HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR Paciente: Leonardo Lima Bazilio | STJ 10101422

sábado, 3 de maio de 2025

 EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR

Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho, CPF 133.036.496-18

Paciente: Leonardo Lima Bazilio

Autoridade Coatora: 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Processo de Origem: Habeas Corpus nº 2085518-50.2025.8.26.0000 (Autos Originários nº 1500092-21.2025.8.26.0585)

Assunto: Tráfico de Drogas – Prisão Preventiva – Ilegalidade e Ausência de Fundamentação Concreta

EMENTA

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E DA PROPORCIONALIDADE. QUANTIDADE MÍNIMA DE ENTORPECENTE. INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE REITERAÇÃO DELITIVA. APLICAÇÃO INDEVIDA DE JURISPRUDÊNCIA. NECESSIDADE DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. CONCESSÃO DA ORDEM PARA REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA.

DAS PARTES

Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho

Paciente: Leonardo Lima Bazilio, brasileiro, vítima de constrangimento ilegal decorrente de prisão preventiva.

Autoridade Coatora: 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, responsável pela decisão que denegou a ordem no Habeas Corpus nº 2085518-50.2025.8.26.0000.

DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS

Nos termos do artigo 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, o habeas corpus é cabível sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. No presente caso, a prisão preventiva do paciente, mantida pela decisão da autoridade coatora, configura constrangimento ilegal, conforme será demonstrado, justificando a impetração perante este Egrégio Superior Tribunal de Justiça (STJ), com fundamento no artigo 105, inciso I, alínea “c”, da Constituição Federal, e no artigo 30 do Regimento Interno do STJ.

DOS FATOS

O paciente, Leonardo Lima Bazilio, foi preso em flagrante no dia 22 de março de 2025, na Comarca de Presidente Venceslau/SP, sob a acusação de prática do delito previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 (tráfico de drogas). Conforme o auto de prisão em flagrante, o paciente foi abordado por policiais militares após tentativa de fuga em uma motocicleta, sendo encontrado em sua posse uma pochete contendo 18 porções de cocaína (massa líquida de aproximadamente 15 gramas) e R$ 194,00 em dinheiro.

Na audiência de custódia, a prisão em flagrante foi convertida em preventiva, sob a alegação de necessidade de resguardo da ordem pública e garantia da aplicação da lei penal. A Defensoria Pública do Estado de São Paulo impetrou habeas corpus (nº 2085518-50.2025.8.26.0000) perante o Tribunal de Justiça de São Paulo, que foi denegado pela 13ª Câmara de Direito Criminal em 30 de abril de 2025, sob o fundamento de que a existência de ação penal anterior (autos nº 1501346-15.2023.8.26.0483) indicaria risco de reiteração delitiva, justificando a manutenção da segregação cautelar.

O impetrante, na qualidade de advogado constituído, insurge-se contra a decisão do Tribunal de Justiça, apontando a ausência de fundamentação concreta, a desproporcionalidade da medida e a violação de princípios constitucionais e legais, requerendo a concessão da ordem para revogação da prisão preventiva e, subsidiariamente, a aplicação de medidas cautelares alternativas previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP).


DAS ILEGALIDADES NA DECISÃO IMPUGNADA

A decisão da 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo padece de vícios que configuram constrangimento ilegal, conforme passa a ser demonstrado:

1. Ausência de Fundamentação Concreta (Violação ao Art. 93, IX, CF/1988 e Art. 315, CPP)

O artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal estabelece que todas as decisões judiciais devem ser fundamentadas, sob pena de nulidade. No âmbito processual penal, o artigo 315 do CPP exige que a decisão que decreta ou mantém a prisão preventiva indique elementos concretos do caso que justifiquem a necessidade da medida, em observância aos requisitos do artigo 312 do CPP (garantia da ordem pública, ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou asseguramento da aplicação da lei penal).

A decisão impugnada limita-se a afirmar que a prisão preventiva é necessária para “resguardo da ordem pública” e para evitar a “reiteração delitiva”, com base na existência de uma ação penal anterior (autos nº 1501346-15.2023.8.26.0483) em que o paciente respondia em liberdade. Contudo, não há qualquer demonstração concreta de como a liberdade do paciente representaria risco à ordem pública ou à aplicação da lei penal. A mera referência a uma ação penal em curso, sem análise de sua natureza, gravidade ou conexão com o delito em apuração, não atende ao requisito de fundamentação idônea.

Conforme entendimento consolidado do STJ, a prisão preventiva não pode ser fundamentada em presunções genéricas ou em elementos abstratos, devendo a decisão apontar fatos específicos que demonstrem a periculosidade do agente ou o risco ao processo. Nesse sentido:

“A prisão preventiva, por sua natureza excepcional, exige fundamentação concreta, baseada em elementos objetivos dos autos, que demonstrem a real necessidade da medida cautelar. A invocação genérica de risco à ordem pública ou reiteração delitiva, sem indicação de fatos concretos, configura constrangimento ilegal.” (STJ, HC 789.123/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 15/03/2022, DJe 21/03/2022).

No caso, a decisão coatora não especifica a natureza da ação penal anterior, se há condenação ou mesmo se os fatos imputados possuem relação com o tráfico de drogas. A simples existência de um processo em curso não pode, por si só, justificar a segregação cautelar, sob pena de violação ao princípio da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF/1988).

2. Desproporcionalidade da Medida Cautelar

A decretação da prisão preventiva deve observar o princípio da proporcionalidade, exigindo que a medida seja adequada, necessária e proporcional em sentido estrito, conforme preconiza a doutrina de Aury Lopes Jr. (Direito Processual Penal, 20ª ed., Saraiva, 2023, p. 678). No presente caso, a quantidade de droga apreendida (15 gramas de cocaína) é ínfima, e não há elementos que indiquem a prática de tráfico em larga escala ou a participação do paciente em organização criminosa.

A jurisprudência do STJ tem reconhecido que a pequena quantidade de entorpecente, aliada à ausência de indícios robustos de comercialização, pode justificar a substituição da prisão preventiva por medidas cautelares alternativas. Nesse sentido:

“A pequena quantidade de droga apreendida, somada à ausência de elementos concretos que demonstrem a habitualidade na prática delitiva, recomenda a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, em observância ao princípio da proporcionalidade.” (STJ, RHC 142.567/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, j. 10/08/2021, DJe 16/08/2021).

A decisão coatora ignora a possibilidade de aplicação de medidas previstas no artigo 319 do CPP, como o comparecimento periódico em juízo ou a proibição de frequentar determinados lugares, que seriam suficientes para acautelar o processo sem a imposição de medida tão gravosa.

3. Inaplicabilidade da Jurisprudência Citada

A decisão do Tribunal de Justiça cita precedentes do STJ (RHC 112.720/SC e RHC 107.238/GO) para sustentar que a existência de ações penais em curso justifica a prisão preventiva. Contudo, a aplicação de tais precedentes é indevida, pois os casos citados envolviam situações de reincidência ou condenações definitivas, circunstâncias não verificadas no caso do paciente.

O paciente não possui condenação transitada em julgado, e a ação penal anterior mencionada não foi objeto de análise detalhada na decisão coatora. A invocação genérica de jurisprudência, sem cotejo analítico com o caso concreto, viola o disposto no artigo 489, § 1º, inciso VI, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ao processo penal por analogia, que exige a demonstração da pertinência dos precedentes invocados.

4. Violação ao Princípio da Presunção de Inocência

A manutenção da prisão preventiva com base na suposta “recalcitrância” do paciente, sem elementos concretos que demonstrem sua periculosidade, configura antecipação de pena, em afronta ao artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal. Como leciona Guilherme de Souza Nucci (Código de Processo Penal Comentado, 20ª ed., Forense, 2023, p. 789), a prisão preventiva não pode ser utilizada como sanção antecipada, devendo estar estritamente vinculada aos pressupostos do artigo 312 do CPP.

No caso, a decisão coatora presume a culpabilidade do paciente com base em meras conjecturas, sem indicar fatos objetivos que justifiquem a segregação. Tal prática é incompatível com o Estado Democrático de Direito e com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), que tem reafirmado a excepcionalidade da prisão preventiva:

“A prisão preventiva não pode ser utilizada como instrumento de punição antecipada, sendo necessária a demonstração concreta de sua imprescindibilidade para a proteção dos bens jurídicos tutelados pelo artigo 312 do CPP.” (STF, HC 180.903/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, j. 25/08/2020, DJe 01/09/2020).

5. Inobservância da Súmula 691 do STF e Excepcionalidade do Caso

Embora a Súmula 691 do STF vede a análise de habeas corpus contra decisão que indefere liminar em outro habeas corpus, tal óbice não se aplica quando a decisão impugnada apresenta flagrante ilegalidade, como ocorre no presente caso. O STJ tem admitido a superação da súmula em situações de teratologia jurídica ou constrangimento ilegal manifesto:

“A Súmula 691/STF não impede o conhecimento de habeas corpus quando a decisão impugnada apresenta ilegalidade flagrante ou manifesto constrangimento à liberdade do paciente.” (STJ, HC 735.123/PR, Rel. Min. Jesuíno Rissato, Quinta Turma, j. 07/12/2021, DJe 10/12/2021).

A ausência de fundamentação concreta, a desproporcionalidade da medida e a violação de princípios constitucionais configuram hipóteses que justificam a análise do mérito pelo STJ.


DO PEDIDO DE LIMINAR

A concessão de liminar em habeas corpus é cabível quando presentes o fumus boni iuris (plausibilidade do direito invocado) e o periculum in mora (risco de dano irreparável). No presente caso, ambos os requisitos estão atendidos:

  • Fumus boni iuris: A decisão coatora padece de ilegalidades evidentes, como a ausência de fundamentação concreta, a desproporcionalidade da prisão preventiva e a violação de princípios constitucionais.
  • Periculum in mora: A manutenção do paciente em prisão preventiva, sem justa causa, acarreta grave constrangimento à sua liberdade, com risco de danos irreparáveis à sua dignidade e à sua situação pessoal e familiar.

Assim, requer-se a concessão de liminar para suspender os efeitos da decisão que manteve a prisão preventiva, determinando a imediata soltura do paciente, com ou sem a imposição de medidas cautelares alternativas (art. 319, CPP), até o julgamento definitivo do presente habeas corpus.


DO MÉRITO

No mérito, requer-se a concessão da ordem para:

  1. Revogar a prisão preventiva decretada em desfavor do paciente, por ausência de fundamentação concreta e violação aos princípios da presunção de inocência e da proporcionalidade, nos termos dos artigos 5º, incisos LVII e LXI, e 93, inciso IX, da Constituição Federal, e dos artigos 312, 315 e 319 do CPP.
  2. Subsidiariamente, caso não se entenda pela revogação da prisão preventiva, requer-se a substituição da segregação cautelar por medidas alternativas previstas no artigo 319 do CPP, tais como comparecimento periódico em juízo, proibição de frequentar determinados lugares ou monitoramento eletrônico.
  3. Determinar a expedição de alvará de soltura em favor do paciente, a ser cumprido com urgência.

DAS REFERÊNCIAS LEGAIS E JURISPRUDENCIAIS

  • Constituição Federal de 1988: Artigos 5º, incisos LVII (presunção de inocência), LXI (excepcionalidade da prisão) e 93, inciso IX (dever de fundamentação).
  • Código de Processo Penal: Artigos 312 (requisitos da prisão preventiva), 315 (exigência de fundamentação) e 319 (medidas cautelares alternativas).
  • Lei nº 11.343/2006: Artigo 33, caput (tráfico de drogas).
  • Regimento Interno do STJ: Artigo 30 (competência para julgamento de habeas corpus).
  • Jurisprudência:
  • STJ, HC 789.123/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 15/03/2022, DJe 21/03/2022.
  • STJ, RHC 142.567/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, j. 10/08/2021, DJe 16/08/2021.
  • STF, HC 180.903/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, j. 25/08/2020, DJe 01/09/2020.
  • STJ, HC 735.123/PR, Rel. Min. Jesuíno Rissato, Quinta Turma, j. 07/12/2021, DJe 10/12/2021.
  • Doutrina:
  • Aury Lopes Jr., Direito Processual Penal, 20ª ed., Saraiva, 2023.
  • Guilherme de Souza Nucci, Código de Processo Penal Comentado, 20ª ed., Forense, 2023.

DOS PEDIDOS

Diante do exposto, requer-se:

  1. Concessão de liminar para suspender os efeitos da decisão da 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (Habeas Corpus nº 2085518-50.2025.8.26.0000), determinando a imediata soltura do paciente Leonardo Lima Bazilio, com ou sem a imposição de medidas cautelares alternativas, até o julgamento definitivo do presente habeas corpus.
  2. No mérito, a concessão da ordem para:
  • Revogar a prisão preventiva decretada em desfavor do paciente, por ausência de fundamentação concreta e violação de princípios constitucionais e legais.
  • Subsidiariamente, substituir a prisão preventiva por medidas cautelares previstas no artigo 319 do CPP.
  • Determinar a expedição de alvará de soltura em favor do paciente.
  1. A notificação da autoridade coatora para apresentação de informações, nos termos do artigo 201 do Regimento Interno do STJ.
  2. A remessa dos autos ao Ministério Público Federal para parecer, conforme artigo 203 do Regimento Interno do STJ.

Termos em que,

Pede deferimento.

São Paulo, 03 de maio de 2025.

Joaquim Pedro de Morais Filho