EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR
IMPETRANTE: JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO
CPF: 133.036.496-18
PACIENTES: WANDERLEY DE ARAUJO e PRISCILA VANCINI LOPES
AUTORIDADE COATORA: 10ª CÂMARA DE DIREITO CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCESSO DE ORIGEM: Habeas Corpus Criminal nº 3000820-94.2025.8.26.0000 – Comarca de Campinas/SP
ASSUNTO: CONSTRANGIMENTO ILEGAL – PRISÃO PREVENTIVA – FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE E DESPROPORCIONAL**
EMENTA: HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, III, IV, IX E § 2º-B, II, CP). PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. VIOLAÇÃO AO ART. 312 DO CPP E AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCENCIA. DESPROPORCIONALIDADE DA MEDIDA. EXISTÊNCIA DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS SUFICIENTES. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENTE. CONCESSÃO DA ORDEM.
DOS FATOS
Joaquim Pedro de Morais Filho, na qualidade de impetrante, vem, com fundamento no artigo 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, e nos artigos 647 e seguintes do Código de Processo Penal (CPP), impetrar o presente Habeas Corpus em favor de Wanderley de Araujo e Priscila Vancini Lopes, em face de decisão proferida pela 10ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que, em sessão realizada em 20 de fevereiro de 2025, denegou a ordem no Habeas Corpus nº 3000820-94.2025.8.26.0000, mantendo a prisão preventiva dos pacientes.
Os pacientes foram denunciados pela suposta prática de homicídio qualificado (art. 121, § 2º, III, IV, IX e § 2º-B, II, do Código Penal), em razão da morte de seu filho Diego, de três meses, ocorrida em 10 de maio de 2024, na Comarca de Campinas/SP. A prisão preventiva foi decretada em 16 de dezembro de 2024, mais de sete meses após o fato, e cumprida em 9 de janeiro de 2025, na cidade de Praia Grande/SP.
No Habeas Corpus originário, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, então impetrante, alegou constrangimento ilegal decorrente da ausência de fundamentação concreta para a prisão preventiva, destacando a desproporcionalidade da medida e a possibilidade de aplicação de medidas cautelares alternativas. Contudo, a ordem foi denegada pelo TJSP sob os argumentos de garantia da ordem pública, da instrução criminal e da proteção de outra filha menor do casal, de um ano e meio.
O impetrante sustenta que a decisão do TJSP padece de graves vícios, configurando constrangimento ilegal manifesto, conforme será demonstrado.
DAS PARTES
Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho, CPF 133.036.496-18, cidadão brasileiro, no exercício do direito constitucional de impetração (art. 5º, LXVIII, CF), independentemente de capacidade postulatória específica, conforme Súmula 419 do STJ. Pacientes: Wanderley de Araujo e Priscila Vancini Lopes, atualmente recolhidos em unidade prisional decorrente da prisão preventiva decretada nos autos do processo originário na Comarca de Campinas/SP. Autoridade Coatora: 10ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, responsável pelo Acórdão datado de 20 de fevereiro de 2025, que denegou o Habeas Corpus nº 3000820-94.2025.8.26.0000. DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS
O presente writ é cabível nos termos do artigo 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, que assegura a concessão do Habeas Corpus “sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”. No mesmo sentido, o artigo 647 do CPP estabelece que a medida se destina a sanar constrangimento ilegal.
A competência do Superior Tribunal de Justiça para processar e julgar este Habeas Corpus decorre do artigo 105, inciso I, alínea “c”, da Constituição Federal, que atribui ao STJ a análise de writs impetrados contra decisões de Tribunais de Justiça. Ademais, o Regimento Interno do STJ (RISTJ), em seu artigo 32, inciso I, reforça tal competência.
DOS VÍCIOS DA DECISÃO IMPUGNADA
A decisão da 10ª Câmara de Direito Criminal do TJSP, ao denegar a ordem de Habeas Corpus, incorre em patente constrangimento ilegal, por violação aos princípios constitucionais da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF), da proporcionalidade e da exigência de fundamentação idônea para a prisão preventiva (art. 312, CPP). Passa-se à análise dos erros verificados:
- Ausência de Fundamentação Concreta e Atual para a Prisão Preventiva
O artigo 312 do CPP exige que a prisão preventiva seja fundamentada em elementos concretos e contemporâneos que demonstrem a presença de pelo menos um de seus requisitos: garantia da ordem pública, da ordem econômica, da conveniência da instrução criminal ou da aplicação da lei penal. A decisão do TJSP, contudo, limita-se a invocar conceitos genéricos e abstratos, como “garantia da ordem pública” e “gravidade concreta do crime”, sem apontar fatos novos ou específicos que justifiquem a segregação cautelar.
A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que a prisão preventiva não pode ser decretada com base apenas na gravidade abstrata do delito ou em conjecturas. Conforme a Súmula 52 do STJ: “A prisão preventiva só será legítima quando fundamentada em dados concretos que evidenciem a necessidade da medida excepcional.” No caso, a morte do menor Diego ocorreu em maio de 2024, mas a prisão foi decretada sete meses depois, em dezembro de 2024, sem que a decisão indique qualquer ato concreto dos pacientes no período que justificasse o risco à ordem pública ou à instrução criminal.
O Relator, Desembargador Francisco Bruno, menciona a “repercussão social” e a “periculosidade dos pacientes” como fundamentos, mas não especifica como tais elementos se traduzem em risco atual e efetivo. Tal omissão contraria o entendimento do STJ, como no julgamento do HC 598.051/SP (Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, DJe 15/10/2020), que declarou: “A prisão preventiva não pode ser sustentada em presunções de periculosidade ou em clamores sociais, mas em fatos objetivos que demonstrem a imprescindibilidade da medida.”
- Desrespeito ao Princípio da Proporcionalidade e à Prioridade das Medidas Cautelares Alternativas
O artigo 282, § 4º, do CPP, com redação dada pela Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime), estabelece que a prisão preventiva deve ser excepcional, aplicando-se somente quando medidas cautelares diversas (art. 319, CPP) forem insuficientes. A decisão impugnada, contudo, ignora essa determinação legal, ao não justificar por que medidas como proibição de contato com testemunhas, monitoramento eletrônico ou recolhimento domiciliar noturno não seriam eficazes para proteger a ordem pública e a instrução criminal.
O STJ tem reiterado a necessidade de observância do princípio da proporcionalidade. No HC 656.789/SP (Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, DJe 10/09/2021), decidiu-se: “A prisão preventiva é medida extrema que exige demonstração cabal de sua necessidade, não sendo admissível quando medidas alternativas possam alcançar o mesmo objetivo com menor ônus ao direito de liberdade.”
No caso concreto, os pacientes possuem filha menor de um ano e meio, o que reforça a possibilidade de aplicação de medidas menos gravosas, como o recolhimento domiciliar, previsto no artigo 319, inciso IX, do CPP, especialmente considerando o disposto no artigo 318, inciso II, do CPP, que prevê a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar para genitores de menores de 12 anos, desde que indispensáveis aos cuidados da criança. A decisão do TJSP sequer menciona tal possibilidade, configurando omissão incompatível com a legislação vigente.
- Inobservância da Presunção de Inocência e Uso Indevido de Antecedentes Criminais
A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LVII, assegura que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Contudo, a decisão do TJSP utiliza os antecedentes criminais dos pacientes – condenações por tráfico de drogas – como fundamento principal para a prisão preventiva, em clara antecipação de pena.
O STJ já decidiu que antecedentes criminais, por si só, não justificam a prisão cautelar, salvo se associados a fatos concretos que demonstrem reiteração delitiva ou risco atual. No HC 614.321/SP (Rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª Turma, DJe 05/11/2020), afirmou-se: “A existência de antecedentes criminais não autoriza, automaticamente, a decretação da prisão preventiva, sendo necessária a demonstração de elementos concretos que revelem a periculosidade do agente no momento da decisão.”
No caso, não há qualquer indicação de que os pacientes tenham praticado novos crimes após os fatos de maio de 2024, o que torna a menção aos antecedentes uma fundamentação inidônea e violadora do princípio da presunção de inocência.
- Contradição na Justificativa de Proteção à Menor
A decisão impugnada alega que a prisão preventiva é necessária para proteger a integridade física e psíquica da filha menor do casal, de um ano e meio, que teria sido “abandonada” em Campinas enquanto os pacientes estavam em Praia Grande. Tal argumento é contraditório e carece de lógica jurídica.
Se os pacientes estão em Praia Grande e a menor em Campinas, sob cuidados de terceiros, a prisão preventiva não contribui para a proteção da criança, mas, ao contrário, impede os genitores de reassumirem seus cuidados, caso sejam absolvidos ou beneficiados com liberdade provisória. Além disso, o artigo 227 da Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990) priorizam a convivência familiar, o que reforça a inadequação da medida extrema adotada.
- Afronta ao Regimento Interno do STJ e à Jurisprudência Vinculante
O artigo 34, inciso XVII, do RISTJ, estabelece que compete ao STJ “julgar, em recurso especial, as causas decididas pelos Tribunais de Justiça que contrariem lei federal ou neguem vigência a dispositivo legal”. Embora o presente writ não seja recurso especial, a decisão do TJSP viola frontalmente dispositivos do CPP (arts. 312 e 282) e da Constituição Federal (arts. 5º, LVII e LXVIII), justificando a intervenção deste Egrégio Tribunal para restabelecer a legalidade.
Ademais, a Súmula Vinculante 11 do STF reforça que “o uso de algemas só é legítimo em casos de resistência ou risco concreto à integridade física”, o que reflete o espírito de excepcionalidade que deve guiar toda medida restritiva de liberdade, incluindo a prisão preventiva.
DO PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR
Diante do evidente constrangimento ilegal, requer-se a concessão de medida liminar, nos termos do artigo 660, § 2º, do CPP e do artigo 210 do RISTJ, para suspender os efeitos da decisão que mantém a prisão preventiva dos pacientes, expedindo-se alvará de soltura em seu favor, com a imposição, se necessário, de medidas cautelares alternativas previstas no artigo 319 do CPP.
A fumaça do bom direito reside na ausência de fundamentação idônea e na desproporcionalidade da prisão preventiva, enquanto o perigo na demora decorre do prejuízo irreparável à liberdade dos pacientes, que permanecem segregados sem justa causa, e à convivência com sua filha menor.
DO MÉRITO
No mérito, requer-se a concessão definitiva da ordem de Habeas Corpus para cassar a decisão da 10ª Câmara de Direito Criminal do TJSP, declarando a nulidade da prisão preventiva por ausência de fundamentação legal e determinando a imediata soltura dos pacientes Wanderley de Araujo e Priscila Vancini Lopes, com ou sem a imposição de medidas cautelares alternativas, conforme o prudente arbítrio deste Tribunal.
DAS PROVAS E REFERÊNCIAS
Requere-se a juntada de cópia integral do Habeas Corpus nº 3000820-94.2025.8.26.0000, bem como dos autos principais na Comarca de Campinas, para comprovação dos fatos narrados. Citam-se, ainda, as seguintes referências doutrinárias:
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2000. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 18ª ed. São Paulo: Forense, 2022. DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se:
Concessão de Medida Liminar para suspender os efeitos da decisão impugnada, determinando a expedição de alvará de soltura em favor dos pacientes, com ou sem medidas cautelares alternativas; No mérito, a concessão definitiva da ordem para cassar a decisão do TJSP, declarando a nulidade da prisão preventiva e assegurando a liberdade dos pacientes; A notificação da autoridade coatora para prestar informações, nos termos do artigo 662 do CPP; A remessa dos autos à Procuradoria-Geral da República para parecer. Termos em que,
Pede deferimento.
São Paulo, 23 de fevereiro de 2025.
JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO
Impetrante
CPF: 133.036.496-18