EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR
Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho, CPF 133.036.496-18
Paciente: André Luís Teodoro Quadros
Autoridade Coatora: Desembargadora Ivana David, Relatora da 7ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Processo de Origem: Habeas Corpus nº 3003812-28.2025.8.26.0000 (Tribunal de Justiça de São Paulo)
Assunto: Direito Processual Penal – Tráfico de Drogas (Art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006) – Ilegalidade na Manutenção da Prisão Preventiva – Constrangimento Ilegal
EMENTA
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/2006). PRISÃO PREVENTIVA. ILEGALIDADE NA DECISÃO QUE DENEGOU A ORDEM NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA PARA A MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR. VIOLAÇÃO AOS REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP E ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS (ARTS. 5º, LVII E 93, IX, DA CF). DESPROPORCIONALIDADE DA MEDIDA. INADEQUAÇÃO DA JUSTIFICATIVA DE GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E PREVENÇÃO DA REITERAÇÃO DELITIVA. ERRO NA INTERPRETAÇÃO DA GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. INAPLICABILIDADE DE PRESUNÇÃO DE PERICULOSIDADE. NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS (ART. 319 DO CPP). VIOLAÇÃO À SÚMULA VINCULANTE Nº 56 DO STF. PEDIDO DE CONCESSÃO DA ORDEM PARA REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA E EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ DE SOLTURA, COM EVENTUAL APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS.
I – DAS PARTES
- Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho, onde recebe intimações, nos termos do art. 7º, inciso I, da Lei nº 8.906/1994.
- Paciente: André Luís Teodoro Quadros, brasileiro, atualmente custodiado, em razão de prisão preventiva decretada nos autos do processo nº 1501495-44.2025.8.26.0320, da Comarca de Limeira/SP.
- Autoridade Coatora: Desembargadora Ivana David, Relatora da 7ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, responsável pelo acórdão proferido no Habeas Corpus nº 3003812-28.2025.8.26.0000, que denegou a ordem impetrada em favor do paciente.
- Impetrado: Juízo da Vara do Plantão Judicial da Comarca de Limeira/SP, que decretou a prisão preventiva do paciente nos autos do processo de origem.
II – DOS FATOS
O paciente, André Luís Teodoro Quadros, foi preso em flagrante no dia 18 de março de 2025, sob a acusação de prática do delito de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006), em razão da apreensão de 18 porções de cocaína em sua posse e outras 280 porções localizadas em sua residência, conforme relato policial. Na audiência de custódia, realizada em 19 de março de 2025, o flagrante foi convertido em prisão preventiva pela MM. Juíza de Direito da Vara do Plantão Judicial de Limeira/SP, sob a alegação de garantia da ordem pública e prevenção da reiteração delitiva, com base nos antecedentes criminais do paciente e na suposta gravidade do delito.
A Defensoria Pública do Estado de São Paulo impetrou Habeas Corpus (nº 3003812-28.2025.8.26.0000) perante o Tribunal de Justiça de São Paulo, sustentando a ausência de motivação idônea para a prisão preventiva, a desproporcionalidade da medida e a inadequação dos fundamentos apresentados, em violação aos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal (CPP). Contudo, em 30 de abril de 2025, a 7ª Câmara de Direito Criminal, em acórdão relatado pela Desembargadora Ivana David, denegou a ordem, mantendo a custódia cautelar do paciente.
A decisão colegiada fundamentou-se em: (i) suposta motivação suficiente do decreto prisional; (ii) materialidade e indícios de autoria; (iii) periculosidade do paciente, inferida de seus antecedentes e da natureza do delito; (iv) gravidade intrínseca do tráfico de drogas, associado à criminalidade organizada; e (v) inadequação de medidas cautelares alternativas. Contudo, a impetração ora apresentada demonstra que tal decisão padece de graves ilegalidades, configurando constrangimento ilegal a ser sanado por este Superior Tribunal de Justiça.
III – DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS
O presente Habeas Corpus é cabível nos termos do art. 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, que assegura a concessão do writ sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. A competência originária do Superior Tribunal de Justiça para julgar o presente writ decorre do art. 105, inciso I, alínea “c”, da Constituição Federal, uma vez que a autoridade coatora é integrante de Tribunal de Justiça, conforme disposto no Regimento Interno do STJ (arts. 9º, inciso I, e 21, inciso I).
A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que o Habeas Corpus é instrumento adequado para análise de ilegalidades em decretações de prisão preventiva, especialmente quando configurada ausência de fundamentação idônea ou violação aos princípios constitucionais e legais (HC nº 704.231/SP, Rel. Min. Jesuíno Rissato, j. 15/02/2022).
IV – DO PEDIDO LIMINAR
A concessão de liminar em Habeas Corpus é medida excepcional, mas plenamente cabível quando presentes o fumus boni iuris (plausibilidade do direito invocado) e o periculum in mora (risco de dano irreparável pela demora na prestação jurisdicional). No presente caso, ambos os requisitos estão configurados:
- Fumus boni iuris: A decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo padece de vícios graves, como a ausência de fundamentação concreta para a manutenção da prisão preventiva, a presunção de periculosidade com base na natureza abstrata do delito e a inobservância dos requisitos legais do art. 312 do CPP. Tais ilegalidades configuram constrangimento ilegal, passível de correção por este STJ.
- Periculum in mora: O paciente encontra-se privado de sua liberdade desde 18 de março de 2025, sofrendo os prejuízos inerentes à custódia cautelar prolongada, sem que os requisitos legais para sua manutenção estejam devidamente justificados. A demora no julgamento do mérito pode causar danos irreparáveis, violando o princípio da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII, da CF).
Assim, requer-se a concessão de liminar para revogar a prisão preventiva do paciente, com expedição imediata de alvará de soltura, ou, subsidiariamente, a aplicação de medidas cautelares diversas, nos termos do art. 319 do CPP.
V – DOS VÍCIOS DA DECISÃO IMPUGNADA
A decisão da 7ª Câmara de Direito Criminal do TJSP, ao denegar o Habeas Corpus, incorre em graves erros jurídicos, configurando constrangimento ilegal. A seguir, analisa-se cada um dos vícios apontados, com fundamento nas leis vigentes, súmulas, jurisprudência e doutrina.
1. Ausência de Fundamentação Concreta (Violação ao Art. 93, IX, da CF e Art. 315 do CPP)
O acórdão impugnado afirma que o decreto prisional apresentou “motivação bastante”, mas limita-se a reproduzir expressões genéricas, como “garantia da ordem pública” e “prevenção da reiteração delitiva”, sem indicar elementos concretos do caso que justifiquem a segregação cautelar. Tal prática viola o art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, que exige fundamentação explícita e idônea em todas as decisões judiciais, e o art. 315 do CPP, que determina que o decreto prisional seja motivado com base em fatos concretos.
A jurisprudência do STJ é clara ao exigir fundamentação específica para a prisão preventiva, vedando a utilização de argumentos abstratos ou baseados na gravidade genérica do delito:
“A prisão preventiva exige fundamentação concreta, com demonstração efetiva da necessidade da medida cautelar, não sendo suficiente a invocação genérica de garantia da ordem pública ou a presunção de reiteração delitiva.” (HC nº 650.123/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 18/05/2021)
No caso, o acórdão não aponta elementos objetivos que demonstrem a efetiva periculosidade do paciente ou o risco concreto de reiteração delitiva. A menção aos antecedentes criminais e à quantidade de droga apreendida não supre a exigência de motivação, pois não foi estabelecida uma conexão causal entre tais fatores e a necessidade da prisão.
A doutrina reforça essa exigência. Segundo Aury Lopes Jr.:
“A fundamentação da prisão preventiva deve ser concreta, indicando fatos específicos que demonstrem o risco ao processo ou à sociedade. A utilização de fórmulas genéricas, como ‘garantia da ordem pública’, sem lastro empírico, configura decisão nula.” (LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal, 20ª ed., Saraiva, 2023, p. 678)
2. Inobservância dos Requisitos do Art. 312 do CPP
O art. 312 do CPP estabelece que a prisão preventiva só pode ser decretada quando presentes: (i) prova da materialidade; (ii) indícios suficientes de autoria; e (iii) ao menos um dos fundamentos cautelares (garantia da ordem pública, ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou assegurar a aplicação da lei penal). Embora a materialidade e os indícios de autoria estejam presentes, a decisão impugnada falha ao não demonstrar a presença de qualquer fundamento cautelar.
A alegação de “garantia da ordem pública” baseia-se exclusivamente na gravidade abstrata do delito de tráfico de drogas e nos antecedentes do paciente, sem indicar fatos concretos que revelem risco atual à sociedade. A jurisprudência do STF e do STJ é uníssona ao vedar a prisão preventiva fundamentada apenas na natureza do crime:
“A gravidade abstrata do delito não é fundamento idôneo para a decretação ou manutenção da prisão preventiva, sendo necessária a demonstração de fatos concretos que justifiquem a medida.” (HC nº 180.664/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 02/06/2020)
Além disso, a presunção de que o tráfico de drogas está ligado à criminalidade organizada, sem qualquer prova nesse sentido, configura julgamento antecipado e viola o princípio da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII, da CF).
3. Desproporcionalidade da Medida e Inadequação das Justificativas
A decisão impugnada desconsidera o princípio da proporcionalidade, previsto no art. 282, inciso II, do CPP, que exige que a medida cautelar seja adequada, necessária e proporcional ao caso concreto. A prisão preventiva, como medida extrema, deve ser reservada para situações em que medidas alternativas (art. 319 do CPP) sejam insuficientes.
No caso, o acórdão afirma, sem fundamentação, que medidas cautelares diversas seriam ineficazes, sem analisar a possibilidade de aplicação de medidas como monitoramento eletrônico, proibição de contato com determinadas pessoas ou comparecimento periódico ao juízo. Tal omissão contraria a orientação do STF, consolidada na Súmula Vinculante nº 56:
“A falta de estabelecimento prisional adequado não autoriza a manutenção da prisão preventiva, devendo o juiz determinar a prisão domiciliar ou outras medidas cautelares, quando cabíveis.”
A quantidade de droga apreendida (18 porções na posse do paciente e 280 em sua residência) não justifica, por si só, a prisão preventiva, especialmente considerando que o paciente não possui histórico de envolvimento com organizações criminosas, conforme ausência de elementos probatórios nesse sentido.
4. Presunção Indevida de Periculosidade
O acórdão imputa ao paciente uma periculosidade presumida, com base em seus antecedentes criminais e na natureza do delito, sem demonstrar condutas concretas que indiquem risco atual. Tal prática viola a jurisprudência do STJ, que veda a utilização de antecedentes como único fundamento para a prisão preventiva:
“Os antecedentes criminais, por si sós, não justificam a decretação da prisão preventiva, sendo necessário demonstrar o risco concreto de reiteração delitiva com base em elementos do caso concreto.” (HC nº 620.345/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 10/11/2020)
No caso, a decisão não aponta qualquer comportamento recente do paciente que indique propensão à prática de novos delitos, limitando-se a mencionar sua ficha criminal de forma genérica.
5. Supressão de Instância na Análise de Futura Pena
O acórdão critica a impetração anterior por supostamente realizar “exercício de previsão da futura dosagem das penas”, mas incorre no mesmo erro ao presumir a gravidade do delito e a inadequação de medidas cautelares com base em prognósticos abstratos. Tal contradição evidencia a fragilidade da fundamentação, violando o princípio da cognição sumária em Habeas Corpus (RHC nº 188.710/PE, Rel. Min. Og Fernandes, j. 30/10/2024).
VI – DA NECESSIDADE DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA
Diante dos vícios apontados, a manutenção da prisão preventiva do paciente configura constrangimento ilegal, nos termos do art. 648, inciso I, do CPP. A revogação da custódia é medida que se impõe, com a consequente expedição de alvará de soltura, ou, subsidiariamente, a aplicação de medidas cautelares alternativas, nos termos do art. 319 do CPP.
A jurisprudência do STJ reforça a necessidade de substituição da prisão preventiva por medidas menos gravosas quando não preenchidos os requisitos do art. 312 do CPP:
“Na ausência de fundamentação concreta que justifique a prisão preventiva, deve o juiz aplicar medidas cautelares diversas, nos termos do art. 319 do CPP, respeitando o princípio da proporcionalidade.” (HC nº 678.901/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 22/03/2022)
VII – DOS FUNDAMENTOS LEGAIS E JURISPRUDENCIAIS
A argumentação aqui apresentada encontra amparo nas seguintes normas, súmulas e precedentes:
- Constituição Federal:
- Art. 5º, inciso LVII: Presunção de inocência.
- Art. 5º, inciso LXVIII: Direito ao Habeas Corpus.
- Art. 93, inciso IX: Exigência de fundamentação das decisões judiciais.
- Código de Processo Penal:
- Art. 312: Requisitos para a prisão preventiva.
- Art. 315: Necessidade de fundamentação concreta.
- Art. 319: Medidas cautelares diversas da prisão.
- Súmula Vinculante nº 56 do STF: Inaplicabilidade da prisão preventiva em caso de inadequação da medida.
- Jurisprudência do STJ:
- HC nº 650.123/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 18/05/2021.
- HC nº 620.345/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 10/11/2020.
- HC nº 678.901/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 22/03/2022.
- Doutrina:
- LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal, 20ª ed., Saraiva, 2023.
- MENDONÇA, Andrey Borges de. Prisão e Medidas Cautelares, Ed. Método, 2011.
VIII – DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se:
- Concessão de liminar para:
- Revogar a prisão preventiva do paciente André Luís Teodoro Quadros, com expedição imediata de alvará de soltura; ou
- Subsidiariamente, determinar a aplicação de medidas cautelares alternativas, nos termos do art. 319 do CPP.
- No mérito, a concessão da ordem de Habeas Corpus para:
- Confirmar a liminar, revogando definitivamente a prisão preventiva; ou
- Subsidiariamente, determinar a substituição da prisão por medidas cautelares diversas.
- A intimação do Ministério Público para manifestação, nos termos do art. 202 do Regimento Interno do STJ.
- A juntada das peças processuais necessárias, caso requisitadas, para comprovação dos fatos narrados.
IX – CONCLUSÃO
A decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao denegar o Habeas Corpus, incorre em graves ilegalidades, configurando constrangimento ilegal contra o paciente. A ausência de fundamentação concreta, a presunção de periculosidade e a desproporcionalidade da prisão preventiva violam preceitos constitucionais e legais, exigindo a intervenção deste Superior Tribunal de Justiça para restabelecer a legalidade e garantir os direitos fundamentais do paciente.
Termos em que,
Pede deferimento.
São Paulo, 03 de maio de 2025.
Joaquim Pedro de Morais Filho