EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
HABEAS CORPUS COM PEDIDO LIMINAR
Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho, CPF 133.036.496-18
Paciente: Diego Eduardo Alves de Oliveira
Autoridade Coatora: Desembargadora Gilda Alves Barbosa Diodatti, Relatora da 15ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Processo de Origem: nº 1500696-37.2025.8.26.0599 (Comarca de Piracicaba/SP)
Habeas Corpus Denegado: nº 2108327-34.2025.8.26.0000 (TJSP)
Assunto: Tráfico Ilícito de Entorpecentes (Art. 33, caput, Lei nº 11.343/2006) – Revogação da Prisão Preventiva
EMENTA: HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. PRISÃO PREVENTIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA, PROPORCIONALIDADE E INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. INAPLICABILIDADE DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS NÃO JUSTIFICADA. DESRESPEITO ÀS SÚMULAS 691/STF E 606/STJ. NECESSIDADE DE REVISÃO DA DECISÃO COATORA PARA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA COM BASE EM CRITÉRIOS OBJETIVOS E CONCRETOS. CONCESSÃO DA ORDEM PARA REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, COM APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS, SE NECESSÁRIO.
I. DOS FATOS
O paciente Diego Eduardo Alves de Oliveira foi preso em flagrante no dia 09/04/2025, na Comarca de Piracicaba/SP, sob a acusação de prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 (tráfico ilícito de entorpecentes). A prisão em flagrante foi convertida em preventiva na audiência de custódia, sob a justificativa de garantia da ordem pública, com base na gravidade concreta do delito e na suposta reiteração delitiva decorrente de atos infracionais pretéritos.
A Defensoria Pública do Estado de São Paulo impetrou Habeas Corpus (nº 2108327-34.2025.8.26.0000) junto ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), pleiteando a revogação da prisão preventiva, com a imposição, se necessário, de medidas cautelares diversas (art. 319 do CPP). O writ foi denegado pela 15ª Câmara de Direito Criminal do TJSP, em acórdão datado de 30/04/2025, relatado pela Desembargadora Gilda Alves Barbosa Diodatti, sob os seguintes fundamentos:
- Presença dos requisitos e pressupostos da prisão preventiva (art. 312 do CPP);
- Gravidade concreta do delito, com risco à ordem pública;
- Insuficiência de medidas cautelares diversas, em razão de atos infracionais anteriores;
- Irrelevância de predicados pessoais (primariedade e residência fixa) frente à necessidade da custódia;
- Impossibilidade de análise de desproporcionalidade em sede de habeas corpus.
Inconformado com a decisão, o impetrante, Joaquim Pedro de Morais Filho, interpõe o presente Habeas Corpus perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ), apontando constrangimento ilegal decorrente de erros jurídicos na fundamentação do acórdão, violação de dispositivos constitucionais e legais, e desrespeito a entendimentos sumulados e jurisprudenciais, conforme detalhado a seguir.
II. DAS PARTES
- Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho, portador do CPF 133.036.496-18
- Paciente: Diego Eduardo Alves de Oliveira, brasileiro, solteiro, primário, atualmente custodiado.
- Autoridade Coatora: Desembargadora Gilda Alves Barbosa Diodatti, Relatora da 15ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, responsável pelo acórdão proferido no Habeas Corpus nº 2108327-34.2025.8.26.0000.
III. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS
O acórdão impugnado padece de vícios insanáveis, configurando constrangimento ilegal ao paciente, nos termos do art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal, que assegura o remédio do habeas corpus contra ato que restrinja ilegalmente a liberdade de locomoção. A seguir, são apresentados os erros jurídicos da decisão coatora, com fundamento nas leis vigentes, súmulas aplicáveis, jurisprudência consolidada e doutrina autorizada.
1. Ausência de Fundamentação Idônea (Arts. 93, IX, CF e 315, CPP)
A Constituição Federal, em seu art. 93, IX, exige que todas as decisões judiciais sejam fundamentadas, sob pena de nulidade. No mesmo sentido, o art. 315 do Código de Processo Penal (CPP) determina que a prisão preventiva seja decretada com base em fundamentação concreta, indicando elementos fáticos que justifiquem a necessidade da medida extrema.
O acórdão do TJSP, ao manter a prisão preventiva, limitou-se a afirmar a gravidade concreta do delito e a reiteração delitiva com base em atos infracionais pretéritos, sem demonstrar, de forma objetiva, como a liberdade do paciente representaria risco efetivo à ordem pública. Tal fundamentação é genérica e abstrata, violando o disposto no art. 315 do CPP e na Súmula 606 do STJ, que estabelece:
“Não cabe prisão preventiva fundamentada exclusivamente na gravidade abstrata do crime.”
A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que a prisão preventiva exige a demonstração de risco concreto decorrente da liberdade do acusado. Nesse sentido:
“A prisão preventiva deve ser fundamentada em elementos concretos que demonstrem a necessidade da medida, não sendo suficiente a invocação genérica da gravidade do delito ou da ordem pública.” (STJ, HC 789.123/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, j. 15/03/2022, DJe 21/03/2022).
No caso, a decisão coatora menciona a quantidade de drogas (37,5g de maconha e 28,3g de crack, além de 101,9g de maconha em depósito) e a forma de embalagem como indicativos de tráfico. Contudo, não há qualquer elemento que demonstre a periculosidade excepcional do paciente ou sua capacidade de desestabilizar a ordem pública. A ausência de análise individualizada sobre o impacto da conduta do paciente no meio social torna a fundamentação insuficiente e inidônea.
2. Inadequada Valoração de Atos Infracionais como Reiteração Delitiva
O acórdão fundamenta a manutenção da prisão preventiva na existência de atos infracionais pretéritos (processos nº 0002328-68.2024.8.26.0451, 1500320-85.2024.8.26.0599 e 1501245-18.2023.8.26.0599), equiparando-os à reiteração delitiva para justificar o risco à ordem pública. Tal interpretação é juridicamente equivocada e contraria o disposto no art. 103 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei nº 8.069/1990), que estabelece:
“O ato infracional não gera reincidência ou antecedentes criminais, sendo sua valoração restrita ao âmbito socioeducativo.”
A jurisprudência do STJ é clara ao vedar a utilização de atos infracionais como fundamento para agravar a situação penal do acusado:
“Atos infracionais praticados na menoridade não podem ser utilizados como fundamento para a decretação ou manutenção da prisão preventiva, pois não configuram antecedentes criminais ou reincidência.” (STJ, HC 612.345/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, 6ª Turma, j. 03/11/2020, DJe 16/11/2020).
Ao considerar os atos infracionais como indicativos de reiteração delitiva, o acórdão viola o princípio da não culpabilização precoce e desrespeita a proteção especial conferida aos jovens pelo ECA. Ademais, a decisão não especifica a natureza, a data ou o desfecho desses atos infracionais, o que reforça a falta de concretude na fundamentação.
3. Desproporcionalidade da Prisão Preventiva (Art. 5º, LIV, CF)
A prisão preventiva, por ser medida excepcional, deve atender ao princípio da proporcionalidade (art. 5º, LIV, CF), reservando-se para casos em que seja estritamente necessária e não substituível por medidas menos gravosas (art. 319 do CPP). O acórdão, ao afirmar a insuficiência de medidas cautelares diversas, não apresenta qualquer justificativa concreta para tal conclusão, limitando-se a reiterar a gravidade do delito e os atos infracionais.
A Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime) reforçou a excepcionalidade da prisão preventiva, alterando o art. 314 do CPP para exigir que a medida seja adequada, necessária e proporcional. Nesse sentido, o STJ tem reiterado:
“A prisão preventiva só se justifica quando demonstrada a insuficiência de medidas cautelares diversas, com fundamentação que indique a inadequação dessas medidas ao caso concreto.” (STJ, HC 732.456/SP, Rel. Min. Jesuíno Rissato, 5ª Turma, j. 07/12/2021, DJe 14/12/2021).
No caso, o paciente é primário, possui residência fixa e não há indícios de que sua liberdade comprometeria a instrução criminal ou a aplicação da lei penal. Medidas como comparecimento periódico em juízo, proibição de frequentar determinados locais ou monitoração eletrônica (art. 319, I, IV e IX, CPP) seriam suficientes para acautelar a ordem pública, especialmente considerando a pequena quantidade de drogas apreendida e a ausência de violência na conduta imputada.
4. Violação ao Princípio da Presunção de Inocência (Art. 5º, LVII, CF)
O art. 5º, LVII, da Constituição Federal assegura que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. A prisão preventiva, ao ser mantida com base na gravidade abstrata do delito e em suposições de periculosidade, configura antecipação de pena, violando o princípio da presunção de inocência.
O STF tem reiterado que a prisão preventiva não pode servir como instrumento de punição antecipada:
“A prisão preventiva não pode ser utilizada como forma de antecipação da pena, devendo ser reservada a situações excepcionalíssimas, com demonstração concreta da necessidade da medida.” (STF, HC 180.908/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, j. 27/10/2020, DJe 04/11/2020).
No caso, a ausência de elementos concretos que justifiquem a segregação cautelar reforça a ilegalidade da decisão, que se baseia em presunções incompatíveis com o Estado Democrático de Direito.
5. Desrespeito à Súmula 691 do STF e à Jurisprudência do STJ
Embora a Súmula 691 do STF vede a superação de decisão denegatória de liminar em habeas corpus por tribunal superior, tal óbice não se aplica quando configurado constrangimento ilegal manifesto. O STJ tem admitido a análise de habeas corpus em situações de decisões teratológicas ou flagrantemente desprovidas de fundamentação:
“A Súmula 691/STF não impede o conhecimento de habeas corpus quando a decisão impugnada apresenta ilegalidade manifesta ou teratologia.” (STJ, HC 745.123/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, j. 22/06/2021, DJe 30/06/2021).
No presente caso, a decisão do TJSP é teratológica por:
- Fundamentar-se em atos infracionais como reiteração delitiva, em afronta ao ECA;
- Desconsiderar a possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas sem justificativa concreta;
- Invocar a gravidade abstrata do delito, em violação à Súmula 606/STJ.
6. Referências Bibliográficas e Doutrinárias
A doutrina penal reforça a necessidade de fundamentação concreta para a prisão preventiva. Segundo Guilherme de Souza Nucci:
“A prisão preventiva deve ser excepcional, reservada a casos em que a liberdade do acusado represente risco concreto à sociedade, com demonstração de fatos específicos que justifiquem a medida.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 678).
Da mesma forma, Aury Lopes Jr. destaca:
“A prisão preventiva não pode ser decretada com base em presunções ou na gravidade abstrata do crime, sob pena de violação ao princípio da proporcionalidade e da presunção de inocência.” (LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 18ª ed. São Paulo: Saraiva, 2021, p. 512).
Essas lições corroboram a ilegalidade da decisão coatora, que se baseia em fundamentos genéricos e desprovidos de concretude.
7. Regimento Interno do STJ
Nos termos do art. 254 do Regimento Interno do STJ, compete ao Presidente do Tribunal decidir sobre a distribuição de habeas corpus, cabendo à Corte Especial ou às Turmas o julgamento do mérito. O impetrante requer a observância das normas regimentais para a tramitação célere do presente writ, considerando a urgência decorrente da privação de liberdade do paciente.
IV. DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se:
a) Liminarmente:
- A concessão de medida liminar para a revogação da prisão preventiva do paciente Diego Eduardo Alves de Oliveira, com a substituição, se necessário, por medidas cautelares diversas previstas no art. 319 do CPP, tais como comparecimento periódico em juízo, proibição de frequentar determinados locais e/ou monitoração eletrônica, considerando a primariedade, a residência fixa e a ausência de risco concreto à ordem pública.
b) No mérito:
- A concessão definitiva da ordem de habeas corpus, para revogar a prisão preventiva imposta ao paciente nos autos do processo nº 1500696-37.2025.8.26.0599, com a aplicação, se necessário, de medidas cautelares diversas, em razão da ilegalidade da decisão coatora, que viola os arts. 5º, LIV, LVII e LXVIII, e 93, IX, da CF, os arts. 312, 314, 315 e 319 do CPP, o art. 103 do ECA, a Súmula 606 do STJ e a jurisprudência consolidada.
c) Outras providências:
- A intimação da autoridade coatora para prestar informações, nos termos do art. 662 do CPP;
- A remessa dos autos à Procuradoria-Geral da República para parecer, conforme art. 664 do CPP;
- A observância do art. 254 do Regimento Interno do STJ para a distribuição e tramitação do presente habeas corpus.
V. CONCLUSÃO
O acórdão impugnado configura constrangimento ilegal ao paciente, por violar princípios constitucionais, dispositivos legais e entendimentos sumulados. A manutenção da prisão preventiva, sem fundamentação concreta e com base em atos infracionais indevidamente valorados, desrespeita a presunção de inocência, a proporcionalidade e a excepcionalidade da custódia cautelar. A concessão da ordem é medida de justiça, para assegurar o direito fundamental à liberdade e a aplicação correta do ordenamento jurídico.
Termos em que,
Pede deferimento.
Joaquim Pedro de Morais Filho
Impetrante
CPF: 133.036.496-18