EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR
Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho
CPF: 133.036.496-18
Paciente: Hugo Nascimento da Silva
Autoridade Coatora: Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro – Desembargadora Suimei Meira Cavalieri
Endereço da Autoridade Coatora: Beco da Música, 175, Lâmina IV, 1º andar – sala 103, Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20020-903
Processo de Origem: 0216961-29.2020.8.19.0001 – 4ª Vara Criminal da Comarca da Capital do Rio de Janeiro
Assunto: Revogação da prisão preventiva – Constrangimento ilegal – Art. 121, § 2º, I e VII, c/c art. 14, II, do Código Penal – Tentativa de homicídio qualificado
EMENTA
HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA E CONCRETA. INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP. EXCESSO DE PRAZO NA MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR. VIOLAÇÃO À PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (ART. 5º, LVII, CF/88). NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS (ART. 319, CPP). CONDIÇÃO DE SAÚDE DO PACIENTE – ESQUIZOFRENIA PARANOIDE – INCOMPATIBILIDADE COM A PRISÃO. PEDIDO DE CONCESSÃO DA ORDEM PARA REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA OU SUBSTITUIÇÃO POR PRISÃO DOMICILIAR.
DAS PARTES
Impetrante: Joaquim Pedro de Morais Filho, brasileiro
Paciente: Hugo Nascimento da Silva, brasileiro, atualmente preso preventivamente, residente na Rua Bergamo, 320, lote 4, Bloco 8, apto 408, Rio de Janeiro/RJ, portador de esquizofrenia paranoide, conforme laudo médico anexo.
Autoridade Coatora: Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, na pessoa da Desembargadora Relatora Suimei Meira Cavalieri, com endereço funcional no Beco da Música, 175, Lâmina IV, 1º andar – sala 103, Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20020-903.
DOS FATOS
O paciente Hugo Nascimento da Silva encontra-se preso preventivamente desde a decretação da medida pelo Juízo da 4ª Vara Criminal da Comarca da Capital do Rio de Janeiro, no âmbito do processo nº 0216961-29.2020.8.19.0001, sob a acusação de tentativa de homicídio qualificado (art. 121, § 2º, I e VII, c/c art. 14, II, do Código Penal). A prisão preventiva foi mantida por decisão da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em julgamento do Habeas Corpus nº 0001202-36.2025.8.19.0000, relatado pela Desembargadora Suimei Cavalieri, em 04 de fevereiro de 2025, que denegou a ordem.
A denúncia narra que, em 10 de setembro de 2020, o paciente, em suposta associação com outros indivíduos não identificados, teria efetuado disparos de arma de fogo contra policiais militares na comunidade do Borel, Tijuca, Rio de Janeiro. O crime não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do acusado, que teria deixado sua carteira de identidade no local e sido identificado pelas vítimas a curta distância. A prisão foi fundamentada na garantia da ordem pública, periculosidade do agente, reiteração delitiva e risco à aplicação da lei penal, com base em antecedentes criminais e no fato de o paciente ter permanecido foragido por quatro anos.
O impetrante anterior, Ana Carolina Cavalleiro Gonçalves, argumentou a inocência do paciente, sustentando que sua condição de saúde mental – esquizofrenia paranoide – o impediria de participar de atividades criminosas, além de destacar a fragilidade dos indícios de autoria e a ausência de periculum libertatis. Contudo, a ordem foi denegada sob o entendimento de que os requisitos do art. 312 do CPP estavam preenchidos e que a via do Habeas Corpus não seria adequada para reexame probatório.
Diante disso, o presente writ é impetrado para combater o constrangimento ilegal imposto ao paciente, com pedido de revogação da prisão preventiva ou, subsidiariamente, substituição por medidas cautelares diversas, incluindo prisão domiciliar, em razão de sua grave condição de saúde.
DO DIREITO
- Da Competência do Superior Tribunal de Justiça
Nos termos do art. 105, I, “c”, da Constituição Federal de 1988, compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar Habeas Corpus quando o coator for Tribunal Superior ou quando a decisão impugnada for proferida por Tribunal de Justiça em última instância. O presente writ é dirigido contra acórdão da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, autoridade coatora de competência originária, o que atrai a jurisdição deste Egrégio STJ, conforme § 2º do art. 6º da Lei nº 8.038/1990 e art. 30 do Regimento Interno do STJ.
- Do Constrangimento Ilegal – Violação aos Princípios Constitucionais e Processuais
A manutenção da prisão preventiva do paciente configura evidente constrangimento ilegal, nos termos do art. 5º, LXVIII, da CF/88, por violar os princípios da presunção de inocência (art. 5º, LVII), da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da motivação idônea das decisões judiciais (art. 93, IX). A decisão da autoridade coatora padece de fundamentação concreta e contemporânea, limitando-se a reiterar elementos genéricos e abstratos, em desacordo com o art. 312 do Código de Processo Penal (CPP), alterado pela Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime).
- Da Ausência de Requisitos do Art. 312 do CPP
A prisão preventiva, por ser medida excepcional, exige a presença cumulativa de fumus commissi delicti (prova da materialidade e indícios suficientes de autoria) e periculum libertatis (risco concreto à ordem pública, instrução criminal ou aplicação da lei penal), conforme art. 312 do CPP. A decisão impugnada falha em demonstrar tais requisitos de forma idônea:
3.1. Fragilidade dos Indícios de Autoria
A denúncia baseia-se em dois elementos principais: (i) a presença de uma carteira de identidade do paciente no local do crime e (ii) o reconhecimento pelas vítimas a uma distância de cinco metros durante um confronto armado. Tais provas são frágeis e insuficientes para sustentar a autoria, especialmente considerando a condição de saúde do paciente – esquizofrenia paranoide – que compromete sua capacidade de participar de empreitadas criminosas organizadas.
A jurisprudência do STJ é clara ao exigir indícios robustos para a custódia cautelar:
“A prisão preventiva exige prova da materialidade e indícios suficientes de autoria, não sendo admissível sua decretação com base em meras suposições ou elementos frágeis.” (STJ, HC 687.840/MS, Rel. Min. Laurita Vaz, 6ª Turma, j. 13/12/2022, DJe 19/12/2022).
O simples achado de um documento no local não comprova a participação ativa do paciente no delito, sendo possível que tenha sido perdido ou deixado por terceiros. O reconhecimento em meio a um tiroteio, sob condições de estresse e baixa visibilidade, também carece de confiabilidade, conforme alerta a Súmula 568 do STJ:
“O reconhecimento fotográfico do acusado, para servir como prova, deve ser corroborado por outros elementos idôneos nos autos.”
3.2. Ausência de Periculum Libertatis Contemporâneo
A decisão coatora fundamenta o periculum libertatis na gravidade do crime, no histórico criminal do paciente e em sua suposta condição de foragido por quatro anos. Contudo, tais elementos não demonstram risco atual e concreto à ordem pública, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal, como exige o art. 312, caput, do CPP, na redação dada pela Lei nº 13.964/2019, que introduziu a necessidade de contemporaneidade.
O STJ tem reiterado que:
“A prisão preventiva deve ser contemporânea aos fatos que a justificam, não se admitindo sua manutenção por fatos pretéritos sem demonstração de risco atual.” (STJ, HC 546.242/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 06/02/2020, DJe 14/02/2020).
Os fatos ocorreram em setembro de 2020, e a prisão foi decretada anos depois, sem que a decisão indique novos elementos que justifiquem a segregação em 2025. A menção a antecedentes criminais – alguns deles não transitados em julgado – viola a Súmula 444 do STJ, que proíbe o agravamento da pena-base por processos em andamento, e não pode ser usada como fundamento genérico para a custódia cautelar.
- Do Excesso de Prazo na Manutenção da Prisão
O paciente encontra-se preso preventivamente desde a efetivação do mandado, em data posterior a 2020, sem que o processo tenha avançado significativamente. O STJ já consolidou que o excesso de prazo injustificado na formação da culpa constitui constrangimento ilegal:
“A mora injustificada na conclusão da instrução criminal, sem culpa da defesa, autoriza a revogação da prisão preventiva.” (STJ, HC 531.943/GO, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, 6ª Turma, j. 03/03/2020, DJe 12/03/2020).
Passados mais de quatro anos desde os fatos, a manutenção da custódia viola o princípio da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CF/88).
- Da Condição de Saúde do Paciente – Esquizofrenia Paranoide
O paciente é portador de esquizofrenia paranoide, conforme laudo médico anexo, condição que exige acompanhamento familiar contínuo e tratamento especializado. A prisão preventiva em unidade incompatível com sua saúde mental agrava seu estado, configurando violação ao art. 5º, III, da CF/88 (proibição de tratamento desumano) e ao art. 318, II, do CPP, que prevê a substituição da prisão por domiciliar em casos de doença grave.
A doutrina de Eugênio Pacelli reforça:
“A prisão cautelar deve ser evitada quando incompatível com a condição de saúde do acusado, sob pena de transformar a medida em pena antecipada.” (Comentários ao Código de Processo Penal, 4ª ed., Atlas, 2012, p. 650).
- Da Aplicabilidade de Medidas Cautelares Diversas
O art. 319 do CPP prevê medidas alternativas à prisão, como monitoramento eletrônico e prisão domiciliar, que se mostram suficientes para o caso. A decisão coatora negou tais medidas sem fundamentação concreta, limitando-se a afirmar sua “insuficiência”, em afronta ao art. 282, § 6º, do CPP, que exige motivação específica para a rejeição.
O STF já decidiu que:
“A prisão preventiva deve ser a ultima ratio, cabendo ao julgador justificar a inadequação das medidas cautelares alternativas.” (STF, HC 104.139/SP, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, j. 16/08/2011).
- Do Pedido Liminar
A concessão de liminar é medida de urgência prevista no art. 660, § 2º, do CPP e no art. 33 do Regimento Interno do STJ, estando presentes o fumus boni iuris (ausência de fundamentação idônea e violação de direitos fundamentais) e o periculum in mora (risco à saúde e integridade do paciente em razão da prisão).
DO PEDIDO
Diante do exposto, requer-se:
Liminarmente: A imediata revogação da prisão preventiva do paciente Hugo Nascimento da Silva, com expedição de alvará de soltura, ou, subsidiariamente, sua substituição por prisão domiciliar (art. 318, II, CPP), com ou sem monitoramento eletrônico (art. 319, IX, CPP), em razão da gravidade de sua condição de saúde;
No mérito: A concessão definitiva da ordem de Habeas Corpus para revogar a prisão preventiva ou substituí-la por medidas cautelares diversas, reconhecendo o constrangimento ilegal imposto pela decisão da Terceira Câmara Criminal do TJRJ;
A notificação da autoridade coatora para prestar informações, nos termos do art. 662 do CPP;
A juntada dos documentos anexos, incluindo o laudo médico do paciente.
Termos em que,
Pede deferimento.
Rio de Janeiro, 22 de fevereiro de 2025.
Joaquim Pedro de Morais Filho
Impetrante
CPF: 133.036.496-18