sábado, 22 de fevereiro de 2025

HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR PACIENTE: NALBERT DA SILVA PEREIRA | STJ 9842201

 EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR

IMPETRANTE: JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO

CPF: 133.036.496-18

PACIENTE: NALBERT DA SILVA PEREIRA

AUTORIDADE COATORA: DESEMBARGADOR PAULO RANGEL, RELATOR DA TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

PROCESSO DE ORIGEM: Habeas Corpus nº 0099613-51.2024.8.19.0000

ASSUNTO: Tráfico de Drogas (Art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006) – Prisão Preventiva – Alegação de Constrangimento Ilegal

EMENTA:

Habeas Corpus. Tráfico de drogas. Prisão preventiva. Alegação de violação de domicílio. Fundamentação insuficiente da custódia cautelar. Inexistência de periculum libertatis concreto. Primariedade e condições pessoais favoráveis. Aplicação de medidas cautelares alternativas. Constrangimento ilegal configurado. Pedido de concessão da ordem para revogação da prisão preventiva, com substituição por medidas cautelares diversas da prisão, nos termos do art. 319 do CPP.

DOS FATOS

Trata-se de Habeas Corpus impetrado em favor do paciente NALBERT DA SILVA PEREIRA, em face de acórdão proferido pela Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no Habeas Corpus nº 0099613-51.2024.8.19.0000, relatado pelo Desembargador Paulo Rangel, que denegou a ordem e manteve a prisão preventiva do paciente, decretada pela 2ª Vara Criminal da Comarca de Nova Friburgo/RJ, sob a imputação de prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 (tráfico de drogas).

Conforme consta do acórdão impugnado, o paciente foi preso em flagrante após denúncia anônima de que estaria guardando material entorpecente em sua residência. Após cerco policial, foi avistado pulando a janela do imóvel com uma sacola, sendo capturado após tentativa de fuga. Em busca autorizada pelo paciente, foram apreendidos 1.048g de maconha (distribuídos em 247 tabletes), 5 recipientes de “lança-perfume”, uma réplica de pistola, balanças de precisão e materiais para embalar drogas, supostamente vinculados à facção criminosa Comando Vermelho.

A defesa impetrou Habeas Corpus no TJRJ, alegando nulidade da apreensão por violação de domicílio e fundamentação inidônea da prisão preventiva, pleiteando sua revogação ou substituição por medidas cautelares alternativas. A ordem foi denegada, sob o fundamento de que: (i) a análise da nulidade demandaria reexame de provas, inviável na via do HC; (ii) havia indícios de autoria e materialidade; (iii) a gravidade concreta da conduta justificava a custódia cautelar; e (iv) medidas alternativas seriam insuficientes.

Inconformado, o impetrante interpõe o presente writ perante este Egrégio Superior Tribunal de Justiça, por vislumbrar constrangimento ilegal na manutenção da prisão preventiva, conforme se passa a demonstrar.

DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS

O Habeas Corpus é remédio constitucional previsto no art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal, cabível sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. No caso, o writ é dirigido ao STJ, nos termos do art. 105, I, “c”, da CF/88, que atribui a esta Corte competência para julgar Habeas Corpus quando o ato coator emanar de Tribunal de Justiça.

O Regimento Interno do STJ, em seu art. 33, inciso I, reforça tal competência, estabelecendo que cabe ao Presidente da Corte distribuir os HCs impetrados contra decisões de Tribunais Estaduais. Assim, plenamente cabível o presente remédio perante esta instância superior.

DO PEDIDO LIMINAR

A concessão de liminar em Habeas Corpus é medida excepcional, mas plenamente justificável quando presentes o fumus boni iuris (plausibilidade do direito alegado) e o periculum in mora (risco de dano irreparável pela demora no julgamento). Nos termos do art. 310 do Regimento Interno do STJ, a liminar pode ser deferida em caso de manifesta ilegalidade.

No presente caso, como se demonstrará, há evidente constrangimento ilegal na manutenção da prisão preventiva, configurado pela ausência de fundamentação concreta que justifique a custódia cautelar, bem como pela desproporcionalidade da medida frente às condições pessoais do paciente. O periculum in mora reside no fato de que o paciente, primário e sem antecedentes, permanece encarcerado, sofrendo prejuízo irreparável à sua liberdade enquanto se discute a legalidade da decisão.

Assim, requer-se a concessão de medida liminar para a imediata revogação da prisão preventiva, com a substituição por medidas cautelares alternativas, nos termos do art. 319 do Código de Processo Penal (CPP).

DA ILEGALIDADE DA DECISÃO IMPUGNADA

  1. Violação de Domicílio e Nulidade da Prova

A defesa sustenta, desde a origem, que a busca e apreensão realizadas no domicílio do paciente configuraram violação do art. 5º, XI, da CF/88, que assegura a inviolabilidade do domicílio, salvo em hipóteses de flagrante delito, desastre ou com autorização judicial. O acórdão impugnado, contudo, esquivou-se de analisar a questão, sob o argumento de que tal exame demandaria “imersão na prova”, inviável na via estreita do Habeas Corpus.

Tal posicionamento contraria a jurisprudência consolidada do STJ e do STF, que admitem a análise de nulidades flagrantes em sede de HC, sem necessidade de dilação probatória, quando os elementos dos autos são suficientes para demonstrar a ilegalidade. Nesse sentido, a Súmula 691 do STF, embora restritiva à superação de decisões liminares, não impede o exame de constrangimentos manifestos, como ocorre no caso.

Consta dos autos que a busca foi realizada após cerco policial baseado em denúncia anônima, sem mandado judicial. A suposta “autorização” do paciente para a entrada dos agentes, dada após sua captura, não afasta a coação implícita decorrente da presença policial ostensiva, o que compromete a voluntariedade do consentimento. Conforme ensina Aury Lopes Jr. (Direito Processual Penal, 19ª ed., Saraiva, 2022, p. 345), “o consentimento para ingresso em domicílio deve ser livre e inequívoco, não podendo ser presumido em situações de pressão ou intimidação”.

Assim, a prova obtida – base da prisão preventiva – é manifestamente ilícita, nos termos do art. 157 do CPP, devendo ser desentranhada dos autos, com a consequente nulidade da custódia fundada em tal elemento.

  1. Ausência de Fundamentação Concreta da Prisão Preventiva

A prisão preventiva, prevista no art. 312 do CPP, exige a demonstração concomitante de: (i) fumus comissi delicti (prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria); e (ii) periculum libertatis (risco concreto à ordem pública, ordem econômica, instrução criminal ou aplicação da lei penal). A decisão coatora, embora mencione tais requisitos, limita-se a presunções genéricas e à gravidade abstrata do delito, sem apontar elementos concretos que justifiquem a segregação.

O acórdão refere-se à “gravidade em concreto da conduta”, citando a quantidade de droga apreendida (1.048g de maconha) e sua suposta vinculação a facção criminosa. Contudo, como leciona Nestor Távora (Curso de Direito Processual Penal, 16ª ed., Juspodivm, 2021, p. 789), “a quantidade de droga, por si só, não é suficiente para justificar a prisão preventiva, sendo necessária a demonstração de que a liberdade do agente representa risco efetivo à sociedade”.

No caso, não há nos autos indicação de reiteração delitiva, organização criminosa estruturada ou ameaça específica à ordem pública. A vinculação ao “Comando Vermelho” é mera ilação, baseada em adesivos, sem prova robusta de participação em facção. Ademais, a primariedade e a ausência de antecedentes do paciente foram reconhecidas, mas desconsideradas sob o argumento de que “não obstam a prisão”. Tal posicionamento viola a Súmula 52 do STJ, que preconiza: “A existência de condições pessoais favoráveis não impede a decretação da prisão preventiva, desde que presentes os requisitos do art. 312 do CPP”. Aqui, os requisitos não estão suficientemente demonstrados.

  1. Desproporcionalidade e Viabilidade de Medidas Cautelares Alternativas

O art. 282, §§ 4º e 6º, do CPP estabelece que a prisão preventiva deve ser medida excepcional, aplicável apenas quando outras medidas cautelares (art. 319) forem insuficientes. O STJ, no julgamento do HC 399.109/SP (Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, DJe 28/11/2017), consolidou que “a custódia cautelar deve ser proporcional e necessária, evitando-se o encarceramento automático em crimes de tráfico”.

O paciente é primário, possui residência fixa e não há notícia de envolvimento prévio em atividades criminosas. Medidas como monitoramento eletrônico, proibição de contato com terceiros ou recolhimento domiciliar noturno seriam plenamente eficazes para resguardar a ordem pública e a instrução criminal, sem o ônus desproporcional da prisão.

DO DIREITO

A manutenção da prisão preventiva viola os princípios da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF/88), da proporcionalidade e da excepcionalidade da custódia cautelar, consagrados na legislação e na jurisprudência pátria. O STF, no HC 104.339/RS (Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJe 10/05/2012), já decidiu que “a prisão preventiva não pode ser utilizada como instrumento de punição antecipada, devendo ser fundamentada em elementos concretos de risco”.

No mesmo sentido, o STJ, no HC 598.051/RJ (Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, DJe 15/09/2020), reconheceu que “a mera quantidade de droga apreendida, sem outros elementos que demonstrem a periculosidade do agente, não autoriza a prisão preventiva”.

DO PEDIDO

Diante do exposto, requer-se:

Concessão de medida liminar, para determinar a imediata revogação da prisão preventiva do paciente NALBERT DA SILVA PEREIRA, com substituição por medidas cautelares alternativas (art. 319 do CPP), a critério deste julgador;
No mérito, a confirmação da liminar, concedendo-se a ordem de Habeas Corpus para revogar definitivamente a prisão preventiva, por configurar constrangimento ilegal, nos termos do art. 5º, LXVIII, da CF/88;
A notificação da autoridade coatora, Desembargador Paulo Rangel, para prestar informações, nos termos do art. 662 do CPP;
A remessa dos autos ao Ministério Público Federal para parecer. Termos em que,

Pede deferimento.

Rio de Janeiro, 22 de fevereiro de 2025.

JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO

Impetrante – CPF: 133.036.496-18