HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR Paciente: Letícia Gabriele Pedronetti | STJ 10101428

sábado, 3 de maio de 2025

 EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR

Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho, CPF: 133.036.496-18

Paciente: Letícia Gabriele Pedronetti

Autoridade Coatora: Desembargadora Ana Lúcia Fernandes Queiroga, Relatora da 9ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Processo de Origem: Habeas Corpus nº 3004497-35.2025.8.26.0000, oriundo do Processo nº 1500276-93.2025.8.26.0320, da 3ª Vara Criminal da Comarca de Limeira/SP

Assunto: Tráfico de Entorpecentes – Ilegalidade da Prisão Preventiva – Constrangimento Ilegal – Revogação da Prisão ou Substituição por Medidas Cautelares Alternativas


EMENTA

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO PREVENTIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E DA PROPORCIONALIDADE. INAPLICABILIDADE AUTOMÁTICA DO ART. 313, I, DO CPP. QUANTIDADE DE DROGA REDUZIDA E CIRCUNSTÂNCIAS PESSOAIS FAVORÁVEIS. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS (ART. 319, CPP). SÚMULAS 593 E 604 DO STJ. PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA OU, SUBSIDIARIAMENTE, SUBSTITUIÇÃO POR MEDIDAS CAUTELARES.


I. DOS FATOS E DA IMPETRAÇÃO

O impetrante, Joaquim Pedro de Morais Filho, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, impetrar o presente Habeas Corpus em favor da paciente Letícia Gabriele Pedronetti, com fundamento nos artigos 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, 647 e seguintes do Código de Processo Penal (CPP), e no Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (RISTJ), em face da decisão proferida pela 9ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que denegou a ordem no Habeas Corpus nº 3004497-35.2025.8.26.0000, mantendo a prisão preventiva da paciente, decretada nos autos do processo nº 1500276-93.2025.8.26.0320, da 3ª Vara Criminal da Comarca de Limeira/SP.

A paciente foi presa em flagrante em 22 de janeiro de 2025, pela suposta prática do crime de tráfico de entorpecentes (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006). A prisão em flagrante foi convertida em preventiva, sob a alegação de garantia da ordem pública, com base na gravidade do delito, na quantidade de droga apreendida, na suposta recalcitrância da paciente e na ausência de comprovação de atividade lícita. O Tribunal de Justiça de São Paulo, ao julgar o Habeas Corpus impetrado pela Defensoria Pública, denegou a ordem, mantendo a custódia cautelar.

O presente writ visa sanar o constrangimento ilegal imposto à paciente, decorrente de erros jurídicos na decisão impugnada, que violam princípios constitucionais e legais, bem como jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF). A prisão preventiva carece de fundamentação idônea, sendo desproporcional e desnecessária, especialmente diante das circunstâncias do caso concreto, que apontam para a possibilidade de aplicação de medidas cautelares alternativas (art. 319, CPP).


II. DAS PARTES

  • Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho
  • Paciente: Letícia Gabriele Pedronetti, brasileira, atualmente custodiada.
  • Autoridade Coatora: Desembargadora Ana Lúcia Fernandes Queiroga, Relatora da 9ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, responsável pela decisão que denegou o Habeas Corpus nº 3004497-35.2025.8.26.0000.

III. DOS ERROS JURÍDICOS NA DECISÃO IMPUGNADA

A decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo padece de vícios jurídicos graves, configurando constrangimento ilegal, conforme detalhado abaixo:

1. Ausência de Fundamentação Idônea da Prisão Preventiva (Art. 312, CPP)

A decretação e manutenção da prisão preventiva da paciente violam o artigo 312 do CPP, que exige a demonstração concreta do fumus commissi delicti (prova da materialidade e indícios suficientes de autoria) e do periculum libertatis (risco concreto à ordem pública, ordem econômica, instrução criminal ou aplicação da lei penal). A decisão impugnada fundamenta-se em elementos genéricos e abstratos, sem indicar fatos concretos que justifiquem a segregação cautelar.

A relatora afirma que a prisão é necessária para a garantia da ordem pública, com base na gravidade concreta do delito, na nocividade do entorpecente, na apreensão de petrechos e na recalcitrância da paciente no meio criminoso. Contudo, tais fundamentos não se sustentam à luz da legislação vigente e da jurisprudência do STJ:

  • Gravidade Abstrata do Delito: A decisão utiliza a natureza do crime de tráfico de entorpecentes como fundamento principal, o que contraria a Súmula 593 do STJ: "A prisão preventiva não pode ser decretada com base apenas na gravidade abstrata do crime." A menção à "nocividade do entorpecente" e ao "potencial viciante da cocaína" constitui argumentação genérica, aplicável a qualquer caso de tráfico, sem individualização da conduta da paciente.
  • Quantidade de Droga Apreendida: A decisão destaca a apreensão de 2,76g de cocaína e 1,89g de crack, totalizando 4,65g de entorpecentes, divididos em 15 porções. Contudo, a quantidade é reduzida, compatível com a figura do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006), que reduz a pena para 1/6 a 2/3, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique à atividade criminosa nem integre organização criminosa. A jurisprudência do STJ reconhece que pequenas quantidades de droga não justificam, por si só, a prisão preventiva (HC 759.375/MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, j. 11/10/2022).
  • Apreensão de Petrechos: A menção a um liquidificador com resquícios de droga e a dinheiro em espécie (R$ 369,00) não configura prova robusta de dedicação ao tráfico, especialmente sem análise pericial conclusiva que vincule tais itens à atividade ilícita. A jurisprudência do STF exige elementos concretos para justificar a segregação cautelar, não bastando presunções (HC 185.097/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, j. 08/09/2020).
  • Suposta Recalcitrância: A decisão aponta uma denúncia recente (17/01/2025) por tráfico de drogas como indício de reiteração delitiva. Contudo, a paciente é tecnicamente primária, não havendo condenação transitada em julgado. A mera existência de outra ação penal em curso não pode ser utilizada como fundamento para a prisão preventiva, sob pena de violação ao princípio da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF). Nesse sentido, o STJ já decidiu: "A existência de inquéritos ou ações penais em curso não pode ser utilizada como fundamento para a prisão preventiva, salvo se houver demonstração concreta de reiteração delitiva" (HC 771.854/ES, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, 6ª Turma, j. 06/03/2023).

2. Violação ao Princípio da Proporcionalidade

A manutenção da prisão preventiva é desproporcional, considerando as circunstâncias do caso concreto. A paciente é primária, possui residência fixa (conforme alegado pela defesa) e não há indícios de envolvimento com organizações criminosas ou de prática de violência. A decisão desconsidera a possibilidade de aplicação de medidas cautelares alternativas (art. 319, CPP), como comparecimento periódico ao juízo, proibição de frequentar determinados locais ou monitoramento eletrônico, que seriam suficientes para resguardar a ordem pública.

O STF tem reiteradamente afirmado que a prisão preventiva é medida excepcional, devendo ser substituída por medidas menos gravosas sempre que possível (HC 188.888/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, 2ª Turma, j. 15/12/2020). A ausência de análise fundamentada sobre a inadequação das medidas cautelares viola o artigo 282, § 4º, do CPP, que determina a substituição da prisão por medidas alternativas quando estas forem suficientes.

3. Inaplicabilidade Automática do Art. 313, I, do CPP

A decisão de conversão da prisão em flagrante em preventiva baseia-se no artigo 313, inciso I, do CPP, que autoriza a custódia cautelar em crimes com pena superior a 4 anos. Contudo, a aplicação automática desse dispositivo, sem demonstração do periculum libertatis, é inconstitucional, pois viola o princípio da presunção de inocência (art. 5º, LXI, CF). A Súmula 604 do STJ é clara: "A prisão preventiva não pode ser decretada com base apenas na gravidade abstrata do crime ou na pena cominada."

No caso, a decisão não aponta elementos concretos que demonstrem risco à ordem pública, limitando-se a presunções baseadas na natureza do delito e na quantidade de droga apreendida, que, como já mencionado, é reduzida.

4. Desrespeito à Jurisprudência do STJ e do STF

A decisão impugnada contraria precedentes vinculantes do STJ e do STF, que exigem fundamentação concreta para a prisão preventiva. Exemplos:

  • STJ, HC 759.375/MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, j. 11/10/2022: "A quantidade de droga apreendida, por si só, não justifica a prisão preventiva, sendo necessário demonstrar o risco concreto à ordem pública."
  • STF, HC 185.097/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, j. 08/09/2020: "A prisão preventiva deve ser fundamentada em elementos concretos que demonstrem a necessidade da medida, sob pena de configurar constrangimento ilegal."

Além disso, a decisão desconsidera a possibilidade de aplicação do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006), que, embora não seja analisável no mérito nesta fase, reforça a desproporcionalidade da prisão preventiva, dado o prognóstico de pena reduzida.

5. Ausência de Análise das Condições Pessoais da Paciente

A decisão desvaloriza as condições pessoais favoráveis da paciente, como a primariedade e a residência fixa, alegando que tais fatores não são suficientes para a concessão da liberdade provisória. Contudo, a jurisprudência do STJ reconhece que condições pessoais favoráveis, aliadas à ausência de risco concreto, justificam a revogação da prisão preventiva (HC 880.186/SP, Rel. Min. Jesuíno Rissato, 6ª Turma, j. 24/06/2024).

A ausência de comprovação de atividade lícita, mencionada na decisão, não pode ser utilizada como fundamento para a segregação, pois inverte o ônus da prova e viola o princípio da presunção de inocência. Nesse sentido, o STF já decidiu: "A ausência de comprovação de ocupação lícita não pode ser utilizada como fundamento para a prisão preventiva, sob pena de violação ao princípio da presunção de inocência" (HC 190.345/SP, Rel. Min. Edson Fachin, 2ª Turma, j. 02/03/2021).


IV. DO DIREITO

1. Princípios Constitucionais Violados

  • Presunção de Inocência (Art. 5º, LVII, CF): A prisão preventiva, ao se basear em presunções e na gravidade abstrata do delito, antecipa a pena, violando o princípio da presunção de inocência.
  • Proporcionalidade (Art. 5º, LIV, CF): A segregação cautelar é desproporcional, pois medidas menos gravosas seriam suficientes para resguardar a ordem pública.
  • Liberdade Provisória (Art. 5º, LXVI, CF): A paciente tem direito à liberdade provisória, com ou sem medidas cautelares, diante da ausência de risco concreto.

2. Disposições Legais Aplicáveis

  • Art. 312, CPP: A prisão preventiva exige fundamentação concreta, com demonstração do fumus commissi delicti e do periculum libertatis.
  • Art. 313, CPP: A pena superior a 4 anos não autoriza automaticamente a prisão preventiva, sendo necessária a demonstração de risco concreto.
  • Art. 319, CPP: As medidas cautelares alternativas, como comparecimento periódico ao juízo e monitoramento eletrônico, são suficientes no caso concreto.
  • Art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006: A pequena quantidade de droga e as condições pessoais da paciente indicam a possibilidade de aplicação do tráfico privilegiado, reforçando a desproporcionalidade da prisão.

3. Jurisprudência e Súmulas

  • Súmula 593, STJ: Proíbe a decretação da prisão preventiva com base apenas na gravidade abstrata do crime.
  • Súmula 604, STJ: Vedada a prisão preventiva fundada exclusivamente na pena cominada.
  • HC 759.375/MS, STJ: A quantidade de droga, por si só, não justifica a prisão preventiva.
  • HC 185.097/SP, STF: A prisão preventiva exige fundamentação concreta.

4. Doutrina

Conforme ensina Aury Lopes Jr. (Direito Processual Penal, 20ª ed., São Paulo: Saraiva, 2023, p. 789), a prisão preventiva é medida excepcional, devendo ser fundamentada em elementos concretos que demonstrem a necessidade da segregação. A ausência de individualização da conduta do réu, com base em presunções, configura constrangimento ilegal.

Guilherme de Souza Nucci (Código de Processo Penal Comentado, 19ª ed., São Paulo: Forense, 2023, p. 672) destaca que a análise da adequação de medidas cautelares alternativas é obrigatória, sendo a prisão preventiva a última ratio no sistema processual penal.


V. DO PEDIDO LIMINAR

Diante do constrangimento ilegal configurado, requer-se a concessão de liminar para:

  1. Revogar a prisão preventiva da paciente Letícia Gabriele Pedronetti, com a concessão da liberdade provisória, nos termos do artigo 5º, LXVI, da CF, e artigo 310, III, do CPP; ou, subsidiariamente,
  2. Substituir a prisão preventiva por medidas cautelares alternativas previstas no artigo 319 do CPP, como comparecimento periódico ao juízo, proibição de frequentar determinados locais e/ou monitoramento eletrônico, conforme artigo 282, § 4º, do CPP.

A liminar é cabível ante a presença do fumus boni iuris, evidenciado pelos erros jurídicos na decisão impugnada, e do periculum in mora, decorrente da manutenção da paciente em custódia desnecessária, causando prejuízo irreparável à sua liberdade.

Nos termos do artigo 210 do RISTJ, o pedido liminar é processado com prioridade, especialmente em casos de privação de liberdade.


VI. DO MÉRITO

No mérito, requer-se a confirmação da liminar para:

  1. Conceder a ordem de Habeas Corpus, revogando a prisão preventiva da paciente, com a concessão da liberdade provisória; ou, subsidiariamente,
  2. Substituir a prisão preventiva por medidas cautelares alternativas, nos termos do artigo 319 do CPP.

VII. DOS PEDIDOS

Diante do exposto, requer-se:

  1. A concessão de liminar para revogar a prisão preventiva da paciente Letícia Gabriele Pedronetti ou, subsidiariamente, substitui-la por medidas cautelares alternativas (art. 319, CPP);
  2. A notificação da autoridade coatora para prestar informações, nos termos do artigo 662 do CPP;
  3. A intimação do Ministério Público para manifestação;
  4. No mérito, a concessão da ordem de Habeas Corpus para revogar a prisão preventiva ou, subsidiariamente, substituí-la por medidas cautelares alternativas;
  5. A expedição de alvará de soltura em favor da paciente, caso deferida a revogação da prisão.

VIII. TERMOS FINAIS

Nestes termos,

Pede deferimento.

São Paulo, 03 de maio de 2025.

Joaquim Pedro de Morais Filho


Referências Bibliográficas

  • Constituição Federal de 1988.
  • Código de Processo Penal.
  • Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas).
  • Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (RISTJ).
  • Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 2023.
  • Nucci, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 19ª ed. São Paulo: Forense, 2023.
  • Croce Jr., Delton. Manual de Medicina Legal. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
  • Jurisprudência: Súmulas 593 e 604 do STJ; HC 759.375/MS (STJ); HC 185.097/SP (STF); HC 880.186/SP (STJ); HC 190.345/SP (STF).