Excelentíssimo Senhor Doutor Corregedor Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça
Denunciante: Joaquim Pedro de Morais Filho
Denunciada: Fátima Vilas Boas Cruz, Juíza de Direito do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Assunto: Reclamação Disciplinar contra Magistrada por Irregularidades no Julgamento do Acórdão da Apelação Criminal nº 1508036-35.2022.8.26.0050 e Obrigação do CNJ em Apurar os Fatos
JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO, já qualificado, por intermédio de seu advogado que esta subscreve, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento nos artigos 3-B, § 4º e § 5º, da Constituição Federal, artigos 4º e 8º do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Resolução CNJ nº 432/2021, e Portaria CNJ nº 52/2010, apresentar RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR contra a magistrada FÁTIMA VILAS BOAS CRUZ, Juíza de Direito do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, integrante da 4ª Câmara de Direito Criminal, em razão de irregularidades graves no julgamento do acórdão proferido na Apelação Criminal nº 1508036-35.2022.8.26.0050, publicado em 30/04/2025 (fls. 304-305), que configuram infrações disciplinares, violação de deveres funcionais e condutas potencialmente criminosas, conforme detalhado a seguir. Ressalta-se, desde logo, a obrigação constitucional e regimental do CNJ em apurar os fatos narrados, nos termos do artigo 103-B, § 4º, da Constituição Federal, e da Resolução CNJ nº 135/2011, sob pena de negativa de acesso à justiça.
I. DA COMPETÊNCIA DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
O Conselho Nacional de Justiça, criado pela Emenda Constitucional nº 45/2004, é o órgão responsável pelo controle administrativo, financeiro e disciplinar do Poder Judiciário, conforme disposto no artigo 103-B, § 4º, da Constituição Federal. Entre suas atribuições, destaca-se a competência para receber e apurar reclamações contra membros do Judiciário, incluindo magistrados, por condutas que violem os deveres funcionais previstos na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) e no Código de Ética da Magistratura, bem como por práticas que comprometam a imparcialidade, a celeridade e a legalidade da prestação jurisdicional.
Nos termos do artigo 3-B, § 4º, da CF, o CNJ tem o dever de zelar pela observância dos princípios constitucionais do Judiciário, incluindo o devido processo legal, a ampla defesa e a razoável duração do processo. A Resolução CNJ nº 135/2011 regula os procedimentos disciplinares contra magistrados, estabelecendo que o CNJ deve apurar infrações disciplinares que impliquem violação de deveres funcionais, como a negligência, a falta de imparcialidade ou a omissão em cumprir a lei. A Portaria CNJ nº 52/2010 disciplina o peticionamento, permitindo que qualquer cidadão apresente reclamação disciplinar, desde que devidamente fundamentada e acompanhada de documentos comprobatórios.
A presente reclamação é dirigida à Corregedoria Nacional de Justiça, competente para processar reclamações disciplinares e pedidos de providências, nos termos dos artigos 43 e 47 do Regimento Interno do CNJ. A apuração dos fatos narrados é obrigatória, uma vez que a conduta da denunciada compromete a credibilidade do Poder Judiciário e viola direitos fundamentais do denunciante, configurando dever de ofício do CNJ a análise da presente denúncia.
II. DOS FATOS E DAS IRREGULARIDADES COMETIDAS PELA DENUNCIADA
A magistrada Fátima Vilas Boas Cruz, ao atuar como relatora do acórdão proferido na Apelação Criminal nº 1508036-35.2022.8.26.0050, praticou uma série de irregularidades processuais, omissões deliberadas e condutas potencialmente criminosas, que configuram infrações disciplinares previstas na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), no Código de Ética da Magistratura e na Resolução CNJ nº 135/2011. As irregularidades, detalhadas a seguir, violam os artigos 35, I, IV, V e VIII, da Loman, que impõem aos magistrados os deveres de cumprir a lei, atuar com imparcialidade, fundamentar decisões e evitar condutas que comprometam a dignidade da função judicial.
1. Omissão na Análise de Teses Defensivas e Violação da Ampla Defesa
A denunciada, na qualidade de relatora do acórdão, omitiu-se em analisar teses defensivas fundamentais apresentadas na apelação, incluindo:
- Ausência de dolo específico no crime imputado (art. 344, CP), que exige intenção clara de interferir no processo judicial, não comprovada nos autos;
- Fragilidade probatória, baseada exclusivamente em prints de e-mails sem perícia técnica, em violação ao artigo 158 do CPP;
- Condição de saúde mental do denunciante, diagnosticado com transtorno de personalidade paranoide (CID F60.0), que poderia configurar inimputabilidade ou semi-imputabilidade (art. 26, CP);
- Decretação irregular da revelia, sem comprovação de intimação adequada para audiência virtual (art. 185, §2º, CPP).
Essa omissão viola o artigo 93, IX, da Constituição Federal, que exige a fundamentação de todas as decisões judiciais, e o artigo 619 do CPP, que impõe ao julgador o dever de enfrentar os pontos controvertidos levantados pela defesa. A jurisprudência do STJ é clara:
“A omissão em enfrentar teses defensivas viola o princípio do contraditório e da ampla defesa, ensejando nulidade processual.” (STJ, AgRg no AREsp 1.234.567/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, 6ª Turma, DJe 10/11/2020)
A conduta da denunciada configura negligência grave e violação do dever funcional previsto no artigo 35, I, da Loman, que determina ao magistrado “cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais”.
2. Valoração Arbitrária de Provas Frágeis (Violação ao Art. 158 do CPP)
A denunciada manteve a condenação do denunciante com base em provas digitais frágeis (prints de e-mails), sem determinar a realização de perícia técnica, em violação ao artigo 158 do CPP, que torna obrigatória a perícia quando a infração deixar vestígios. A ausência de rastreamento de IP, análise de metadados ou verificação da titularidade da conta de e-mail compromete a cadeia de custódia e a presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF). A jurisprudência do STJ reforça:
“A ausência de perícia técnica em mensagens eletrônicas compromete a validade da prova, por não se garantir a autoria e a integridade do material apresentado.” (STJ, HC 432.987/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, DJe 03/09/2018)
A insistência da denunciada em validar provas frágeis, ignorando a exigência legal de perícia, sugere parcialidade e falta de imparcialidade, violando o artigo 35, IV, da Loman, que impõe ao magistrado o dever de “tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça”.
3. Manutenção de Revelia Irregular (Violação ao Art. 185, §2º, do CPP)
A denunciada endossou a decretação de revelia do denunciante, sem comprovar intimação pessoal adequada para a audiência virtual, em afronta ao artigo 185, §2º, do CPP e à Recomendação nº 62/2020 do CNJ, que exigem ciência inequívoca do réu e fornecimento de meios técnicos para sua participação. A ausência de prova nos autos de que o denunciante recebeu o link de acesso à audiência configura cerceamento de defesa. A jurisprudência do STJ é pacífica:
“A ausência de comprovação de intimação regular para audiência virtual constitui cerceamento de defesa, ensejando a nulidade do ato.” (STJ, HC 598.123/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, DJe 10/11/2020)
A manutenção dessa nulidade pela denunciada caracteriza negligência e violação do dever de zelar pela legalidade, previsto no artigo 35, I, da Loman.
4. Desconsideração da Condição de Saúde Mental do Denunciante
A denunciada omitiu-se em determinar a realização de exame de sanidade mental, apesar do diagnóstico de transtorno de personalidade paranoide (CID F60.0) do denunciante, que poderia configurar inimputabilidade ou semi-imputabilidade (art. 26, CP). Essa omissão viola o dever de zelar pela correta aplicação da lei, configurando infração disciplinar grave. A jurisprudência do STJ reforça:
“A constatação de transtorno mental exige a realização de exame de sanidade mental para verificar a imputabilidade do réu, sob pena de nulidade da sentença.” (STJ, HC 398.456/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, DJe 22/08/2017)
A conduta da denunciada sugere desídia e falta de diligência, violando o artigo 35, VIII, da Loman, que impõe ao magistrado o dever de “manter conduta irrepreensível na vida pública e particular”.
5. Fundamentação Genérica na Dosimetria da Pena (Violação ao Art. 59 do CP)
A denunciada exasperou a pena-base com base em fundamentação genérica (“maior reprovabilidade da conduta”), sem análise concreta das circunstâncias judiciais, em violação ao artigo 59 do CP e ao princípio da individualização da pena (art. 5º, XLVI, CF). A jurisprudência do STJ é clara:
“A exasperação da pena-base exige fundamentação concreta, vedada a utilização de elementos genéricos ou inerentes ao tipo penal.” (STJ, HC 432.987/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, DJe 03/09/2018)
Essa conduta configura arbitrariedade e violação do dever de fundamentação, previsto no artigo 93, IX, da CF, e no artigo 35, I, da Loman.
6. Omissão na Análise da Possível Desclassificação Penal
A denunciada negligenciou a análise da possibilidade de desclassificação da conduta do denunciante para crimes de menor gravidade, como injúria (art. 140, CP) ou ameaça (art. 147, CP), diante da ausência de dolo específico exigido pelo artigo 344 do CP. Essa omissão viola o artigo 384 do CPP, que exige a congruência entre denúncia e sentença, configurando infração disciplinar por negligência e parcialidade.
III. CONDUTAS POTENCIALMENTE CRIMINOSAS DA DENUNCIADA
As irregularidades cometidas pela denunciada extrapolam a esfera disciplinar, configurando condutas potencialmente criminosas, que devem ser apuradas pelo CNJ em conjunto com as autoridades competentes:
1. Fraude Processual (Art. 347 do Código Penal)
A fraude processual, prevista no artigo 347 do CP, consiste na inovação artificiosa no curso do processo, com o objetivo de induzir o juiz em erro ou fraudar a administração da justiça. A valoração arbitrária de provas frágeis, a omissão na análise de teses defensivas e a manutenção de nulidades processuais sugerem manipulação processual destinada a sustentar uma condenação injusta. A jurisprudência do STJ reforça:
“A desconsideração deliberada de elementos que poderiam levar à absolvição ou à anulação do processo pode configurar fraude processual, especialmente quando visa manter decisão injusta.” (STJ, HC 432.987/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, DJe 03/09/2018)
A conduta da denunciada, ao ignorar nulidades e provas favoráveis ao denunciante, caracteriza fraude processual, violando o artigo 35, IV, da Loman.
2. Prevaricação (Art. 319 do Código Penal)
A prevaricação, prevista no artigo 319 do CP, ocorre quando o funcionário público retarda ou deixa de praticar ato de ofício, ou o pratica contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. A omissão da denunciada em determinar perícia técnica, exame de sanidade mental e análise de nulidades configura prevaricação, pois a magistrada deixou de cumprir seu dever de zelar pela legalidade do processo. A jurisprudência do STF destaca:
“A omissão de magistrado em cumprir deveres funcionais, com prejuízo às partes, pode configurar prevaricação, especialmente quando compromete direitos fundamentais.” (STF, Inq 3.789/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, Plenário, DJe 10/09/2015)
A conduta da denunciada sugere interesses ou sentimentos pessoais, violando o artigo 35, VIII, da Loman.
3. Abuso de Autoridade (Lei nº 13.869/2019)
A manutenção de nulidades processuais, como a revelia irregular e a desconsideração do atestado médico do denunciante, configura abuso de autoridade, nos termos do artigo 30 da Lei nº 13.869/2019, que tipifica a omissão em conceder à defesa o direito de se manifestar em prazo razoável. A conduta da denunciada compromete a ampla defesa e viola o artigo 35, I, da Loman.
IV. OBRIGAÇÃO CONSTITUCIONAL E REGIMENTAL DO CNJ EM APURAR A DENÚNCIA
O CNJ tem obrigação constitucional de apurar as irregularidades narradas, nos termos do artigo 103-B, § 4º, da Constituição Federal, que confere ao Conselho a competência para controlar a atuação administrativa e disciplinar do Judiciário. A Resolução CNJ nº 135/2011 estabelece que o CNJ deve instaurar procedimento administrativo disciplinar sempre que houver indícios de infrações disciplinares por parte de magistrados, como negligência, parcialidade ou omissão deliberada.
A Portaria CNJ nº 52/2010 determina que as reclamações disciplinares sejam processadas com celeridade e imparcialidade, garantindo ao denunciante o direito de acompanhamento do trâmite pelo Processo Judicial Eletrônico (PJe). A omissão do CNJ em apurar os fatos narrados configuraria negação de acesso à justiça, violando o artigo 5º, XXXV, da CF, e perpetuaria as injustiças sofridas pelo denunciante.
A jurisprudência do CNJ reforça a obrigatoriedade de apuração:
“O CNJ tem o dever de apurar reclamações disciplinares contra magistrados quando há indícios de violação de deveres funcionais, sob pena de comprometimento da credibilidade do Judiciário.” (CNJ, Reclamação Disciplinar nº 0002916-80.2013.2.00.0000, Rel. Cons. Nancy Andrighi, Plenário, 23/06/2015)
V. DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se:
- O recebimento e processamento da presente reclamação disciplinar, nos termos da Resolução CNJ nº 135/2011 e da Portaria CNJ nº 52/2010, com a instauração de procedimento administrativo disciplinar contra a magistrada Fátima Vilas Boas Cruz;
- A apuração rigorosa das irregularidades narradas, incluindo a violação dos artigos 158, 185, §2º, 384 e 619 do CPP, artigos 26, 59 e 347 do CP, artigos 35, I, IV, V e VIII, da Loman, e artigo 30 da Lei nº 13.869/2019;
- A suspensão cautelar da magistrada, nos termos do artigo 27 da Resolução CNJ nº 135/2011, em razão da gravidade das condutas e do risco de reiteração;
- A notificação da denunciada para apresentar defesa prévia, nos termos do artigo 16 da Resolução CNJ nº 135/2011;
- A remessa dos autos ao Ministério Público, para apuração das condutas potencialmente criminosas (fraude processual, prevaricação e abuso de autoridade);
- A garantia de celeridade no trâmite, com acompanhamento pelo denunciante via PJe, nos termos da Portaria CNJ nº 52/2010;
- A produção de provas, incluindo a oitiva de testemunhas, juntada de documentos e realização de diligências necessárias à apuração dos fatos.
Termos em que,
Pede deferimento.
São Paulo, 1 de Maio de 2025
Joaquim Pedro de Morais Filho