CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA Processo distribuído com o número 0001783-80.2025.2.00.0000 para o órgão Corregedoria. Processo Originário: Nº 0009269-92.2025.8.26.0000 Reclamado: Desembargador Adalberto José Queiroz Telles de Camargo Aranha Filho, CPF 029.428.268-86 Desrespeito à Natureza Informal do Habeas Corpus

segunda-feira, 24 de março de 2025

 À EXCELENTÍSSIMA SENHORA CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

Setor de Administração Federal Sul, Quadra 2, Lote 1, Bloco A

Brasília/DF - CEP 70070-120

Reclamação Disciplinar

Reclamante: Joaquim Pedro de Morais Filho

Reclamado: Desembargador Adalberto José Queiroz Telles de Camargo Aranha Filho, CPF 029.428.268-86, Presidente da Seção de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Processo Originário: Nº 0009269-92.2025.8.26.0000

JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO, brasileiro, vem, com o devido respeito, à presença de Vossa Excelência, com fundamento no artigo 103-B, § 4º, da Constituição Federal, no artigo 5º da Lei nº 11.417/2006 e no Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (Resolução CNJ nº 135/2011), apresentar RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR contra o Desembargador ADALBERTO JOSÉ QUEIROZ TELLES DE CAMARGO ARANHA FILHO, Presidente da Seção de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos:


I - DOS FATOS

  1. O Reclamante interpôs recurso ordinário em habeas corpus no âmbito do processo nº 0009269-92.2025.8.26.0000, perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), apresentando diretamente as razões recursais, sem a assistência de advogado, em razão de sua condição de hipossuficiência e da urgência inerente ao remédio constitucional.
  2. Em decisão datada de 24 de março de 2025, o Reclamado, na qualidade de Presidente da Seção de Direito Criminal do TJSP, determinou a impossibilidade de processamento das razões do recurso, sob o fundamento de que "essas são ato privativo de advogado", ordenando o arquivamento do pleito e a comunicação à Defensoria Pública para "eventuais providências" (doc. anexo).
  3. A decisão foi assinada digitalmente pelo Reclamado em 24/03/2025, às 17:27, conforme consta nos autos (fls. 8), e publicada no sistema eletrônico do TJSP, acessível em https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/sg/abrirConferenciaDocumento.do, sob o código uvcbivzY.
  4. O Reclamante alega que a conduta do magistrado configurou abuso de poder, violação de direitos fundamentais e infração disciplinar, ao impor formalismo excessivo e obstaculizar o acesso à justiça, em afronta à natureza do habeas corpus e às prerrogativas constitucionais asseguradas ao cidadão.

II - DAS INFRAÇÕES DISCIPLINARES E VIOLAÇÕES CONSTITUCIONAIS

A) Violação ao Dever de Fundamentação e à Garantia de Acesso à Justiça

  1. Nos termos do artigo 93, IX, da Constituição Federal, todas as decisões judiciais devem ser fundamentadas, sob pena de nulidade. A decisão do Reclamado limitou-se a afirmar que o processamento das razões recursais seria "impossível" por se tratar de "ato privativo de advogado", sem analisar o conteúdo das razões apresentadas ou justificar a proporcionalidade da medida em face da natureza excepcional do habeas corpus.
  2. Tal omissão viola o artigo 5º, XXXV, da CF/88, que garante o acesso à justiça, e o artigo 2º da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN - Lei Complementar nº 35/1979), que impõe ao magistrado o dever de assegurar o pleno exercício dos direitos fundamentais. O excesso de formalismo configurou barreira indevida ao direito do Reclamante de ter seu pleito apreciado.

B) Desrespeito à Natureza Informal do Habeas Corpus

  1. O habeas corpus, previsto no artigo 5º, LXVIII, da CF/88 e regulamentado pelo artigo 647 do Código de Processo Penal, é remédio constitucional de tramitação simplificada, cuja informalidade é reconhecida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (HC 92.325/SP, Rel. Min. Marco Aurélio) e do Superior Tribunal de Justiça (RHC 45.671/SP, Rel. Min. Felix Fischer). A exigência absoluta de representação por advogado, sem análise da excepcionalidade do caso, contraria essa orientação e frustra a finalidade do instituto.
  2. A conduta do Reclamado, ao arquivar sumariamente o recurso sem sequer avaliar sua inteligibilidade ou mérito, configura descumprimento do dever funcional de zelar pela celeridade e efetividade da prestação jurisdicional (art. 35, I, da LOMAN).

C) Abuso de Poder e Negligência na Prestação Jurisdicional

  1. O artigo 35, II, da LOMAN estabelece que o magistrado deve "desempenhar com diligência as atribuições do cargo". A remessa genérica à Defensoria Pública, sem garantir a continuidade do processamento do recurso no prazo legal, revela negligência do Reclamado em assegurar o direito à ampla defesa e ao contraditório (art. 5º, LV, CF/88).
  2. Tal conduta pode ser enquadrada como abuso de poder, nos termos do artigo 37, caput, da CF/88, e do artigo 4º, inciso V, da Resolução CNJ nº 135/2011, caracterizando infração disciplinar passível de apuração e sanção.

D) Prejuízo à Imagem do Poder Judiciário

  1. A decisão do Reclamado, ao privilegiar formalidades em detrimento da proteção de um direito fundamental, compromete a credibilidade e a confiança da sociedade no Poder Judiciário, em afronta ao artigo 35, VIII, da LOMAN, que impõe ao magistrado o dever de manter conduta irrepreensível na vida pública e particular.

III - DA COMPETÊNCIA DO CNJ

  1. Nos termos do artigo 103-B, § 4º, inciso II, da Constituição Federal, compete ao CNJ "zelar pela observância do artigo 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário". A decisão do Reclamado, enquanto ato judicial com potencial de configurar infração disciplinar, insere-se no âmbito de fiscalização deste Conselho.
  2. A Resolução CNJ nº 135/2011, em seu artigo 3º, inciso I, reforça a competência do CNJ para apurar condutas que violem os deveres funcionais dos magistrados, como as aqui denunciadas.

IV - DOS PEDIDOS

Diante do exposto, requer-se:

a) O recebimento e processamento da presente Reclamação Disciplinar, com a instauração de procedimento administrativo disciplinar contra o Desembargador Adalberto José Queiroz Telles de Camargo Aranha Filho;

b) A apuração das infrações disciplinares narradas, em especial a violação dos artigos 35, I, II e VIII, da LOMAN, e do artigo 4º, inciso V, da Resolução CNJ nº 135/2011;

c) A suspensão cautelar do Reclamado do exercício das funções judicantes, caso constatada a gravidade da conduta, nos termos do artigo 15 da Resolução CNJ nº 135/2011, até a conclusão do procedimento;

d) A aplicação da sanção disciplinar cabível, ao final do processo, que pode incluir advertência, censura, remoção compulsória ou outra pena prevista na LOMAN, conforme a gravidade dos fatos;

e) A comunicação ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para que sejam adotadas providências no sentido de revisar a decisão recorrida, garantindo o processamento do recurso ordinário em habeas corpus do Reclamante;

f) A intimação do Reclamante para acompanhar todas as fases do procedimento, nos termos do artigo 9º da Resolução CNJ nº 135/2011.

V - DOS DOCUMENTOS EM ANEXO

  • Cópia da decisão proferida pelo Reclamado (fls. 8 do processo nº 0009269-92.2025.8.26.0000);
  • Comprovante de acesso ao documento original no sistema do TJSP (código uvcbivzY);
  • Demais documentos eventualmente apresentados pelo Reclamante.

Nestes termos,

Pede deferimento.

São Paulo, 25 de março de 2025.

JOAQUIM PEDRO DE MORAIS FILHO

Reclamante