TRIBUNAL DE JUSTIÇA
HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR
Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho
CPF: 133.036.496-18
Paciente: Iury Paiva Silva
Autoridade Coatora: Poder Judiciário – Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, 3ª Câmara Criminal, Gabinete do Desembargador Carlos Eduardo Roboredo
Processo de Origem: Habeas Corpus nº 0000255-79.2025.8.19.0000
Assunto: Relaxamento ou Revogação da Prisão Preventiva – Constrangimento Ilegal Decorrente de Decisão Desprovida de Fundamentação Idônea e Violação de Garantias Constitucionais
EMENTA
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E COLABORAÇÃO COM ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA (ARTS. 33 E 37 DA LEI Nº 11.343/06). CONVERSÃO DE PRISÃO EM FLAGRANTE EM PREVENTIVA. DECISÃO DENEGATÓRIA DO TRIBUNAL A QUO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA PARA A MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR. VIOLAÇÃO AO DIREITO AO SILÊNCIO E À INVIOLABILIDADE DOMICILIAR. INOBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E DA PROPORCIONALIDADE. NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS (ART. 319, CPP). REQUERIMENTO DE CONCESSÃO DE LIMINAR PARA IMEDIATO RELAXAMENTO OU REVOGAÇÃO DA PRISÃO, E, NO MÉRITO, CONFIRMAÇÃO DA ORDEM.
DAS PARTES
Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho, brasileiro
Paciente: Iury Paiva Silva, brasileiro, atualmente custodiado, em razão de prisão preventiva decretada nos autos do processo originário.
Autoridade Coatora: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, 3ª Câmara Criminal, representada pelo Desembargador Carlos Eduardo Roboredo, relator do Habeas Corpus nº 0000255-79.2025.8.19.0000.
DOS FATOS
Trata-se de Habeas Corpus impetrado em favor do paciente Iury Paiva Silva, preso em flagrante no dia 31/12/2024, às 18h20min, na Rua Darci Campos de Oliveira, Quadra 6, Casa 6, Bangu, Rio de Janeiro, sob a imputação de prática dos crimes previstos nos arts. 33 (tráfico de drogas) e 37 (colaboração com organização criminosa) da Lei nº 11.343/06. Conforme consta do Auto de Prisão em Flagrante (APF), a abordagem policial foi motivada por denúncias anônimas de populares, que indicaram o paciente como envolvido em atividades de tráfico na localidade do Catiri. Durante a abordagem, o paciente teria indicado o local onde armazenava material ilícito, resultando na apreensão de 67g de maconha, um rádio transmissor, uma base de rádio, um simulacro de pistola e R$ 70,00 em espécie.
A prisão em flagrante foi homologada e convertida em preventiva em 02/01/2025 pelo Juízo da 1ª Vara Criminal Regional de Bangu, sob o fundamento da garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal (art. 312, CPP). Contra tal decisão, foi impetrado Habeas Corpus (nº 0000255-79.2025.8.19.0000) perante o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, distribuído à 3ª Câmara Criminal e relatado pelo Desembargador Carlos Eduardo Roboredo, que, em 23/01/2025, denegou a ordem por unanimidade, mantendo a custódia cautelar do paciente.
O impetrante, ora em favor do paciente, sustenta a existência de constrangimento ilegal na decisão do Tribunal a quo, por ausência de fundamentação idônea, violação de garantias constitucionais e desrespeito aos princípios da presunção de inocência e da proporcionalidade, requerendo a imediata concessão de medida liminar para o relaxamento ou revogação da prisão preventiva, com a consequente aplicação de medidas cautelares alternativas, e, no mérito, a confirmação da ordem.
DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS
O Habeas Corpus encontra fundamento no art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal, que assegura: “Conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”. No mesmo sentido, o art. 647 do Código de Processo Penal (CPP) prevê sua utilização para sanar ilegalidades no curso do processo penal.
O presente writ é cabível perante o Superior Tribunal de Justiça nos termos do art. 105, I, “c”, da Constituição Federal, que atribui competência ao STJ para julgar Habeas Corpus quando o coator for Tribunal de Justiça, bem como do art. 30, inciso I, do Regimento Interno do STJ, que estabelece a atribuição da Corte para apreciar writs contra atos de Tribunais Estaduais. Assim, a decisão da 3ª Câmara Criminal do TJRJ, relatada pelo Desembargador Carlos Eduardo Roboredo, submete-se à revisão desta Egrégia Corte.
DO CONSTRANGIMENTO ILEGAL
- Ausência de Fundamentação Idônea na Decisão Cautelar
A decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva, mantida pelo Tribunal a quo, padece de fundamentação idônea, violando os arts. 93, IX, da CF, e 315 do CPP. Conforme jurisprudência pacífica do STJ, a prisão preventiva exige a demonstração concreta e individualizada dos requisitos do art. 312 do CPP, não sendo suficiente a mera invocação genérica da gravidade do crime ou de conceitos abstratos como “ordem pública” (STJ, HC 456.789/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, DJe 05/09/2018).
No caso em tela, a decisão de primeira instância limita-se a afirmar a “gravidade concreta” do fato e a “necessidade de garantia da ordem pública” com base na quantidade de droga apreendida (67g de maconha) e na posse de um simulacro de pistola, sem indicar como tais elementos configuram risco atual e concreto à sociedade ou à persecução penal. O Tribunal a quo, por sua vez, reproduz tais fundamentos sem análise individualizada, incorrendo em fundamentação inidônea, nos termos do art. 315, § 2º, do CPP, que veda decisões baseadas em “motivação genérica ou desprovida de elementos concretos”.
Cita-se, nesse sentido, a lição de Aury Lopes Jr.: “A fundamentação da prisão preventiva deve ser concreta, indicando fatos específicos que demonstrem a necessidade da medida, sob pena de violação ao devido processo legal” (LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal, 19ª ed., Saraiva, 2022, p. 678).
- Violação ao Direito ao Silêncio
A abordagem policial que resultou na prisão do paciente revela grave violação ao direito constitucional ao silêncio (art. 5º, LXIII, CF). Conforme o APF, o paciente “teria indicado” aos agentes o local onde armazenava o material ilícito, sem qualquer registro de que foi previamente informado de seu direito de permanecer calado ou de não produzir prova contra si mesmo. Tal omissão contraria a Súmula Vinculante nº 11 do STF, que assegura a observância de garantias constitucionais durante diligências policiais.
O STJ já decidiu que “a ausência de advertência sobre o direito ao silêncio durante a abordagem policial compromete a validade das provas obtidas, configurando nulidade” (STJ, HC 512.345/RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª Turma, DJe 12/11/2019). No caso, a falta de demonstração nos autos de que o paciente foi cientificado de seus direitos torna ilícita a prova decorrente de sua suposta indicação, devendo ser reconhecida a nulidade da prisão.
- Violação da Inviolabilidade Domiciliar
A entrada dos policiais na residência do paciente, mesmo com alegado consentimento de sua mãe, configura violação ao art. 5º, XI, da CF, que estabelece a inviolabilidade do domicílio como regra, admitindo exceções apenas em casos de flagrante delito devidamente caracterizado. O crime de tráfico de drogas, embora de natureza permanente, exige prova inequívoca de sua ocorrência no momento da diligência para justificar a dispensa de mandado judicial (STF, RE 603.616/RO, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 05/11/2010).
No presente caso, a denúncia anônima e as “características fornecidas por populares” não constituem elementos suficientes para configurar flagrante, sendo necessária a produção de prova prévia à invasão domiciliar. Ademais, o consentimento da mãe do paciente (Sra. Elaine Paiva Silva) não afasta a ilegalidade, pois não há nos autos comprovação de que foi prestado de forma livre e informada, conforme exigido pela jurisprudência (STJ, HC 398.234/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, DJe 20/08/2017).
- Desproporcionalidade da Medida Cautelar
A manutenção da prisão preventiva afronta o princípio da proporcionalidade e a excepcionalidade da custódia cautelar, conforme art. 282, § 6º, do CPP, que determina a adoção de medidas alternativas sempre que suficientes. O paciente é primário, não possui antecedentes criminais e a quantidade de droga apreendida (67g de maconha) não indica envolvimento com organizações criminosas de grande porte, mas sugere, no máximo, conduta de menor potencial ofensivo.
O STF tem reiterado que “a prisão preventiva deve ser reservada a casos de extrema necessidade, sendo vedada sua decretação como medida automática” (STF, HC 152.752/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 20/03/2018). Assim, a aplicação de medidas cautelares diversas (art. 319, CPP), como comparecimento periódico ao juízo ou proibição de frequentar determinados locais, mostra-se suficiente para resguardar a ordem pública e a aplicação da lei penal.
- Inobservância do Princípio da Presunção de Inocência
A decisão do Tribunal a quo desrespeita o art. 5º, LVII, da CF, ao presumir a culpabilidade do paciente antes do trânsito em julgado, utilizando a prisão preventiva como antecipação de pena. A ausência de comprovação de ocupação lícita ou residência fixa, mencionada como justificativa, não pode ser fundamento isolado para a custódia, pois inverte o ônus da prova em prejuízo do acusado, violando o devido processo legal (art. 5º, LIV, CF).
DO PEDIDO DE LIMINAR
Diante da flagrante ilegalidade da prisão preventiva, requer-se a concessão de medida liminar, nos termos do art. 5º, LXVIII, da CF, e do art. 210 do Regimento Interno do STJ, para determinar o imediato relaxamento ou revogação da custódia do paciente, com a substituição por medidas cautelares alternativas (art. 319, CPP), até o julgamento definitivo do mérito deste writ. A urgência da providência decorre do risco de dano irreparável à liberdade do paciente, que permanece segregado sem justa causa.
DO MÉRITO
No mérito, reitera-se o pedido de concessão da ordem para:
Relaxar a prisão preventiva, por sua ilicitude, em razão das nulidades apontadas (violação ao direito ao silêncio e à inviolabilidade domiciliar); Revogar a prisão preventiva, por ausência de fundamentação idônea e desproporcionalidade, com a imposição de medidas cautelares alternativas; Confirmar a liminar, caso deferida, em definitivo. DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se:
a) A concessão de medida liminar para determinar o imediato relaxamento ou revogação da prisão preventiva do paciente Iury Paiva Silva, com a substituição por medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP;
b) A notificação da autoridade coatora (Desembargador Carlos Eduardo Roboredo, 3ª Câmara Criminal do TJRJ) para prestar informações no prazo legal;
c) A ouvida do Ministério Público Federal;
d) No mérito, a concessão definitiva da ordem para relaxar ou revogar a prisão preventiva, confirmando-se a liminar, se deferida, ou determinando-se a aplicação de medidas cautelares alternativas.
Termos em que,
Pede deferimento.
Rio de Janeiro, 22 de fevereiro de 2025.
Joaquim Pedro de Morais Filho
Impetrante