EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) MINISTRO(A) PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
HABEAS CORPUS COM PEDIDO LIMINAR
IMPETRANTE: Joaquim Pedro de Morais Filho CPF: 133.036.496-18
PACIENTE: Mauro Cesar Barbosa Cid -CPF 92778186034
AUTORIDADE COATORA: Supremo Tribunal Federal (Ministro Alexandre de Moraes, Relator da PET 11.767/DF)
EMENTA: HABEAS CORPUS – COLABORAÇÃO PREMIADA – ALEGAÇÃO DE COAÇÃO PSÍQUICA – AUSÊNCIA DE VOLUNTARIEDADE – PEDIDO DE EXAME DE INSANIDADE MENTAL – DIREITO À AMPLA DEFESA E AO DEVIDO PROCESSO LEGAL – ART. 5º, LIV, LV, E LXI, DA CF/88 – ART. 4º, §7º, DA LEI Nº 12.850/2013 – NECESSIDADE DE VERIFICAÇÃO DA VERACIDADE DAS DECLARAÇÕES.
DOS FATOS
O paciente, Mauro Cesar Barbosa Cid, tenente-coronel do Exército Brasileiro, foi preso preventivamente em 3 de maio de 2023, por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito da PET 11.767/DF, sob a relatoria do Ministro Alexandre de Moraes. A prisão foi fundamentada em supostos riscos à ordem pública e à instrução processual, relacionados a fatos investigados durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Durante sua custódia, o paciente foi submetido a sucessivas restrições, como a proibição de visitas de seu pai, General Mauro Lourena Cid (16/06/2023 e 19/08/2023), e de comunicação com sua esposa, Gabriela Santiago Ribeiro Cid (23/08/2023). Tais medidas culminaram em um cenário de intensa pressão psicológica, conforme amplamente noticiado e documentado em áudios divulgados pela revista Veja em 21 de março de 2024.
Em 25 de agosto de 2023, após meses de silêncio, o paciente prestou depoimento à Polícia Federal, decidindo colaborar. Em 6 de setembro de 2023, apresentou "termo de intenção" de delação premiada, homologado em 9 de setembro de 2023, sendo solto no mesmo dia. Contudo, os áudios vazados revelam que Mauro Cid declarou ter sido coagido pela Polícia Federal a narrar fatos que não presenciou ou dos quais não tinha conhecimento, sob ameaça de perder os benefícios do acordo.
Em 22 de março de 2024, após audiência no STF para esclarecimentos sobre os áudios, o paciente teve nova prisão preventiva decretada pelo Ministro Alexandre de Moraes, tendo sofrido mal-estar e desmaio logo após a sessão, o que reforça a fragilidade de seu estado psíquico.
Diante disso, o impetrante interpõe o presente Habeas Corpus ao Superior Tribunal de Justiça, com fulcro no art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal, para garantir que o paciente seja submetido a exame de insanidade mental, a fim de apurar a veracidade de suas declarações e a higidez de sua capacidade volitiva no momento da colaboração premiada.
DO DIREITO
Da Competência do STJ
Nos termos do art. 105, I, "c", da Constituição Federal, compete ao STJ processar e julgar Habeas Corpus quando o ato coator emanar de Tribunal Superior ou de seus membros. No caso, a autoridade coatora é o Ministro Alexandre de Moraes, do STF, o que legitima a impetração perante esta Corte Superior.
Da Ilegalidade da Prisão e da Colaboração Premiada
A prisão preventiva do paciente, decretada em 28 de abril de 2023 e executada em 3 de maio de 2023, carece de fundamentação idônea e contemporânea, violando os arts. 312 e 315, §1º, do Código de Processo Penal (CPP), conforme alterados pelo Pacote Anticrime (Lei nº 13.964/2019). Conforme Capez (2025), "a ausência de indícios concretos e contemporâneos transforma a medida cautelar em antecipação de pena, o que é vedado pelo art. 313, §2º, do CPP" (Conjur, 20/02/2025).
A cronologia dos fatos demonstra que a custódia foi utilizada como instrumento de fragilização psicológica para forçar a colaboração premiada, o que fulmina o requisito da voluntariedade exigido pelo art. 4º, §7º, da Lei nº 12.850/2013. O STF, no HC 127.483/PR (Rel. Min. Dias Toffoli), consolidou que a colaboração deve ser "resultante de um processo volitivo livre, consciente e desimpedido de coação". No caso, as restrições sucessivas e a soltura imediata após a homologação do acordo (09/09/2023) evidenciam a ausência de liberdade psíquica.
Os áudios divulgados pela Veja (21/03/2024) reforçam a tese de coação, ao revelarem que o paciente foi pressionado a confirmar narrativas pré-estabelecidas pela Polícia Federal, sob pena de indiciamentos graves. Tal prática contraria o disposto no art. 3-B, §13, da Lei nº 12.850/2013, que exige a gravação dos atos de colaboração para garantir sua fidelidade e voluntariedade.
Da Necessidade do Exame de Insanidade Mental
O art. 149 do CPP prevê a possibilidade de realização de exame de insanidade mental quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, especialmente em casos que possam afetar a validade de atos processuais. No presente caso, o estado psicológico do paciente, abalado por meses de prisão e pressões, aliado ao mal-estar e desmaio em 22 de março de 2024, levanta fundadas suspeitas sobre sua capacidade de discernimento ao prestar a colaboração premiada.
Frederico Valdez Pereira (2014) destaca que "a voluntariedade é o cerne da colaboração premiada, e qualquer vício que comprometa a liberdade psíquica do colaborador torna o acordo nulo" (Delação Premiada: legitimidade e procedimento, p. 119). Da mesma forma, Walter Barbosa Bittar (2020) alerta para o uso abusivo da prisão como "técnica de fragilização" (Delação premiada: direito, doutrina e jurisprudência, p. 178), o que exige a análise da saúde mental do delator.
A Súmula 11 do STJ reforça a necessidade de observância do devido processo legal em medidas restritivas de liberdade, enquanto a jurisprudência do STF (HC 127.483/PR) enfatiza que a coação psicológica invalida a manifestação de vontade. Assim, o exame de insanidade mental é medida imprescindível para resguardar a credibilidade do acordo e os direitos fundamentais do paciente.
Do Risco à Ordem Pública e à Verdade Processual
A manutenção das declarações do paciente como base para denúncias ou medidas cautelares, sem a devida apuração de sua higidez mental, viola o art. 4º, §16, da Lei nº 12.850/2013, que proíbe decisões restritivas fundadas exclusivamente em palavras de colaborador. Conforme Flávio da Silva Andrade (2018), "prisões cautelares com o fim de forçar delações configuram abuso de autoridade e comprometem a busca pela verdade real" (Justiça penal consensual: controvérsias e desafios, p. 199).
DO PEDIDO LIMINAR
Presentes o fumus boni iuris, pela plausibilidade do direito invocado (violação ao devido processo legal e à voluntariedade), e o periculum in mora, pelo risco de utilização de declarações potencialmente inválidas em processos criminais, requer-se a concessão de medida liminar para:
a) Suspender os efeitos da colaboração premiada de Mauro Cesar Barbosa Cid, até a realização do exame de insanidade mental;
b) Determinar a imediata realização de exame de insanidade mental, nos termos do art. 149 do CPP, por peritos imparciais, a fim de avaliar a capacidade volitiva do paciente no momento da delação.
DO MÉRITO
No mérito, requer-se a concessão definitiva da ordem para:
a) Confirmar a liminar, determinando a realização do exame de insanidade mental;
b) Anular a colaboração premiada, caso o exame comprove comprometimento da capacidade psíquica do paciente, com fundamento no art. 573, §1º, do CPP (princípio da consequencialidade);
c) Garantir o acesso da defesa aos registros das tratativas da colaboração, conforme art. 3-B, §13, da Lei nº 12.850/2013.
DAS PROVAS
Requer-se a juntada dos seguintes documentos:
a) Cópia dos áudios divulgados pela revista Veja (21/03/2024);
b) Decisão de prisão preventiva (28/04/2023) e de homologação do acordo (09/09/2023);
c) Reportagem da Conjur de Fernando Capez (17/02/2025 e 20/02/2025);
d) Vídeo da audiência de 22/03/2024 (Bahia Notícias, 20/02/2025).
CONCLUSÃO
Diante do exposto, requer-se ao Superior Tribunal de Justiça:
a) A concessão da medida liminar, nos termos supra;
b) A notificação da autoridade coatora para prestar informações;
c) A intimação do Ministério Público Federal para parecer;
d) A concessão definitiva da ordem, para garantir o exame de insanidade mental e a proteção dos direitos constitucionais do paciente.
Termos em que,
Pede deferimento.
Brasília, 21 de fevereiro de 2025.
Joaquim Pedro de Morais Filho
Impetrante
CPF: 133.036.496-18
Referências Bibliográficas
CAPEZ, Fernando. Conjur, 17/02/2025 e 20/02/2025.
VALDEZ PEREIRA, Frederico. Delação Premiada: legitimidade e procedimento. 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2014.
BITTAR, Walter Barbosa. Delação premiada: direito, doutrina e jurisprudência. 3ª ed. São Paulo: Tirant Lo Blanch, 2020.
ANDRADE, Flávio da Silva. Justiça penal consensual: controvérsias e desafios. Salvador: JusPodivm, 2018.
Constituição Federal de 1988.
Código de Processo Penal (Decreto-Lei nº 3.689/1941).
Lei nº 12.850/2013 (Organizações Criminosas).
STF, HC 127.483/PR, Rel. Min. Dias Toffoli.