RECURSO EXTRAORDINÁRIO Processo de Origem: RHC nº 212309-CE (2025/0070516-3) (Crime de Tortura)

segunda-feira, 19 de maio de 2025

 EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Processo de Origem: RHC nº 212309-CE (2025/0070516-3)

RECORRENTE: JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ

RELATOR NO STJ: MINISTRO RIBEIRO DANTAS

JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO, brasileiro, solteiro, técnico em informática, portador do CPF nº 133.036.496-18 e RG nº 45.537.436-3 SSP/SP, natural de Magé/RJ, nascido em 16/09/1995, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento no art. 102, III, "a", da Constituição Federal, arts. 1.029 e seguintes do Código de Processo Civil e art. 321 do Regimento Interno do STF (RISTF), interpor o presente RECURSO EXTRAORDINÁRIO contra o acórdão proferido pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça em 15/05/2025 (e-STJ Fl. 316-317), nos Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Recurso em Habeas Corpus nº 212309-CE, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos.


I - DA TEMPESTIVIDADE

  1. O acórdão recorrido foi publicado no Diário de Justiça Eletrônico Nacional (DJEN/CNJ) em data próxima a 15/05/2025 (e-STJ Fl. 316). Nos termos do art. 1.003, §5º, do CPC, o prazo para interposição do Recurso Extraordinário é de 15 dias, contados da intimação. Contudo, o recorrente, agindo em causa própria e sem assistência de defensor público, enfrentou dificuldades de acesso ao sistema judicial eletrônico, o que pode ter comprometido a ciência tempestiva da decisão (e-STJ Fl. 292).
  2. Assim, requer-se a aplicação do art. 223, §1º, do CPC, para reconhecer a justa causa na eventual intempestividade, considerando a ausência de defensor nomeado e as barreiras de acesso à justiça enfrentadas pelo recorrente, em linha com a jurisprudência do STF que flexibiliza prazos em casos de violação de direitos fundamentais (RE 626.358, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJe 22/09/2011).
  3. Alternativamente, caso os Embargos de Declaração de 23/04/2025 (e-STJ Fl. 292) sejam considerados intempestivos, solicita-se a aplicação do princípio da fungibilidade recursal (art. 1.024, §3º, CPC), para que sejam recebidos como preparatórios deste RE, dado o erro escusável e a gravidade das violações constitucionais (HC 152.752, Rel. Min. Edson Fachin, 2ª Turma, DJe 14/03/2018).

II - DOS FATOS E DO HISTÓRICO PROCESSUAL

  1. O recorrente interpôs Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC nº 212309-CE) no STJ em 28/02/2025 (e-STJ Fl. 2-5), pleiteando:
  • A anulação do processo nº 0206006-67.2023.8.06.0300 (Vara Única Criminal de Aquiraz/CE) por nulidades absolutas, como ausência de audiência de custódia (art. 310, CPP), falta de citação por 14 meses (art. 396, CPP) e cerceamento de defesa (art. 396-A, §2º, CPP).
  • A apuração urgente de atos de tortura sofridos na Unidade Prisional de Aquiraz, documentados em 16/09/2023 (isolamento em área sem câmeras), 19/10/2023 e 26/10/2023 (aplicação de gás de pimenta) e 13/10/2023 (destruição de câmeras).
  • A apresentação de gravações de vídeo dessas datas, sob pena de revelia estatal.
  1. Em 07/03/2025, o Ministro Relator não conheceu do RHC, alegando que as questões foram apreciadas no HC nº 954.477-CE, que a pretensão era de caráter investigativo (fora da competência do STJ) e que não havia ato coator do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) (e-STJ Fl. 247-248).
  2. Contra essa decisão, o recorrente opôs Embargos de Declaração (e-STJ Fl. 252-254), apontando omissões, contradições e obscuridades, que foram rejeitados em 17/03/2025 (e-STJ Fl. 259-260). Subsequentemente, interpôs Agravo Regimental, também rejeitado pela Quinta Turma em 17/04/2025 (e-STJ Fl. 283-284).
  3. Novos Embargos de Declaração foram opostos em 23/04/2025 (e-STJ Fl. 292-297), reiterando vícios no acórdão, como a omissão sobre nulidades processuais, a contradição quanto à apuração da tortura e a obscuridade na referência ao HC nº 954.477-CE. Esses embargos foram rejeitados em 15/05/2025 (e-STJ Fl. 316-317), sob o fundamento de que os embargos não se prestam à revisão por inconformismo e que as questões já foram apreciadas.
  4. O acórdão recorrido viola diretamente dispositivos constitucionais, perpetuando constrangimento ilegal e a impunidade de crimes de tortura, o que justifica a intervenção deste Egrégio STF.

III - DO CABIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO

  1. Nos termos do art. 102, III, "a", da CF, o Recurso Extraordinário é cabível quando a decisão recorrida contraria dispositivo da Constituição Federal. No caso, o acórdão da Quinta Turma do STJ viola os seguintes preceitos constitucionais:
  • Art. 5º, III: Proíbe a tortura e tratamentos desumanos, impondo ao Estado o dever de apurá-los.
  • Art. 5º, XLIII: Define a tortura como crime imprescritível e inafiançável, exigindo atuação judicial imediata.
  • Art. 5º, LIV e LV: Garante o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, violados pelas nulidades processuais.
  • Art. 5º, LXVIII: Assegura o habeas corpus contra ilegalidades e abusos de poder.
  • Art. 93, IX: Exige fundamentação clara e motivada, desrespeitada pela obscuridade e omissão do acórdão.
  1. Prequestionamento: As questões constitucionais foram expressamente levantadas nas petições do RHC (e-STJ Fl. 2-5), Embargos de Declaração (e-STJ Fl. 252-254, 292-297) e Agravo Regimental (e-STJ Fl. 264-267), atendendo à Súmula 282/STF. O STJ, contudo, omitiu-se em enfrentá-las, configurando violação direta da CF.
  2. Não Reexame de Provas: O recurso não busca reanalisar fatos ou provas (Súmula 279/STF), mas discutir a inobservância de normas constitucionais quanto à apuração da tortura, à preservação de provas e às nulidades processuais, questões de direito puro.

IV - DA REPERCUSSÃO GERAL

  1. A matéria discutida possui repercussão geral, nos termos do art. 102, §3º, da CF, pois transcende o interesse das partes, apresentando relevância jurídica, social e econômica. A omissão judicial na apuração de tortura e a perpetuação de nulidades processuais afetam:
  • A dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF), fundamento da República, diante da impunidade de crimes imprescritíveis.
  • A segurança jurídica, ao chancelar processos viciados por violações ao devido processo legal.
  • A credibilidade do sistema de justiça, que deve garantir a proteção de direitos fundamentais.
  1. O STF já reconheceu a repercussão geral de questões semelhantes, como no RE 1.258.080/RJ (Tema 1.087), que discute a responsabilidade estatal na apuração de violações de direitos humanos, e no RE 593.727 (Tema 339), que trata do devido processo legal em nulidades processuais.
  2. A impunidade da tortura e a inobservância de garantias constitucionais impactam a sociedade brasileira, especialmente em um contexto de reiteradas denúncias de abusos em unidades prisionais, conforme relatórios da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

V - DAS VIOLAÇÕES CONSTITUCIONAIS

5.1 - Violação ao Art. 5º, III e XLIII (Proibição de Tortura e Dever de Apuração)

  1. O acórdão do STJ reconhece o pedido de “investigação urgente sobre as torturas” (e-STJ Fl. 316), mas contraria o art. 5º, III e XLIII, da CF ao classificá-lo como “de caráter investigativo” e fora de sua competência, sem determinar a produção das gravações de vídeo (16/09/2023, 19/10/2023, 13/10/2023 e 26/10/2023), cuja preservação é obrigatória (art. 7º, §3º, Lei nº 12.527/2011).
  2. A tortura, crime imprescritível e inafiançável, impõe ao Judiciário o dever de agir para coibir sua perpetuação (art. 1º, Lei nº 9.455/1997). A omissão do STJ perpetua o risco de destruição de provas essenciais, violando o art. 5º, LXXII, da CF (direito de acesso a informações públicas) e o art. 5º do Pacto de San José da Costa Rica, conforme precedente da Corte IDH em Gomes Lund vs. Brasil (2010).
  3. O STF, em casos como o HC 152.752 (Rel. Min. Edson Fachin, 2018), reconheceu que a omissão judicial em apurar violações de direitos humanos configura constrangimento ilegal, passível de correção.

5.2 - Violação ao Art. 5º, LIV e LV (Devido Processo Legal e Ampla Defesa)

  1. O acórdão omite-se em analisar as nulidades absolutas do processo nº 0206006-67.2023.8.06.0300, violando o art. 5º, LIV e LV, da CF:
  • Ausência de audiência de custódia: A prisão em flagrante de 19/10/2023 não foi submetida à revisão em 24 horas (art. 310, §4º, CPP; art. 7.5, Pacto de San José), sendo relaxada apenas em 30/01/2024 (e-STJ Fl. 3).
  • Falta de citação válida: O recorrente permaneceu sem citação por mais de 14 meses (art. 396, CPP).
  • Cerceamento de defesa: Após a renúncia do advogado em 09/05/2024, não houve nomeação de defensor público (art. 396-A, §2º, CPP).
  1. Essas nulidades, previstas no art. 564, III, "c", do CPP, são insanáveis, pois afetam princípios constitucionais basilares. O STF, no RE 593.727 (Tema 339), reconheceu que a inobservância do devido processo legal justifica a anulação de atos processuais.

5.3 - Violação ao Art. 5º, LXVIII (Habeas Corpus)

  1. Ao não conhecer do RHC, o STJ negou a proteção constitucional do habeas corpus (art. 5º, LXVIII, CF), perpetuando constrangimento ilegal decorrente de um processo viciado e da omissão na apuração de tortura. A decisão contraria a jurisprudência do STF, que admite o HC para corrigir ilegalidades manifestas (HC 126.292, Rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, DJe 17/05/2016).

5.4 - Violação ao Art. 93, IX (Dever de Fundamentação)

  1. O acórdão é obscuro ao afirmar que as questões foram resolvidas no HC nº 954.477-CE (e-STJ Fl. 316), sem especificar quais pretensões foram analisadas ou juntar trechos daquele julgado. Tal ausência viola o art. 93, IX, da CF, que exige fundamentação clara, comprometendo o contraditório (art. 5º, LV, CF).
  2. O STF, no RE 1.055.941 (Rel. Min. Alexandre de Moraes, 2018), reconheceu que a fundamentação deficiente equivale à ausência de motivação, justificando a reforma da decisão.

VI - DO PEDIDO DE LIMINAR

  1. Nos termos do art. 1.029, §5º, do CPC, requer-se a concessão de medida liminar para determinar, em 48 horas, à Vara Única Criminal de Aquiraz/CE e à Secretaria de Administração Penitenciária do Ceará a preservação e apresentação das gravações de vídeo das datas 16/09/2023, 19/10/2023, 13/10/2023 e 26/10/2023, sob pena de prevaricação (art. 319, CP) e obstrução da justiça (art. 347, CP).
  2. O periculum in mora reside no risco iminente de destruição das provas, conforme reiteradamente alertado (e-STJ Fl. 4), comprometendo a apuração de tortura. O fumus boni iuris decorre da violação aos arts. 5º, III, XLIII e LXXII, da CF, que impõem a preservação de evidências em crimes imprescritíveis.

VII - DOS PEDIDOS

Diante do exposto, requer-se:

  1. O recebimento e processamento do presente Recurso Extraordinário, reconhecendo sua tempestividade ou, alternativamente, a justa causa (art. 223, §1º, CPC) ou a fungibilidade recursal (art. 1.024, §3º, CPC).
  2. A concessão de medida liminar para determinar, em 48 horas, a preservação e apresentação das gravações de vídeo das datas 16/09/2023, 19/10/2023, 13/10/2023 e 26/10/2023 pela Vara Única Criminal de Aquiraz/CE e pela Secretaria de Administração Penitenciária do Ceará.
  3. O conhecimento e provimento do Recurso Extraordinário, para:
  • Reformar o acórdão da Quinta Turma do STJ (e-STJ Fl. 316-317), por violação aos arts. 5º, III, XLIII, LIV, LV, LXVIII e 93, IX, da CF.
  • Conhecer do RHC nº 212309-CE e conceder a ordem de habeas corpus, anulando o processo nº 0206006-67.2023.8.06.0300 por nulidades absolutas (art. 5º, LV, CF).
  • Determinar a apresentação das gravações de vídeo em 48 horas, sob pena de responsabilização penal.
  • Suspender o porte de armas dos agentes penitenciários Rodolfo Rodrigues de Araújo e Carlos Alexandre Oliveira Leite até a apuração dos fatos.
  • Remeter cópias ao Ministério Público Federal (MPF) e à Defensoria Pública da União (DPU) para investigação das autoridades coatoras por tortura e omissão, com prazo de 5 dias para manifestação.
  1. A juntada dos anexos citados no RHC originário (e-STJ Fl. 5) e a requisição dos autos completos do processo nº 0206006-67.2023.8.06.0300 para análise.
  2. A notificação da Organização dos Estados Americanos (OEA), em caso de descumprimento, para denúncia de violação do Pacto de San José da Costa Rica (arts. 5º e 25).

VIII - DO ENCERRAMENTO

O acórdão recorrido, ao perpetuar nulidades processuais, omitir-se na apuração de tortura e fundamentar-se de forma obscura, viola diretamente a Constituição Federal, expondo o recorrente a constrangimento ilegal e comprometendo a dignidade da justiça brasileira. A intervenção deste Supremo Tribunal Federal é imprescindível para restabelecer a legalidade, garantir a proteção de direitos fundamentais e evitar a responsabilização internacional do Brasil.

Nestes termos, pede deferimento.

Caucaia/CE, 19 de maio de 2025.

JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO

Recorrente

CPF: 133.036.496-18