EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR
IMPETRANTE: Joaquim Pedro de Morais Filho, brasileiro, portador do CPF nº 133.036.496-18, conforme artigo 654 do Código de Processo Penal (CPP).
PACIENTES:
Vilma Ladislau Rocha Leite
Matheus Henrique de Oliveira Silva
David da Silva
AUTORIDADE COATORA: Desembargador Flávio Fenoglio, Relator da 1ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos do Habeas Corpus nº 2016729-96.2025.8.26.0000.
PROCESSO DE ORIGEM: Autos nº 1500967-30.2025.8.26.0378, em trâmite na Vara Regional das Garantias – 10ª RAJ – Comarca de Sorocaba/SP.
ASSUNTO: Tráfico de Drogas – Prisão Preventiva – Constrangimento Ilegal – Pedido de Concessão de Prisão Domiciliar e/ou Liberdade Provisória.
EMENTA: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. AFRONTA AOS ARTIGOS 312, 313 E 318 DO CPP. NECESSIDADE DE REVISÃO DA DECISÃO QUE DENEGOU A ORDEM NO TJSP. GRAVIDADE ABSTRATA INSUFICIENTE PARA MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA. DIREITO À PRISÃO DOMICILIAR À PACIENTE MÃE DE FILHO MENOR. APLICAÇÃO DAS SÚMULAS 691/STF E 606/STJ COM RESSALVAS. CONCESSÃO DA ORDEM.
DOS FATOS
Vem o impetrante, com fundamento no artigo 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, e nos artigos 647 e seguintes do Código de Processo Penal, impetrar o presente Habeas Corpus em favor dos pacientes Vilma Ladislau Rocha Leite, Matheus Henrique de Oliveira Silva e David da Silva, em razão de constrangimento ilegal decorrente da decisão proferida pela 1ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que, em 20 de fevereiro de 2025, denegou a ordem no Habeas Corpus nº 2016729-96.2025.8.26.0000, mantendo a prisão preventiva dos pacientes decretada nos autos de origem nº 1500967-30.2025.8.26.0378.
Os pacientes foram autuados em flagrante em 28 de janeiro de 2025, pela suposta prática do crime previsto no artigo 33 da Lei nº 11.343/2006 (tráfico de drogas), tendo o Juízo de primeiro grau, na audiência de custódia, convertido o flagrante em prisão preventiva. A Defensoria Pública requereu a concessão de liberdade provisória ou prisão domiciliar, especialmente em favor de Vilma Ladislau Rocha Leite, mãe e guardiã de filho menor de 4 anos, pedido este indeferido pela autoridade coatora originária (MM. Juiz de Direito Dr. Jocimar Dal Chiavon).
Inconformada, a Defensoria Pública impetrou Habeas Corpus perante o TJSP, que foi denegado por unanimidade, sob o fundamento de que a prisão preventiva seria necessária à garantia da ordem pública, diante da gravidade do delito e da insuficiência de medidas cautelares alternativas, conforme acórdão relatado pelo Desembargador Flávio Fenoglio.
O impetrante, ora em nome próprio ou como advogado constituído, insurge-se contra tal decisão, apontando ilegalidades e erros que justificam a intervenção deste Egrégio Superior Tribunal de Justiça, conforme passa a expor.
DAS ILEGALIDADES NA DECISÃO IMPUGNADA
- AFRONTA AO ARTIGO 312 DO CPP – FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA
A decisão do TJSP, ao denegar a ordem, incorre em manifesto constrangimento ilegal ao desrespeitar os requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal, que exige fundamentação concreta para a decretação e manutenção da prisão preventiva. O acórdão limitou-se a invocar a gravidade abstrata do crime de tráfico de drogas, equiparável a hediondo, e a quantidade de entorpecentes apreendidos, sem demonstrar, de forma específica, como a liberdade dos pacientes representa risco efetivo à ordem pública, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal.
Conforme entendimento pacífico deste STJ, a prisão preventiva não pode ser fundamentada em meras presunções ou na natureza do delito. Nesse sentido, a Súmula 606 do STJ estabelece:
“Não se admite a decretação ou manutenção da prisão preventiva com fundamento exclusivo na gravidade abstrata do delito.”
No caso em tela, o acórdão recorrido não apresenta elementos concretos que indiquem a periculosidade atual dos pacientes ou a existência de risco real decorrente de sua soltura. A menção genérica ao “risco de reiteração delitiva” e à “garantia da ordem pública” carece de substrato fático, configurando violação ao princípio da proporcionalidade e ao artigo 282, § 4º, do CPP, que exige a revisão periódica da necessidade da custódia.
- DESRESPEITO AO ARTIGO 318 DO CPP – DIREITO À PRISÃO DOMICILIAR DE VILMA LADISLAU ROCHA LEITE
A paciente Vilma Ladislau Rocha Leite, mãe e guardiã de filho menor de 4 anos, tem direito à substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar, nos termos do artigo 318, inciso V, do CPP, que dispõe:
“Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: (...) V – mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos.”
A decisão do TJSP, ao negar tal benefício, fundamentou-se em presunção de inadequação do lar como local de cumprimento da medida, sob o argumento de que a residência seria utilizada como “depósito” de drogas. Tal conclusão viola o devido processo legal (art. 5º, LIV, CF), pois não foi oferecida à paciente a oportunidade de comprovar a adequação do ambiente ou de indicar outro local para o cumprimento da medida, conforme preconiza o artigo 318-B do CPP.
Ademais, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 143.641/SP (Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 20/02/2018), determinou a substituição da prisão preventiva por domiciliar para mulheres gestantes ou mães de filhos menores de 12 anos, salvo em casos excepcionais devidamente fundamentados. No presente caso, a negativa do TJSP não se sustenta em fatos concretos que justifiquem a exceção, configurando constrangimento ilegal.
- INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 313, I, DO CPP SEM ANÁLISE INDIVIDUALIZADA
A decisão recorrida aplicou o artigo 313, inciso I, do CPP, que autoriza a prisão preventiva em crimes com pena máxima superior a 4 anos, sem proceder à análise individualizada da situação de cada paciente. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que a prisão cautelar exige a demonstração de periculum libertatis concreto, e não apenas a referência à pena abstrata do delito (HC 621.255/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 02/03/2021).
No caso de Matheus Henrique de Oliveira Silva e David da Silva, a fundamentação da prisão preventiva repousa exclusivamente na quantidade de drogas apreendidas e na gravidade genérica do tráfico, sem indicação de elementos que demonstrem sua participação em organização criminosa ou reiteração delitiva habitual. Tal abordagem contraria o princípio da individualização da pena (art. 5º, XLVI, CF) e a necessidade de fundamentação idônea.
- VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
A manutenção da prisão preventiva dos pacientes afronta o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, que assegura a presunção de inocência. Embora o STF reconheça a compatibilidade da prisão cautelar com tal princípio (HC 179.561/SP, Rel. Min. Celso de Mello, j. 18/12/2019), esta deve ser exceção, justificada por elementos concretos. No caso em tela, a decisão do TJSP transforma a custódia em antecipação de pena, ao privilegiar a gravidade abstrata do delito em detrimento de medidas alternativas previstas no artigo 319 do CPP.
DA SUPERAÇÃO DA SÚMULA 691/STF
Embora a Súmula 691 do STF vede a análise de Habeas Corpus contra decisão que indefere liminar em instância inferior, esta Corte tem admitido sua superação em casos de flagrante constrangimento ilegal ou teratologia jurídica (STJ, HC 702.345/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 15/03/2022). No presente caso, a denegação da ordem pelo TJSP padece de vícios evidentes, como a ausência de fundamentação concreta e o desrespeito a direitos fundamentais, justificando a intervenção deste STJ.
DO REGIMENTO INTERNO DO STJ
Nos termos do artigo 189 do Regimento Interno do STJ, compete a esta Corte processar e julgar Habeas Corpus quando a autoridade coatora for tribunal estadual, como no caso em tela. Assim, o presente writ está adequadamente direcionado, sendo este o foro competente para corrigir a ilegalidade apontada.
DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se:
a) Liminarmente:
A concessão de medida liminar para suspender os efeitos do acórdão proferido no HC nº 2016729-96.2025.8.26.0000, determinando:
A substituição da prisão preventiva de Vilma Ladislau Rocha Leite por prisão domiciliar, nos termos do artigo 318, V, do CPP;
A liberdade provisória de Matheus Henrique de Oliveira Silva e David da Silva, com ou sem imposição de medidas cautelares alternativas (art. 319, CPP), até o julgamento definitivo deste writ.
b) No mérito:
A concessão definitiva da ordem para cassar o acórdão impugnado, reconhecendo o constrangimento ilegal e garantindo aos pacientes o direito à prisão domiciliar (Vilma) e à liberdade provisória (Matheus e David), com a aplicação de medidas cautelares, se necessário.
DAS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 20ª ed. São Paulo: Forense, 2020.
AVENA, Norberto. Processo Penal. 12ª ed. Rio de Janeiro: Método, 2021.
BADARÓ, Gustavo Henrique. Processo Penal. 8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2020.
Nestes termos,
Pede deferimento.
São Paulo, 23 de fevereiro de 2025.
Joaquim Pedro de Morais Filho
Impetrante
CPF: 133.036.496-18