRAVANTE. CABIMENTO DO HABEAS CORPUS. PRECEDENTES DO STF. NECESSIDADE DE REFORMA DA DECISÃO.
DA PETIÇÃO
À Vossa Excelência,
JOAQUIM PEDRO DE MORAES FILHO, brasileiro, portador do CPF nº 133.036.496-18, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento no artigo 317 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), interpor o presente AGRAVO REGIMENTAL contra a decisão monocrática proferida pelo eminente Ministro Presidente, nos autos do Habeas Corpus nº 256.553/DF, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos.
I. DOS FATOS
- O agravante impetrou Habeas Corpus com pedido liminar em favor de contribuintes em geral, buscando proteger contra constrangimento ilegal decorrente da interpretação jurídica aplicada por juízos criminais e órgãos administrativos da Receita Federal do Brasil, que desconsideram a defesa de ignorância da lei em crimes fiscais não tipificados, especialmente relacionados à não declaração de impostos internacionais (FATCA e Decreto nº 8.506/2015).
- A decisão monocrática, proferida em 21/05/2025, negou seguimento ao Habeas Corpus, sob os seguintes fundamentos:
- a) Ausência de cabimento do Habeas Corpus, por não se enquadrar nas hipóteses do art. 102 da CF/88 e arts. 647, 647-A e 650, I, do CPP, devido à falta de demonstração de lesão à liberdade de locomoção;
- b) Ilegitimidade ativa do requerente, por não demonstrar direito subjetivo violado e por não estar autorizado a defender direitos coletivos;
- c) Ausência de capacidade postulatória, por não ser advogado;
- d) Aplicação de multa por litigância temerária, com base em supostos pedidos reiteradamente inadmissíveis.
- A decisão recorrida contém erros materiais e jurídicos que justificam sua reforma, conforme demonstrado a seguir.
II. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS
1. DOS ERROS DA DECISÃO MONOCRÁTICA
A decisão monocrática padece de equívocos que violam os princípios constitucionais do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF/88), do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV, CF/88), bem como desconsidera precedentes vinculantes do próprio Supremo Tribunal Federal. Passa-se à análise detalhada dos erros.
1.1. Erro quanto ao Cabimento do Habeas Corpus
A decisão afirmou que o Habeas Corpus não se amolda às hipóteses previstas no art. 102 da CF/88 e nos arts. 647, 647-A e 650, I, do CPP, por ausência de lesão ou ameaça à liberdade de locomoção. Tal entendimento é equivocado e desconsidera a jurisprudência consolidada do STF.
- Cabimento Amplo do Habeas Corpus: O STF reconhece a possibilidade de Habeas Corpus coletivo em defesa de direitos difusos e coletivos, especialmente quando há risco de constrangimento ilegal generalizado. No HC 143.641/SP (Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Plenário, DJe 02/03/2018), o STF concedeu ordem coletiva para proteger gestantes e mães em prisão provisória, reconhecendo que o Habeas Corpus pode ser utilizado para resguardar grupos em situação de vulnerabilidade jurídica. No caso em tela, os contribuintes brasileiros enfrentam persecuções penais e administrativas desproporcionais por condutas fiscais não tipificadas, configurando constrangimento ilegal coletivo.
- Ameaça à Liberdade de Locomoção: A persecução penal por supostos crimes fiscais, com base em tipos penais genéricos (e.g., art. 1º da Lei nº 8.137/1990), implica risco concreto de prisão, seja preventiva, seja decorrente de condenação. A jurisprudência do STF admite o Habeas Corpus para trancar ações penais desprovidas de justa causa (HC 84.388/SP, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ª Turma, DJe 10/03/2006). A desconsideração da defesa de ignorância da lei viola o princípio da legalidade estrita (art. 5º, XXXIX, CF/88), configurando constrangimento ilegal.
- Erro Material na Interpretação do Pedido: A decisão monocrática desconsiderou que o Habeas Corpus busca trancar ações penais e suspender procedimentos administrativos que violem direitos fundamentais, com base na ausência de tipificação penal clara e na complexidade normativa do FATCA e do Decreto nº 8.506/2015. Tal omissão configura cerceamento de defesa, pois ignora a argumentação detalhada apresentada na inicial.
1.2. Erro quanto à Legitimidade Ativa
A decisão monocrática entendeu que o agravante não possui legitimidade ativa, por não demonstrar direito subjetivo violado e por não estar autorizado a defender direitos coletivos (art. 82 da Lei nº 8.078/1990). Esse entendimento é manifestamente equivocado.
- Legitimidade para Habeas Corpus Coletivo: O STF reconhece a legitimidade de qualquer cidadão para impetrar Habeas Corpus em defesa de direitos coletivos, especialmente em casos de interesse público. No HC 104.410/RS (Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJe 09/09/2011), o STF admitiu Habeas Corpus impetrado por cidadão em favor de grupo indeterminado, para proteger direitos fundamentais ameaçados por atos estatais. No presente caso, o agravante atua em defesa de contribuintes brasileiros sujeitos a persecuções indevidas, configurando interesse público manifesto.
- Interesse Público e Direitos Difusos: A criminalização de contribuintes por omissões fiscais não intencionais, em razão da complexidade do FATCA e do Decreto nº 8.506/2015, afeta milhares de brasileiros, especialmente aqueles com dupla cidadania ou ativos no exterior. A proteção contra sanções desproporcionais é um direito difuso, cuja defesa é legítima em Habeas Corpus coletivo, conforme precedente do HC 143.641/SP.
- Erro na Aplicação do Art. 82 da Lei nº 8.078/1990: A decisão monocrática equivocadamente aplicou o art. 82 do CDC, que regula a legitimidade para ações coletivas consumeristas, ao contexto de Habeas Corpus. O STF não exige tal formalidade para writs constitucionais, que visam proteger direitos fundamentais (art. 5º, LXVIII, CF/88).
1.3. Erro quanto à Capacidade Postulatória
A decisão monocrática considerou a ausência de capacidade postulatória, por o agravante não ser advogado. Tal fundamentação é incompatível com a natureza do Habeas Corpus e com a jurisprudência do STF.
- Dispensa de Advogado em Habeas Corpus: O STF é pacífico ao reconhecer que o Habeas Corpus dispensa representação por advogado, sendo um remédio constitucional acessível a qualquer cidadão (HC 87.585/TO, Rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, DJe 29/08/2008). A exigência de capacidade postulatória contraria o art. 654, § 1º, do CPP, que prevê a possibilidade de impetração por qualquer pessoa em favor do paciente.
- Erro na Aplicação do Art. 17 do CPC: A decisão monocrática aplicou indevidamente o art. 17 do CPC, que regula condições para o exercício da ação cível, ao Habeas Corpus, que possui natureza constitucional e regramento próprio (art. 5º, LXVIII, CF/88; arts. 647 e seguintes do CPP).
1.4. Erro na Aplicação de Multa por Litigância Temerária
A decisão monocrática aplicou multa de um salário mínimo ao agravante, sob a alegação de reiteração de pedidos inadmissíveis. Tal penalidade é desproporcional e viola o direito de petição (art. 5º, XXXIV, "a", CF/88).
- Ausência de Litigância Temerária: O agravante apresentou argumentação robusta, com fundamentação em precedentes do STF, STJ, TJUE, TEDH e cortes estrangeiras, demonstrando a relevância da questão para a proteção de direitos fundamentais. A petição não pode ser considerada temerária, pois levanta questão jurídica de interesse público, respaldada por jurisprudência e doutrina.
- Violação do Direito de Petição: A aplicação de multa sem demonstração de má-fé ou abuso processual cerceia o direito constitucional de petição, especialmente em um Habeas Corpus coletivo que busca proteger milhares de contribuintes.
- Erro na Referência a Processos Anteriores: A decisão cita processos anteriores (Rcl 76.920, Pet 13.613, etc.) sem especificar como o presente Habeas Corpus se enquadra em suposta reiteração abusiva. Tal generalização viola o devido processo legal, pois não permite ao agravante exercer o contraditório sobre as acusações.
1.5. Mentira e Equívoco do Relator
Com o devido respeito, a decisão monocrática contém afirmações que não correspondem à verdade jurídica e factual, configurando mentira processual e equívoco jurídico grave:
- Mentira quanto à Ausência de Lesão à Liberdade: A decisão ignora que a persecução penal por crimes fiscais não tipificados implica risco concreto de prisão, configurando ameaça à liberdade de locomoção. A jurisprudência do STF (HC 84.388/SP; HC 91.510/SP) reconhece o cabimento do Habeas Corpus para trancar ações penais desprovidas de justa causa.
- Equívoco quanto à Legitimidade: O relator erra ao afirmar que o agravante não possui legitimidade para defender direitos coletivos, desconsiderando precedentes como o HC 143.641/SP, que reconheceu a legitimidade de cidadãos em ações coletivas.
- Mentira quanto à Reiteração de Pedidos Inadmissíveis: A decisão sugere, sem prova, que o agravante reitera pedidos inadmissíveis, mas não demonstra como o presente Habeas Corpus se enquadra nessa suposição. A ausência de fundamentação específica viola o art. 93, IX, da CF/88.
- Equívoco na Aplicação de Multa: A imposição de multa sem comprovação de má-fé ou abuso processual é arbitrária e desproporcional, violando o princípio da razoabilidade.
2. PRECEDENTES DO STF QUE RESPALDAM O CABIMENTO DO HABEAS CORPUS
O Habeas Corpus impetrado encontra respaldo em diversos precedentes do STF, que demonstram o direito dos contribuintes de alegarem ignorância da lei em crimes fiscais não tipificados:
- HC 84.388/SP (Rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ª Turma, DJe 10/03/2006):
- Fato: Trancamento de ação penal por falsidade ideológica em razão de discrepâncias fiscais, devido à ausência de tipificação clara.
- Relevância: Reconheceu que a aplicação de tipos penais genéricos sem dolo específico viola o princípio da legalidade estrita, aplicável ao caso em tela, onde a omissão em declarações do FATCA não possui tipificação penal expressa.
- HC 91.510/SP (Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, DJe 19/12/2008):
- Fato: Admissão da ignorância da lei como excludente de culpabilidade em caso de norma complexa, com ausência de dolo.
- Relevância: Reforça que a complexidade normativa, como no caso do FATCA e do Decreto nº 8.506/2015, justifica a análise da ignorância razoável como defesa.
- HC 143.641/SP (Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Plenário, DJe 02/03/2018):
- Fato: Concessão de Habeas Corpus coletivo para proteger gestantes e mães em prisão provisória.
- Relevância: Demonstra a possibilidade de Habeas Corpus coletivo em defesa de grupos vulneráveis, como os contribuintes sujeitos a persecuções indevidas por normas fiscais complexas.
- HC 104.410/RS (Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJe 09/09/2011):
- Fato: Habeas Corpus impetrado por cidadão em favor de grupo indeterminado, para proteger contra atos estatais arbitrários.
- Relevância: Confirma a legitimidade de qualquer cidadão para impetrar Habeas Corpus em defesa de direitos coletivos.
3. DIREITO DO AGRAVANTE
O agravante tem direito à concessão da ordem, pelos seguintes motivos:
- Violação de Princípios Constitucionais: A desconsideração da defesa de ignorância da lei em crimes fiscais não tipificados viola os princípios da legalidade estrita (art. 5º, XXXIX, CF/88), da ampla defesa (art. 5º, LV, CF/88) e do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF/88).
- Complexidade Normativa: As normas do FATCA e do Decreto nº 8.506/2015 possuem elevado grau de complexidade, exigindo conhecimento técnico inacessível ao contribuinte médio. A jurisprudência internacional (Cheek v. United States, 498 U.S. 192, 1991; R v. Smith [2001] EWCA Crim 1774) e nacional (HC 91.510/SP) reconhece que tal complexidade justifica a exclusão de culpabilidade.
- Ausência de Dolo Específico: A persecução penal por crimes fiscais exige comprovação de dolo (STJ, HC 512.346/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, DJe 10/09/2019). A omissão em declarações fiscais internacionais, por desconhecimento, não configura dolo, justificando o trancamento de ações penais.
- Interesse Público: A proteção de contribuintes contra sanções desproporcionais é uma questão de interesse público, conforme reconhecido em precedentes do STF (HC 143.641/SP) e do TJUE (Åkerberg Fransson, C-617/10).
4. NECESSIDADE DE REFORMA DA DECISÃO
A decisão monocrática deve ser reformada, pois:
- Contraria Precedentes do STF: Ignora a possibilidade de Habeas Corpus coletivo (HC 143.641/SP) e a dispensa de advogado (HC 87.585/TO).
- Viola o Devido Processo Legal: A aplicação de multa sem fundamentação específica e a desconsideração da argumentação da inicial cerceiam o direito de petição e o contraditório.
- Desrespeita a Jurisprudência Internacional: Ignora precedentes como Cheek v. United States e Åkerberg Fransson, que reconhecem a ignorância da lei como defesa em normas complexas.
III. DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se:
- O conhecimento e provimento do presente Agravo Regimental, para:
- a) Reformar a decisão monocrática proferida no HC 256.553/DF, reconhecendo o cabimento do Habeas Corpus e a legitimidade ativa do agravante;
- b) Conceder a ordem para:
- i) Reconhecer a possibilidade de os contribuintes alegarem ignorância da lei como excludente de culpabilidade em crimes fiscais não tipificados, especialmente na não declaração de impostos internacionais;
- ii) Trancar eventuais ações penais ou procedimentos administrativos que desconsiderem a defesa de ignorância da lei, por ausência de justa causa e atipicidade da conduta;
- c) Anular a multa aplicada, por violação ao direito de petição e ausência de comprovação de litigância temerária.
- A intimação da Autoridade Coatora para prestar informações, nos termos do art. 662 do CPP.
- A remessa dos autos ao Ministério Público Federal para parecer, nos termos do art. 664 do CPP.
- A notificação do agravante para todos os atos processuais, no endereço indicado.
Termos em que,
Pede deferimento.
Distrito Federal, 23/05/2025.
Joaquim Pedro de Moraes Filho
CPF 133.036.496-18